quinta-feira, 18 de abril

Pregação evangelística um ofício perdido

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Estou preocupado. Estou bastante preocupado com a ausência de pregação evangelística em nossos dias. Em muitos púlpitos, o que se chama de pregação evangelística é basicamente um apelo aos não-crentes, um apelo acrescentado ao final da maioria dos sermões. Onde estão os sermões que, do início ao fim, argumentam, explicam e provam, com base nas Escrituras, que Jesus é o Cristo? Onde estão os sermões preparados especificamente para expulsar de cada esconderijo e fenda iníqua os pecadores, até que se prostrem diante da cruz de Cristo? Onde estão os sermões que lutarão contra consciências entenebrecidas, até que estas vejam sua necessidade de reconciliação com Deus, por intermédio de Jesus Cristo? Para onde foram os sermões sobre fogo e enxofre do inferno, pregados nas gerações passadas? Onde estão os sermões semelhantes aos de George Whitefield, aos dos irmãos Wesley, Howell Harris, Jonathan Edwards e Asahel Nettleton?

Quero assegurar-lhes desde o início que não estou, de maneira alguma, sugerindo que temos de alcançar tal proeminência em resultados evangelísticos, a ponto de encontrarmos nossos nomes no “Rol da Fama” dos evangelistas. Isso seria esperar demais. Temos diferentes dons e diferentes graus de talentos. Alguns são mais dotados em pregação evangelística, enquanto outros realizam melhor trabalho ministrando aos crentes. Quanto a isto não tenho dúvida. O que estou dizendo é que todos nós, chamados ao ministério de pregação, temos de fazer algo para recuperar o ofício perdido da pregação evangelística, antes que o percamos completamente. Está se tornando bastante difícil encontrar pregadores que realizem conferências evangelísticas nas igrejas; porém, encontramos pregadores em abundância, quando desejamos que alguém realize uma conferência sobre a vida cristã bem-sucedida,

Quando consideramos as palavras finais do apóstolo Paulo a Timóteo, um jovem pastor em Éfeso, não há dúvida de que a pregação evangelística foi um dos deveres sobre os quais Timóteo foi exortado a não negligenciar. Timóteo foi instruído a realizar a obra de evangelista como parte do cumprimento de todos os deveres do seu ministério. Temos de fazer o mesmo. Em meio ao árduo labor de ensinar aos crentes os fundamentos da fé e como eles devem viver, também precisamos ocupar-nos com labores evangelísticos. Em meio ao trabalho de guiar o povo de Deus à vida eclesiástica apropriada, também precisamos levar pecadores a Cristo. Não devemos realizar somente um aspecto ou outro do ministério. Temos de realizar ambos.

Por que estamos perdendo a pregação evangelística?

Não tenho dúvida de que a ligação das igrejas com o arminianismo e as poderosas táticas de pressão, recentemente usadas para trazer as pessoas “à frente”, constituem uma das razões por que a pregação evangelística tem desaparecido. Qualquer pastor interessado em ter um ministério que honra a Deus desejará se manter tão distante quanto possível dessas táticas.

Um estudo elementar da História da Igreja demonstrará que o apelo para vir à frente é uma inovação moderna que tem, no máximo, cem anos de existência. Portanto, faremos bem em rejeitá-lo como parte da pregação evangelística. Mas receio que, ao abandonarmos completamente a pregação evangelística por causa deste apelo, nos despojemos inconscientemente de algo valioso. Sim, temos de odiar qualquer tipo de manipulação. Isto traz bodes à membresia da igreja e, deste modo, compromete o testemunho da igreja no mundo. Entretanto, a pregação evangelística tem de ser vista como o fundamento de nossa chamada ao ministério.

Infelizmente, o ofício perdido da pregação evangelística resultou no ofício perdido do evangelismo pessoal. Visto que os membros das igrejas não vêem no púlpito uma paixão pelas almas, estão perdendo esta paixão em seu viver. A igreja reflete aquilo que vê no púlpito. Além disso, a vantagem de ter pregação evangelística, no púlpito, é que os crentes têm regularmente, diante de si, um modelo a respeito de como apresentar, com eficiência, o evangelho aos não-crentes. Uma igreja nunca atingirá um nível mais elevado do que o de seu púlpito. Se o púlpito está indo mal em alcançar os pecadores, o restante da igreja irá de maneira semelhante. Isto explica o desaparecimento da prática de testemunhar com a finalidade de ganhar almas em nossos dias. Nós, pregadores, somos culpados!

Embora tenhamos de nos preocupar com a pregação evangelística “fora da igreja”, onde os pecadores estão, não podemos negligenciar a necessidade de pregarmos evangelisticamente para aqueles que freqüentam, com regularidade, a igreja. Alguns crentes acham que isto é desnecessário porque, dizem eles, as pessoas que freqüentam a igreja são crentes. Mas, isto é realmente verdade? Talvez seja verdade em alguns países do Ocidente nos quais a igreja está morrendo.

O que tenho observado, na África e em muitas partes do mundo onde já preguei, é que considerável número de pessoas que estão na igreja aos domingos é constituído de não-crentes. Estes precisam ouvir o evangelho não como um anexo ao final do sermão preparado para crentes, e sim como uma mensagem que almeja alcançá-los de modo específico. A pregação evangelística na igreja também estimula os crentes a convidarem seus amigos e colegas de trabalho, que eles procuram trazer a Cristo. Os crentes estão certos de que, se o convite for aceito, os seus amigos certamente ouvirão o evangelho.

A pregação evangelística também é edificante e revigorante para os crentes. A cruz apresentada novamente, com o apelo da pregação evangelística, geralmente faz os crentes dizerem: “Sabem, se eu ainda não fosse crente, teria entregado minha vida a Cristo hoje”. Eles vêem, uma vez mais, a tolice e a futilidade de uma vida sem Cristo, e as fontes de amor por Cristo jorram outra vez, ao contemplarem o derramamento do sangue na cruz.

A apresentação do leite das doutrinas evangélicas de redenção — o novo nascimento, a união com Cristo, a justificação, etc. — alimentam a alma do crente na mesma proporção que o faz a carne forte da Palavra. Por conseguinte, a pregação evangelística também será boa para os crentes, enquanto não for a única dieta pela qual eles vivem.

Desafios da pregação evangelística

Um dos desafios enfrentados pela pregação evangelística é que os pastores têm de focalizar-se no homem comum. Pregar tendo como alvo os crentes oferece a vantagem de que se pode imaginar quais são os interesses deles, desde o preparo do sermão. Afinal de contas, eles pagam o pastor para fazer esse trabalho! Mas, no caso dos incrédulos, a atenção deles tem de ser conquistada. Você tem de ganhar o direito de ser ouvido e isto desde os primeiros dez minutos.

Além disso, você pode ser bem-sucedido ao utilizar muitos termos conhecidos pelos crentes, ao pregar para eles, porque todos na igreja lêem a Bíblia e usam o mesmo vocabulário teológico. Mas, quando você tem de pregar para os incrédulos, o que têm em comum é o jornal do dia e a TV. Se você almeja pregar o evangelho com eficiência, tem de usar a linguagem comum do dia-a-dia. E isto pode ser bem difícil para alguém que tem se protegido do mundo em um ambiente espiritual.

Parece que um dos desafios que a igreja enfrenta hoje, talvez mais do que em qualquer outra época da História, é a realidade de outras religiões em uma sociedade que aceita todas as religiões como filosofias igualmente aceitáveis. A pergunta comum hoje é: “À luz da existência de outras religiões, o cristianismo não é apenas um dos muitos caminhos pelos quais o homem pode ir ao céu?” A resposta geralmente é: “Sim!” Por isso, evangelizar aqueles que são seguidores sinceros de outras religiões não é somente um ofício perdido, mas também é visto como um insulto. Portanto, uma pregação direta, fora da igreja, afirmando que Cristo é o único caminho para o céu não recebe o devido crédito. Parece mais seguro apenas afirmar isso (de modo breve!) em um sermão pregado nas dependências da igreja.

No entanto, a resposta bíblica é que todo aquele que não tem a Jesus está condenado. Isto é afirmado mesmo no pluralismo religioso de nossos dias. Temos de compreender que o pluralismo religioso não é algo novo. Em cada lugar aonde chegaram as missões pioneiras, o pluralismo teve de ser enfrentado. Quando Pedro disse a respeito de Jesus: “Não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos” (At 4.12), estava declarando estas palavras a líderes de uma religião preexistente.

Outro desafio da pregação evangelística freqüente é onde encontrar textos bíblicos para manter esse ministério a cada ano. Neste aspecto, o evangelista itinerante tem a vantagem de poder repetir seus dez “mais poderosos” sermões evangelísticos aonde quer que vá. Como um pastor residente, você não goza desse luxo. Então, como podemos resolver esta questão? O erro que muitos de nós cometemos é procurar apenas os textos bíblicos que contêm temas claros de redenção, ou seja, a Páscoa, o cordão vermelho de Raabe, a serpente de bronze feita por Moisés, etc. Depois de havermos pregado sobre estes textos ou outros textos evangelísticos claros (por exemplo, Isaías 55), nos sentimos emperrados e abandonamos a pregação evangelística. Esta é uma situação bastante infeliz.

A verdade é que a Bíblia tem bastante material evangelístico para o pastor gastar duas vidas com esse tipo de pregação! Se o espaço deste artigo permitisse, demonstraria isso. Mas quero indicar-lhes um mestre nesta área. Leiam duas das obras do Dr. Martyn Lloyd-Jones: Sermões Evangelísticos(Editora PES, São Paulo) e Sermões Evangelísticos no Antigo Testamento(Editora Banner of Truth, Londres). Estes livros são excelentes exemplos a respeito de como vocês podem usar textos do Antigo e do Novo Testamento para mensagens evangelísticas.

Obtendo paixão pela pregação evangelística

O segredo de perseverar no ministério da pregação evangelística é ter amor pelos perdidos que se encontram ao seu redor. Este amor o manterá pregando o evangelho especificamente para a salvação deles, como também manterá você suspirando pela salvação deles, até que Deus comece a honrar seus esforços, convertendo-os.

O apóstolo Paulo disse: “Conhecendo o temor do Senhor, persuadimos os homens” (2 Co 5.11). Ou, conforme disse, em certa ocasião, Charles H. Spurgeon: “Se você quer ganhar almas para Cristo, sinta uma solene inquietação quanto a elas. Não será possível fazê-las sentir esta inquietação, se você mesmo não a sente. Creia no perigo em que as pessoas se encontram, creia na incapacidade delas, creia que somente Cristo pode salvá-las e fale com elas como se você quisesse realmente tratar sobre isso. O Espírito Santo comoverá essas pessoas, comovendo primeiramente a você. Se você pode ficar tranqüilo diante do fato de que elas não estão salvas, elas também ficarão tranqüilas. Mas, se você estiver cheio de agonia por essas almas e não puder tolerar que elas se percam, logo você descobrirá que elas também ficam inquietas. Espero que você chegue a tal condição, que sonhe com seu filho ou com seu ouvinte perecendo, porque não têm a Cristo, e comece imediatamente a clamar: ‘Ó Deus, dá-me convertidos, se não eu morro’. Então, você terá convertidos”.

Irmãos, precisamos estar convencidos do que o mundo precisa ser salvo, se desejamos apreciar completamente quão vital é a pregação evangelística. O mundo ao nosso redor precisa ser salvo do poder do pecado, que escraviza e cega, e da culpa resultante do pecado. Lembrem-se: todos somos nascidos com uma natureza corrupta, que nos cega de modo que não vemos as coisas de Deus. Esta natureza também nos dá uma propensão para o mal; por conseguinte, a impiedade é o fruto desta natureza. Somos incapazes de mudar tal condição. Nascemos culpados diante de Deus, por causa do pecado de Adão e de nossos próprios pecados; isto implica que, por natureza, somos objetos da ira de Deus. O poder e a culpa do pecado fazem com que o nosso caso seja desesperador. Estes fatos não são apenas bíblicos, mas também descobertos na experiência.

Tendo este quadro terrível diante de si, os apóstolos afirmaram que existe somente uma fonte de salvação — Cristo. Em vez de contender a respeito desta singularidade do evangelho, devemos nos admirar quando uma pessoa encontra a salvação. Tudo o que precisamos fazer é considerar nossa vida passada e observar como estávamos presos ao pecado. Provavelmente, experimentamos uma religião após outra, mas nossa consciência nunca ficou satisfeita. Todas as religiões falham porque vêem a raça humana como seres em processo de provação (e, evidentemente, falhos). As religiões estão dizendo a um escravo e prisioneiro que liberte-se a si mesmo. É impossível! A salvação tem de começar com o apaziguamento de Deus, então Ele salvará o homem. Isto é algo que somente o pregador cristão pode oferecer, em sua pregação evangelística.

É nisto que vemos a absoluta necessidade do evangelho, que começa com o apaziguar a Deus na cruz de Cristo. Ele foi “dado aos homens” mediante sua morte sacrificial. Sofreu a ira de Deus como nosso substituto. A morte de Cristo, na cruz, removeu o nosso pecado e a ira de Deus. Para mostrar que ficou plenamente satisfeito com o pagamento, Deus ressuscitou a Jesus dentre os mortos. Jesus ascendeu ao céu, de onde enviou o Espírito Santo, que nos regenera, nos convence, nos mostra a Jesus, nos salva e nos santifica. Todo pregador do evangelho deve proclamar esta mensagem pelo menos uma vez por semana, em seu púlpito. Temos um grande Salvador. Ele tem de ser proclamado!

Esta é a razão por que a pregação evangelística está se tornando cada vez mais um ofício perdido. Você, que tem sentido as dores de uma consciência culpada e que tem encontrado paz com Deus; você, que sentiu as inflexíveis algemas do pecado e já encontrou liberdade em Cristo, ofereça esta liberdade aos perdidos, que perecem! Pare de desperdiçar seu tempo tentando comparar as religiões. Por que procurar vida entre os mortos? Proclame o único evangelho até seu último dia de vida. Permita que as pessoas do mundo saibam que podem implorar que Cristo as salve e que podem experimentar o poder salvador dEle. Amém!


Autor: Conrad Mbewe

Pr. Mbewe é pastor da Igreja Batista Kabwata em Lusaka, Zâmbia. Foi preletor da Conferência Fiel no Brasil, autor de vários artigos e faz parte do núcleo da Reforma África Austral. É conhecido pelo seu amor para com o Senhor e fidelidade à Sagradas Escrituras. Veja o seu artigo na revista “Fé Para Hoje”, nº16, com o título “Pureza Pastoral”.

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