Uma das razões incompreensíveis pela qual amamos a vinda de Cristo é que todos os cristãos que já morreram serão ressuscitados dentre os mortos com seus novos corpos ressurretos (1Co 15.23, 43), e todos os cristãos que estiverem vivos na vinda de Cristo serão transformados para terem corpos semelhantes ao corpo glorioso de Cristo após a ressurreição (Fp 3.21). Além dessa maravilha física envolvendo a transformação e ressurreição do corpo, haverá também uma transformação moral e espiritual para aqueles que estiverem vivos por ocasião da vinda de Cristo (1Jo 3.2), de modo que nunca mais pecaremos. Para os crentes que tiverem morrido antes da segunda vinda de Cristo (incluindo os santos do Antigo Testamento), essa transformação espiritual acontecerá na presença de Cristo, antes que o Senhor retorne (Hb 12.23).
Tanto a ressurreição física quanto a transformação espiritual são essenciais aos propósitos finais de Deus. Seu povo tem de passar por um aperfeiçoamento moral e físico. Se, na segunda vinda, a glória de Cristo há de ser magnificada adequadamente na admiração de seu povo (2Ts 1.10), essa admiração tem de ser liberta de suas corrupções e limitações pecaminosas. É necessário que essa admiração seja transformada e aperfeiçoada. Cristo é digno de tudo isso. Sem dúvida, a glória da graça de Deus resplandece belamente na justificação de crentes imperfeitos. Há, no entanto, mais graça em Cristo do que a graça justificadora. Também há o extraordinário poder da graça santificadora e purificadora (1Co 15.10; 2Co 9.8; 2Ts 1.11-12). Para que Cristo seja magnificado em nossa admiração em sua vinda, essa graça deve ser triunfante em nossa transformação completa. Do contrário, a nossa admiração será maculada pelo pecado.
Não somente isso, mas, se Cristo há de ser glorificado adequadamente em seu povo na segunda vinda, seus corpos devem ser glorificados de modo a refletir a glória de Cristo. Corpos que carregam as imperfeições vãs e corruptas da Queda (Rm 8.20-21) nunca poderão magnificar a Cristo como deveriam. Isso ocorre não apenas porque a ressurreição e o aperfeiçoamento de nosso corpo glorificarão o “poder que ele tem de até subordinar a si todas as coisas” (Fp 3.21). Outro motivo é que o nosso corpo é o instrumento da nossa mente e do nosso coração que Deus designou para tornar audível o nosso louvor e visível a obediência do nosso amor. O entrelaçamento que Deus criou entre a alma e o corpo (cujos mistérios a ciência moderna não pode sondar) exige tanto um corpo redimido quanto uma alma redimida, a fim de que o louvor e a obediência de nossa alma encontrem a expressão corporal da qual Cristo é digno.
Sempre houve falsos mestres que denegriram a existência no corpo como inerentemente defeituosa e prejudicial para o espírito humano. A visão bíblica do corpo é muito diferente. O corpo não somente é parte do que Deus criou e descreveu como “muito bom” antes da Queda (Gn 1.31), mas também está destinado a ser ressuscitado, aperfeiçoado e tornado uma parte eterna de nossa adoração e nossa obediência. À semelhança de Cristo, o povo de Deus terá um corpo físico transformado para sempre. Se a nossa ideia de eternidade é a de um futuro em que seremos espíritos sem corpos no céu, deveríamos testar essa visão sob o crivo do ensino bíblico de que os céus descem a uma nova terra em que pessoas corporificadas adoram um Cristo corporificado (Ap 21.1-2, 10). Portanto, a transformação física e espiritual que acontece na segunda vinda é essencial para a conclusão do propósito final de Deus para a criação.
Lidemos primeiro com a ressurreição do corpo e, depois, com a transformação moral de nosso coração e de nossa mente, pois ambas são consumadas na segunda vinda de Cristo.[i]
Cristo ressuscitou seu próprio corpo e ressuscitará o nosso
Jesus confrontou os saduceus, que não acreditavam na ressurreição. “Os saduceus, que dizem não haver ressurreição, aproximaram-se dele” (Mc 12.18). A resposta de Jesus aos saduceus foi clara e franca: “Não provém o vosso erro de não conhecerdes as Escrituras, nem o poder de Deus?” (Mc 12.24). Jesus não somente acreditava na ressurreição dos mortos, mas também sabia que Deus, o Pai, lhe dera autoridade para fazê-la acontecer. “Porque assim como o Pai tem vida em si mesmo, também concedeu ao Filho ter vida em si mesmo. E lhe deu autoridade para julgar, porque é o Filho do Homem” (Jo 5.26-27). Por isso, Jesus podia dizer: “Eu sou a ressurreição” (Jo 11.25). E promete que ressuscitará seu povo dentre os mortos no último dia:
Todo aquele que o Pai me dá, esse virá a mim; e o que vem a mim, de modo nenhum o lançarei fora. Porque eu desci do céu, não para fazer a minha própria vontade, e sim a vontade daquele que me enviou. E a vontade de quem me enviou é esta: que nenhum eu perca de todos os que me deu; pelo contrário, eu o ressuscitarei no último dia. De fato, a vontade de meu Pai é que todo homem que vir o Filho e nele crer tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia (Jo 6.37-40; cf. v. 54).
Jesus disse que ele mesmo será aquele que ressuscitará seu povo dos mortos, assim como disse que ressuscitaria seu próprio corpo do sepulcro. “Ninguém a [minha vida] tira de mim; pelo contrário, eu espontaneamente a dou. Tenho autoridade para a entregar e também para reavê-la” (Jo 10.18). “Destruí este santuário, e em três dias o reconstruirei” (Jo 2.19). Isso não contradiz a afirmação frequente de que ele seria “ressuscitado [por Deus]” (Mt 16.21; 17.23; 20.19). Toda a Trindade esteve engajada na ressurreição de Jesus, incluindo o Espírito Santo: “Se habita em vós o Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos, esse mesmo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivificará também o vosso corpo mortal, por meio do seu Espírito, que em vós habita” (Rm 8.11). A implicação natural nessa passagem é que Deus nos ressuscitará “por meio do seu Espírito”, como ressuscitou Jesus “por meio do seu Espírito”.
Ressuscitados pela Trindade para ter um corpo semelhante ao do Filho
Portanto, o que aprendemos é que os cristãos serão ressuscitados dentre os mortos não somente pelo Espírito (Rm 8.11), mas também por Deus (o Pai) e por Cristo (o Filho):
O corpo não é para a impureza, mas, para o Senhor, e o Senhor, para o corpo. Deus ressuscitou o Senhor e também nos ressuscitará a nós pelo seu poder (1Co 6.13-14).
A nossa pátria está nos céus, de onde também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, o qual transformará o nosso corpo de humilhação, para ser igual ao corpo da sua glória, segundo a eficácia do poder que ele tem de até subordinar a si todas as coisas (Fp 3.20-21).
Em ambas as passagens, a ressurreição de Cristo e a nossa ressurreição estão conectadas. Estão ligadas em 1 Coríntios 6.14 porque Deus realiza ambas as ressurreições. Estão ligadas em Filipenses 3.20-21 para deixar claro que o nosso corpo ressurreto será semelhante ao corpo ressurreto de Cristo. A causa de ambas as ressurreições será a mesma: Deus. E o efeito de ambas as ressurreições será o mesmo: um corpo semelhante “ao corpo da sua glória” (σύμμορφον τῷ σώματι τῆς δόξης αὐτοῦ). A nossa ressurreição e a de Cristo, diz Paulo, são parte de uma grande colheita. “Cristo ressuscitou dentre os mortos, sendo ele as primícias dos que dormem” (1Co 15.20). As primícias definem e garantem toda a colheita.
O corpo ressurreto de Cristo era um corpo físico real e tão semelhante ao seu corpo pré-ressurreição que ele pôde ser reconhecido, tocado e até comer peixe. “Vede as minhas mãos e os meus pés, que sou eu mesmo; apalpai-me e verificai, porque um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho […] Então, lhe apresentaram um pedaço de peixe assado [e um favo de mel]. E ele comeu na presença deles” (Lc 24.39, 42-43). Nosso corpo ressurreto será assim.
Este artigo é um trecho adaptado com permissão do livro Vem, Senhor Jesus!, de John Piper, em breve pela Editora Fiel.
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[i] No final deste capítulo, ficará evidente o que pretendo dizer ao me referir à consumação de nossa transformação moral na segunda vida, embora os espíritos dos que falecem no Senhor sejam “aperfeiçoados” no céu (Hb 12.23).