O texto abaixo foi extraído do livro Enriquecendo-se com a Bíblia, de Arthur W. Pink, da Editora Fiel.
Há sérias razões para crermos que, nestes últimos tempos, grande parte da leitura e do estudo da Bíblia não têm sido proveitosos para aqueles que com eles se têm ocupado. E, vamos mais longe, pois tememos que, em muitos casos, isso tem sido uma maldição, e não uma bênção. Estamos perfeitamente cientes de que esta é uma linguagem severa, mas não é mais forte do que a situação exige. Os dons de Deus podem ser submetidos a uso errôneo, e as misericórdias divinas podem ser alvo de abusos.
O fato de que isso é realmente verdadeiro torna-se evidente nos frutos produzidos. Até o homem natural pode (e, com frequência, o faz) dedicar-se ao estudo das Escrituras com o mesmo entusiasmo e prazer com que se dedicaria ao estudo das ciências. Quando ele age assim, aumenta o seu cabedal de conhecimentos, mas também aumenta o seu orgulho. Assim como o químico atarefado em fazer experiências interessantes, o pesquisador intelectual da Palavra é invadido de satisfação, ao fazer ali alguma descoberta, mas a alegria deste não é mais espiritual do que a daquele. Além disso, assim como os sucessos de um químico acentuam geralmente o seu senso de importância própria, levando-o olhar com desdém os mais ignorantes do que ele mesmo, assim também, infelizmente, acontece com aqueles que investigam a numerologia, a tipologia, a profecia bíblica e outros temas semelhantes.
O estudo da Palavra de Deus pode ser realizado com base em vários motivos. Alguns leem a Bíblia para satisfazer seu orgulho literário. Em certos círculos, tornou-se respeitável e popular a obtenção de um conhecimento geral do conteúdo da Bíblia, apenas porque a ignorância quanto à Bíblia é considerada uma falha na educação. Outros a leem para satisfazer seu senso de curiosidade, como o fariam com qualquer outro livro famoso. Ainda outros a leem para satisfazer seu orgulho sectarista. Estes consideram um dever estarem familiarizados com as crenças particulares de sua própria denominação, pelo que também buscam ansiosamente textos que provem e apoiem o que eles chamam de “nossas doutrinas”. Ainda há aqueles que leem a Bíblia com o propósito de argumentar eficazmente com aqueles que discordam de suas opiniões. Em toda essa atividade, não há qualquer pensamento sobre Deus, não há qualquer anelo pela edificação espiritual, e, por conseguinte, não há qualquer benefício genuíno para a alma.
Então, de que maneira podemos nos beneficiar da Bíblia? A passagem de 2 Timóteo 3.16-17 não dá uma resposta clara para essa pergunta? O texto bíblico nos diz:
“Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra”.
Observemos o que é omitido: as Escrituras Sagradas não nos foram dadas para satisfazer nossa curiosidade intelectual ou nossas especulações carnais, e sim para capacitar-nos para toda boa obra, mediante o ensino, a reprovação e a correção. Ampliaremos isso com a ajuda de outros textos bíblicos.
A Palavra convence do pecado
Este é o primeiro propósito das Escrituras: revelar a nossa depravação, desmascarar a nossa vileza, tornar conhecida a nossa iniquidade. A vida moral de um homem pode ser irrepreensível, seu trato com os semelhantes pode ser sem faltas; mas, quando o Espírito Santo aplica a Palavra ao seu coração e à sua consciência, abrindo-lhe os olhos fechados pelo pecado, para que perceba a sua relação e a sua atitude para com Deus, ele exclama: “Ai de mim! Estou perdido” (Is 6.5). É desse modo que toda a alma verdadeiramente salva é levada a perceber a sua necessidade de Cristo.
“Os sãos não precisam de médico, e sim os doentes” (Lc 5.31).
Contudo, somente quando o Espírito aplica a Palavra, com poder de Deus, a pessoa é levada a sentir-se enferma, enferma até à morte.
Esta convicção, que impressiona o coração com o fato de que o pecado produziu tremenda devastação na constituição humana, não se restringe à experiência inicial que precede à conversão. Cada vez que Deus exalta a sua Palavra em meu coração, sou levado a perceber quão longe ando do padrão que Ele me apresenta, ou seja:
“Tornai-vos santos também vós mesmos em todo vosso procedimento” (1Pe 1.15).
Aqui temos o primeiro teste a ser aplicado: quando leio sobre os tristes fracassos de diferentes personagens das Escrituras, isso me faz perceber quão parecido eu sou com eles? E, quando leio a vida bem-aventurada e perfeita como a de Cristo, isso me faz reconhecer quanto sou bastante diferente dele?
O estudo da Bíblia, querido leitor, tem feito de você uma pessoa mais humilde ou mais orgulhosa – orgulhosa do conhecimento que adquiriu?
Esse estudo o eleva na estima de seus semelhantes ou o humilha na presença de Deus? Produz em sua experiência uma atitude de mais profunda repulsa e desprezo por si mesmo ou o torna mais complacente? Tem feito com que pessoas de seu convívio, as quais talvez você ensine, digam: “Gostaria de ter o seu conhecimento sobre a Bíblia”? Ou o tem levado a orar: “Senhor, dá-me a fé, a graça e a santidade que tens dado a meu irmão e professor”? “Medita estas coisas e nelas sê diligente, para que o teu progresso a todos seja manifesto” (1 Tm 4.15).