O trecho abaixo foi extraído com permissão do livro Outro evangelho?, de Alisa Childers, Editora Fiel.
O que significa tomar a Bíblia de forma literal?
A palavra “fundamentalismo” é uma palavra carregada. Pode referir-se a um movimento, organizado por volta da virada do século XX e que reagiu contra a teologia modernista. Se pesquisarmos essa palavra, encontraremos várias definições. Uma delas é: “uma forma de religião, especialmente o Islamismo ou o Cristianismo Protestante, que defendem a crença na interpretação estrita e literal das escrituras.” Isso é razoável. O que significa tomar a Bíblia de forma literal? É dito que isso significa ler a Bíblia literalmente. Concordo. Significa ler a Bíblia no sentido claro em que está escrita. A Bíblia é uma coleção de livros com gêneros diferentes. Há poesia, metáforas e figuras de linguagem. Você concordará com isso, a menos que leia “cobrir-te-á com as suas penas, e, sob suas asas, estarás seguro”, no Salmo 91.4, e acredite que isso significa que Deus tem penas.
Outra definição de “fundamentalismo” é como esta de um dicionário: “Adesão estrita a qualquer conjunto de ideias e princípios.” Nesse sentido, todos são fundamentalistas. Todos têm um conjunto de princípios pelos quais vive. Na igreja progressista, esses princípios podem incluir a tolerância (exceto em relação aos cristãos conservadores) e inclusão (exceto daqueles que discordam da sua interpretação da Bíblia em relação à sexualidade). Ironicamente, esse tipo de tolerância torna o seu próprio fundamentalismo legalista.
Embora a palavra “fundamentalismo” tenha assumido uma conotação negativa (a última coisa que alguém quer ouvir é “o que você é … algum tipo de fundamentalista?”), eu não me importo em dizer que sou fundamentalista. Porque você também é. Nós todos somos. O que eu tenho problema é com o que eu descreveria como “hiperfundamentalismo”. Esse tipo de fundamentalismo vai além do essencial da fé. É conhecido por outro nome também: legalismo.
Muitos cristãos progressistas que conheço cresceram em um meio sectário restrito e de fé rígida, acreditando que alguém de fora do seu grupo era na melhor das hipóteses um cristão nominal e na pior delas um herege. Pelo fato de suas comunidades religiosas terem falhado em ensinar-lhes a diferença entre as crenças essenciais e não essenciais, toda a sua estrutura foi abalada no momento em que conheceu um cristão que acreditava de forma diferente, a respeito do arrebatamento ou sobre as eras da terra.
Um colega de classe relatou ter crescido em uma seita incrivelmente legalista, do tipo “ou faz do meu jeito ou toma o teu rumo”. Esse grupo considerava-se como a única igreja verdadeira, e acreditava que membros de todas as outras denominações cristãs estavam a caminho do inferno. Ao sair de casa pela primeira vez e conhecer crentes genuínos, que nunca tinham ouvido falar da sua congregação (“o quê… como assim?!”), isso suscitou sérias dúvidas sobre tudo o que lhe haviam sido ensinado.
Há outra maneira do hiperfundamentalismo ser expresso: através dos caçadores de heresias, que se deleitam em apontar os dedos. Levados por um apetite insaciável por controvérsia, esses praticamente roem até os ossos em busca de identificar o próximo falso mestre. Eles administram seus próprios “ministérios do discernimento”, com páginas na internet que atacam aqueles que não aderem às suas interpretações restritas das Escrituras a respeito de tudo – desde se o Espírito ainda confere dons e sinais, até discussões sobre se as mulheres devem, em qualquer ocasião, ensinar a um grupo que inclua homens – por qualquer razão que seja. No máximo que posso, procuro demonstrar graça aos cristãos que discordam de mim em questões que não afetam diretamente a salvação. Talvez, crescer em um ambiente onde essa graça está ausente possa causar confusão sobre o que é e o que não é essencial.