domingo, 24 de novembro
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De volta ao Bloggernáculo

A vida delas não é nada parecida com a minha

As primeiras plataformas on-line para mulheres eram blogs. Como escritora, você deve achar que blogs são a minha especialidade, mas o fato é que nunca comecei um — não por ter alguma objeção muito bem ponderada, mas simplesmente por não conseguir pensar no que dizer.

Acho que fui a única a ter esse problema, já que, entre 2003 e 2006, o número de blogs dobrou de trinta milhões para sessenta milhões.[1] Empresas, escolas de jornalismo e equipes de relações públicas começaram a levar os blogs a sério. Em 2005, foi a primeira vez que um blogueiro conseguiu entrar como imprensa na Casa Branca.[2]

A categoria de blogs de mães agora era grande o suficiente para se dividir em subcategorias — mães que cozinham, mães que fazem artesanato, mães do tipo “faça você mesma”, mães da moda, mães degustadoras de vinho, mães cristãs. [Ann Voskamp começou seu blog em 2004; Ree Drummond iniciou The Pioneer Woman (“A mulher pioneira”) em 2006].

E mães mórmons.

Escrever em blogs era algo natural para muitas jovens da comunidade dos Santos dos Últimos Dias. Os mórmons valorizam escrever diários, a família, uma vida saudável (sem álcool nem café) e economizar “fazendo você mesmo” — coisas que caem muito bem em blogs e redes sociais.[3] Em 2007, um ancião mórmon encorajou a criação de blogs em um discurso de abertura da Brigham Young University-Havaí. “Se você tem acesso à internet, em poucos minutos pode começar um blog e compartilhar aquilo que acredita ser verdade”, disse ele aos estudantes.[4]

Em 2010, havia dois mil blogs de mães mórmons e um blog de paródias cômicas chamado Seriously, so blessed! [“Sério, que bênção!”], também criado por mórmons.[5] O público era enorme — e nem todos eram mórmons.[6]

“A vida delas não é nada parecida com a minha — eu sou a típica feminista ateia, superculta, com vinte e muitos anos, sem filhos — e, mesmo assim, estou completamente obcecada por seus blogs”, escreveu Emily Matchar, no blog Salon, em 2011.[7] “Em um dia normal, dou uma olhada em meia dúzia de blogs mórmons, vendo fotos Polaroid de cachorros com roupas de chuva e crianças com gravata-borboleta, lendo listas de gratidão e admirando trabalhos de costura.”

Para pessoas não mórmons como Matchar, os blogs dessas mães foram como uma janela para um mundo aparentemente relaxante e pacífico, cheio de alegrias antiquadas, como amar seu marido, ficar em casa o dia inteiro com os filhos e decorar cookies com sua mãe e suas irmãs. Parecia uma versão do céu.

Algumas vezes, eu me pergunto se essa foi uma oportunidade que os cristãos desperdiçaram. Se fôssemos mais organizados, será que não poderíamos ter criado um exército de blogueiros para dar testemunho da verdade de Deus agindo em nossas vidas? Talvez pudéssemos. Talvez ainda possamos. Mas teríamos de evitar os erros de algumas mães mórmons blogueiras, como, por exemplo, não mencionar muito o mormonismo ou retratar uma vida boa demais para ser verdade.[8]

A popularidade dessas vidas “alegres e brilhantes” estava no extremo oposto dos primeiros blogs, que tratavam da vida real de forma nua e crua. Parecia que estávamos de volta às revistas de moda, que, em larga escala, vendiam às suas leitoras as roupas perfeitas, as bolsas de bebê perfeitas e as decorações de casas perfeitas.

Por que essa mudança? Se os leitores em geral eram atraídos pela sinceridade nua e crua daqueles primeiros dias, por que mudar?

Por motivos financeiros, meu caro Watson.

Fotos e dinheiros (por volta de 2010)

Foi na hora certa. Quatro meses depois do lançamento do iPhone 4 (o primeiro com câmera frontal), dois alunos de Stanford com cerca de vinte anos lançaram um aplicativo para compartilhar fotos. O Instagram foi sucesso imediato, conseguindo um milhão de usuários em poucos meses e sendo vendido para o Facebook por um bilhão de dólares em um prazo de dois anos.[9]

A facilidade de compartilhar fotos (e de editar e colocar filtro nelas) virou o jogo. Foi como mudar de preto e branco para colorido, de rádio para televisão. Parece que minha família inteira ficou mais fofa da noite para o dia e que momentos que antes eram normais — como pisar em uma poça de água na chuva, andar de bicicleta e ler livros juntos — de repente se transformaram em fotos planejadas. De forma alguma eu quis dizer isso em tom depreciativo, já que amei ver e registrar a beleza de nosso dia a dia. Mas você já sabe o perigo — mães passando mais tempo no celular do que com os filhos, e o malabarismo para fazer as coisas parecerem mais divertidas do que realmente são.

Outro efeito: agora não era mais necessário ser um escritor talentoso para se tornar popular. Bastava ser capaz de tirar boas fotos. E as empresas em geral, que já estavam cercando as fronteiras dos blogs e redes sociais, encontraram um meio de ficar frente a frente com os milhões de usuários das redes sociais.

A coisa funciona assim: o cérebro humano processa imagens com muito mais rapidez do que textos — você consegue identificar os arcos do McDonald’s e o sorriso da Amazon em um décimo de segundo. As fotos também servem para mexer com nossas emoções (você acharia mais fofo um bebê que eu lhe mostrasse do que um de quem eu apenas lhe falasse). As fotos ficam retidas em nossa memória por mais tempo que as palavras. Quando se adicionam fotos a uma postagem ou a um blog, há 40% mais de compartilhamento do que as postagens que não vêm acompanhadas de imagens.[10]

A essa altura, os blogs e as redes sociais se tornaram uma corrida do ouro para os publicitários. E dificilmente é possível culpá-los por isso — se antes você quisesse vender camisetas da Taylor Swift, teria de pagar por um comercial impresso (em um jornal ou uma revista de entretenimento) ou pagar por um horário comercial na televisão e torcer que acontecesse o melhor. Agora você pode pedir que o Facebook mostre seu comercial a mulheres de 18 a 24 anos que vivam em Chicago e nos arredores quatro semanas antes de um show da Taylor Swift.

Ou você pode pagar a um influenciador do Instagram — talvez alguém de 25 anos, com cem mil seguidores, que goste de música e viva em Chicago — para usar a camiseta, dizer como ela é confortável e deixar um link para sua loja.

Mulheres que eram populares nas redes sociais agora tinham a oportunidade de juntar alguns trocados, terminar de pagar as parcelas do carro ou — se forem realmente famosas — ajudar sua família. Algumas aproveitaram o sucesso on-line para lançar livros (em 2013, Glennon Doyle publicou Carry on, warrior [Em frente, guerreira]), apresentar programas de televisão (em 2015, Jen Hatmaker apresentou o reality show Your big family re-novation [Sua grande renovação familiar]) e vender produtos (em 2017, as lojas Target começaram a vender a linha de decoração doméstica Magnólia, de Joanna Gaines). Em 2016, as empresas gastaram 255 milhões de dólares mensais com marketing via influenciadores.[11]

Para essas mulheres, as redes sociais se tornaram um negócio. Para serem bem-sucedidas, elas precisavam atrair cada vez mais seguidores, que iriam clicar e comprar aquilo que sua marca estivesse vendendo. Assim, suas postagens começaram a ser mais pensadas, e suas fotos, mais bonitas. Suas mensagens não visavam mais aos seus amigos, mas, sim, ao público mais amplo.

Isso significava que mulheres não influenciadoras muito provavelmente estavam em um público, seguindo pessoas que nunca conheceram na vida real.

“Você não estava mais apenas olhando o que seu irmão fez no fim de semana”, disse-me Laura Wifler, cofundadora da Risen Motherhood [Maternidade ressurreta]. “Agora você estava seguindo pessoas que nem sequer conhecia. Por que fazemos isso? Há um elemento de curiosidade nisso — para ver como o outro vive, o que as outras mães fazem.”

E há graça comum nisso — eu aprendi como dobrar lençóis com elástico corretamente, como memorizar versículos bíblicos de modo mais eficaz e como criar um guarda-roupa cápsula.[12]24 No entanto, como tudo o mais, as redes sociais também se baseiam em sistemas imperfeitos e povoados de pecadores. Também há um pouco de espionagem, ganância, ciúmes e de seguir alguém só para se sentir melhor consigo mesmo.

 

 


[1] Donald K. Wright e Michelle D. Hinson, “How blogs and social media are changing public relations and the way it is practiced”, Public Relations Journal 2, n. 2 (primavera de 2008). Disponível em: https://citeseerx.ist.psu.edu/viewdoc/download? doi=10.1.1.590.7572&re- p=rep1&type=pdf.

[2] Katharine Q. Seelye, “MEDIA; White House approves pass for blogger”, New York Times, 7 mar. 2005. Disponível em: https://www.nytimes.com/2005/03/07/washington/media-white-house-approves-pass-for-blogger.html.

[3] “Mormons”, History, 20 dez. 2017. Disponível em: https://www.history.com/topics/religion/ mormons.

[4] Elder M. Russell Ballard, “Sharing the gospel using the internet”, Ensign (jul. 2008). Disponível em: https://www.churchofjesuschrist.org/study/ensign/2008/07/sharing-the-gospel-using-the-internet.

[5] Amelia Nielson-Stowell, “Mormon moms connect through blogs”, Deseret News, 2 jun. 2010. Disponível em: https://www.deseret.com/2010/6/2/20118159/amelia-nielsons-towell-mormon-moms-connect-through-blogs; Molly Farmer, “A clever twist on mormon mommy blogs”, Deseret News, 21 jul. 2008. Disponível em: https://www.deseret.com/2008/7/21/20379464/a-clever-twist-on-mormon-mommy-blogs.

[6] Nona Willis Aronowitz e Brad Ogbonna, “Sister bloggers: why so many lifestyle bloggers happen to be mormon”, Good, 1º dez. 2011. Disponível em: https://www.good.is/articles/sister-bloggers.

[7] Emily Matchar, “Why I can’t stop reading mormon housewife blogs” , Salon, 15 jan. 2011. Disponível em: https://www.salon.com/2011/01/15/feminist_obsessed_with_mormon_blogs.

[8] Matchar, “Mormon housewife blogs”; Morgan Jones, “Are Utah and mormon mommy bloggers creating a false perception of reality?”, Deseret News, 24 jan. 2017. Disponível em: https:// www.deseret.com/2017/1/24/20604721/are-utah-and-mormonmommy-bloggers-creating-a-false-perception-of-reality.

[9] Statista Research Department, “Percentage of U.S. adults who use Instagram as of February 2021, by gender”, Statista, 14 abr. 2021. Disponível em: https://www.statista.com/statisti- cs/246195/share-of-us-internet-users-who-use-instagram-by-gender.

[10] Attilio Botta, “5 reasons why your marketing needs images (and how to use them)”, Bynder, última atualização em 27 de fevereiro de 2020, https://www.bynder.com/en/blog/the-im- pact-of-images.

[11] Deborah Weinswig, “Influencers are the new brands”, Forbes, 5 out. 2016. Disponível em: https://www.forbes.com/sites/deborahweinswig/2016/10/05/influencers-are-the-new-brands.

[12] 24 N.T.: Um “guarda-roupa cápsula” é um conjunto de poucas peças de roupa capazes de serem combinadas em um grande número de visuais. O objetivo é ter um visual adequado para cada ocasião sem ter que comprar muitas peças de roupa.


Autor: Sarah Eekhoff Zylstra

SARAH EEKHOFF ZYLSTRA é escritora e editora no ministério The Gospel Coalition. Já escreveu para o Christianity Today, trabalhou como freelancer para um jornal diário e lecionou no Trinity Christian College. Sarah mora com o marido e seus dois filhos nas proximidades de Chicago, onde são membros da Orland Park Christian Reformed Church.

Ministério: Editora Fiel

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A Editora Fiel tem como missão publicar livros comprometidos com a sã doutrina bíblica, visando a edificação da igreja de fala portuguesa ao redor do mundo. Atualmente, o catálogo da Fiel possui títulos de autores clássicos da literatura reformada, como João Calvino, Charles Spurgeon, Martyn Lloyd-Jones, bem como escritores contemporâneos, como John MacArthur, R.C. Sproul e John Piper.

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