Adão e Eva não tinham qualquer razão para se sentir vazios. O mundo deles estava cheio de toda a bondade. Para onde quer que olhassem, eles deparavam com aquilo que Deus trouxera à existência e declarara ser bom, até mesmo muito bom. Ele os colocou num jardim paradisíaco no qual havia plantado toda a sorte de árvores boas para alimento. Deus apenas falou: “Produza a terra relva, ervas que deem semente e árvores frutíferas que deem fruto segundo a sua espécie, cuja semente esteja nele, sobre a terra” (Gn 1.11). E assim se fez. E Deus viu que era bom.
Ninguém que se tenha esforçado para fazer uma árvore ou um arbusto enraizar-se num solo duro, ou que tenha passado um dia inteiro arrancando ervas daninhas no jardim, apenas para vê-las sufocando seus doces morangos, ou que tenha tentado afugentar as toupeiras para o jardim do vizinho (quem faria tal coisa?), pode sequer imaginar como deve ter sido aquilo. Nada apodrecia, murchava nem secava no Éden. A picada de um espinho jamais fez Adão correr atrás de um curativo. Adão e Eva receberam a tarefa de encher a terra, sujeitá-la e exercer domínio sobre ela. Do mesmo modo pelo qual Deus trouxe ordem ao caos inicial de sua criação, Adão deveria estender a ordem do Éden. Juntos, Adão e Eva deveriam ser fecundos e multiplicar-se, de modo que sua descendência iria estender os limites do Éden, enchendo-o de homens e mulheres, como Adão e Eva, portadores da imagem de seu Criador, a fim de que “a terra se [enchesse] do conhecimento da glória do Senhor, como as águas cobrem o mar” (Hc 2.14).
Nada faltava na vida de Adão e Eva; eles tinham todas as razões para ser perfeitamente felizes. Contudo, quando a serpente sugeriu a Eva que havia algo que ela não possuía, algo de que ela realmente precisava para ser feliz, ou seja, a sabedoria que viria de comer da árvore proibida e a experiência gustativa de comer seu delicioso fruto, Eva permitiu que a perspectiva da serpente moldasse a sua perspectiva. Em vez de se contentar com toda a bondade derramada sobre ela e ao seu redor, Eva começou a ver um lugar vazio em sua vida, em sua dieta, em seu conhecimento, em sua experiência. Seu desejo por algo mais, algo além da provisão de Deus, combinado com sua dúvida crescente acerca da bondade de Deus, a fez estender a mão por aquilo que ela achou que a faria feliz, plena e satisfeita.
Oh, como aquela mordida deve ter-se tornado amarga em seu estômago quando ela deparou com a realidade do que fizera! Oh, como aquele apetite por sabedoria deve ter parecido tão tolo depois de consumado! Quando Deus terminou de amaldiçoar a ser- pente e passou a dizer a Eva e Adão como essa maldição iria afetá-los, deve ter ficado claro que o que ela havia enxergado como um deleite era, de fato, um desastre. As mesmas coisas que deveriam trazer-lhes tanta alegria e satisfação, agora, trariam dor e frustração. Dar à luz filhos e criá-los neste mundo agora infectado pelo pecado seria doloroso. Seu casamento com Adão, o serem uma só carne, agora estaria repleto de atritos. O trabalho de Adão seria frustrante, em vez de gratificante. Adão fora designado para cultivar o solo, mas agora isso seria um labor doloroso. A terra daria fruto, mas também espinhos, espinhos que traspassariam a carne de Adão.
Aquela centelha de descontentamento que Eva acendeu no jardim deve ter-se tornado um fogo devastador depois que ela e Adão foram exilados no insubmisso deserto que os circundava. Porém, o descontentamento crônico que agora a perseguia revelou-se também como uma graça. Revelou-se como um constante lembrete de que o contentamento pleno e duradouro existe apenas na vida que lhes fora prometida se eles houvessem obedecido, se houvessem sido capazes de se banquetear eternamente do fruto da árvore da vida. Mas como eles o obteriam agora? Os anjos estavam em guarda, protegendo o caminho de volta ao jardim.
O próprio Deus providenciaria um caminho para seu povo entrar num jardim ainda melhor que o Éden. Ele começou chamando para si um homem que morava em Ur — Abraão —, para que ele morasse na terra que Deus lhe daria. Não havia nenhum anjo guardando a entrada daquela terra quando Abraão entrou nela, mas é interessante observar que, posteriormente, quando seu neto Jacó saiu daquela terra para encontrar uma esposa, ele lutou com um anjo em seu caminho de volta. Ao fim da vida de Jacó, seus filhos não estavam mais vivendo na terra, mas haviam sido escravizados no Egito. Então, Deus enviou um libertador que anunciou ao povo de Deus que ele havia descido “a fim de livrá-lo da mão dos egípcios e para fazê-lo subir daquela terra a uma terra boa e ampla, terra que mana leite e mel” (Êx 3.8). Meio que soa como um novo Éden, não é?
Artigo adaptado do livro Ainda melhor que o Éden, de Nancy Guthrie, publicado pela Editora Fiel.