quinta-feira, 18 de abril

Uma questão de autoridade

Ouvir Artigo

Se você já se perguntou por que diferentes cristãos professos chegam a conclusões teológicas tão diferentes, pelo menos uma parte da resposta – a maior parte, na verdade – tem a ver com a questão da autoridade. Os três principais ramos do cristianismo no Ocidente – católico-romano tradicional, protestante liberal e evangélico – não concordam sobre como julgar alegações de verdade concorrentes. Nós não respondemos à pergunta “Qual é a nossa autoridade final?” da mesma maneira. Todo cristão reconhece que, em certo sentido, a nossa teologia e ética devem “ser de acordo com as Escrituras”. Mas, quando a hora da verdade chega na disputa teológica, a quem ou a que nós apelamos para fazer nossos argumentos finais?

Veja se você consegue identificar as diferenças entre estas três afirmações sobre autoridade das Escrituras, cada uma delas é feita por autores contemporâneos de diferentes ramos do cristianismo ocidental.

A primeira é de Peter Kreeft, um ótimo e cativante escritor católico-romano:

A Igreja nos dá a sua Tradição como uma mãe que dá uma roupa de segunda mão ao filho, que já foi usada por muitas irmãs e irmãos mais velhos. Mas diferentemente de qualquer roupa terrena, esta roupa é indestrutível porque não é feita de lã ou algodão, mas de verdade. Foi inventada por Deus, não pelo homem. A Sagrada Tradição (“T” maiúsculo) deve ser diferenciada de todas as tradições humanas (“T” minúsculo). A Sagrada Tradição faz parte do “depósito da fé”, que também inclui a Sagrada Escritura. Ela é constituída de dados da Igreja, outorgados a ela por seu Senhor.

A segunda declaração é de Gary Dorrien, o maior especialista em teologia liberal americana, e ele próprio um protestante liberal:

A ideia essencial da teologia liberal é que todas as alegações de verdade, tanto na teologia como em outras disciplinas, devem ser feitas com base na razão e experiência, e não por apelo à autoridade externa. A escritura cristã pode ser reconhecida como espiritualmente autoritativa dentro da experiência cristã, mas a sua palavra não fixa ou estabelece alegações da verdade sobre fatos.

E, finalmente, aqui está uma terceira declaração de Michael Horton, um teólogo reformado cuja posição aqui representa a do evangelicalismo mais amplo:

A autoridade final sempre reside fora de nós mesmos e, até mesmo, fora da igreja, já que ambos são sempre ouvintes da Palavra e receptores de seu juízo e justificação. A igreja é comissionada a entregar essa Palavra (um ofício ministerial), não a possuí-la ou governá-la (um ofício magisterial). Assim, a autoridade é sempre transcendente. Mesmo quando ela chega perto de nós, nunca é a nossa própria palavra que ouvimos (Rm 10.6-13, 17).

As diferenças entre essas declarações são impressionantes. Para Kreeft, a Tradição da Igreja é uma autoridade final em pé de igualdade com as Escrituras. Para Dorrien, a Escritura deve alinhar-se à razão e experiência. Mas para Horton, a Palavra de Deus está fora do eu e acima da igreja. Qualquer que seja a outra coisa sobre a qual possamos discordar como católicos, liberais e evangélicos, devemos pelo menos concordar que é a nossa visão da Escritura e da autoridade que nos divide.

Toda religião repousa sobre autoridade. Na verdade, toda disciplina acadêmica e todas as esferas da investigação humana repousam sobre autoridade. Quer percebamos ou não, todos nós damos a algo ou alguém a última palavra – nossos pais, nossa cultura, nossa comunidade, nossos sentimentos, o governo, revistas especializadas, pesquisas de opinião, nossas impressões, ou um livro sagrado. Todos nós temos alguém ou algo para o qual nos voltamos como o árbitro final das alegações de verdade. Para os cristãos, essa autoridade é a Escritura do Antigo e Novo Testamentos. Claro, podemos entender erradamente e fazer mau uso da palavra de Deus. Mas, quando interpretada corretamente – prestando atenção ao contexto original, considerando o gênero literário, analisando a intenção autoral –, a Bíblia nunca está errada no que afirma e nunca deve ser marginalizada como nada menos do que a última palavra sobre tudo o que ensina.

 

Fonte: Trecho do livro “Levando Deus a Sério” de Kevin DeYoung.


Autor: Kevin DeYoung

kevin DeYoung é o pastor principal da University Reformed Church, em East Lansing (Michigan). Obteve sua graduação pelo Hope College e seu mestrado em teologia pelo Gordon-Conwell Teological Seminary. É preletor em conferências teológicas e mantém um blog na página do ministério ­ The Gospel Coalition.

Parceiro: The Gospel Coalition

The Gospel Coalition
O TGC é uma comunidade de igrejas evangélicas, comprometidas com a renovação da fé no evangelho de Cristo.

Ministério: Editora Fiel

Editora Fiel
A Editora Fiel tem como missão publicar livros comprometidos com a sã doutrina bíblica, visando a edificação da igreja de fala portuguesa ao redor do mundo. Atualmente, o catálogo da Fiel possui títulos de autores clássicos da literatura reformada, como João Calvino, Charles Spurgeon, Martyn Lloyd-Jones, bem como escritores contemporâneos, como John MacArthur, R.C. Sproul e John Piper.

Veja Também

A Inerrância da Escritura Sagrada – parte 3

Com o nascimento da ciência moderna a Bíblia começou a ser considerada um livro de origem humana e sua inerrância foi colocada ainda mais em cheque.