domingo, 17 de novembro
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Júbilo no céu e arrependimento

Por que os habitantes do céu se regozijam por pecadores arrependidos?… Deus não se alegra com o arrependimento de pecadores porque isso acrescenta alguma coisa à sua felicidade ou glória essencial. Ele é infinitamente glorioso e feliz; e continuará assim, embora todos os homens na terra e os anjos no céu se precipitassem loucamente no inferno… Então, por que Deus se regozija quando nos arrependemos?

Ele se regozija porque seus eternos propósitos de graça e seus compromissos com o Filho se cumprem. As Escrituras nos ensinam que todos os que se arrependem foram escolhidos por Deus, em Cristo Jesus, antes que o mundo existisse e dados a Cristo como povo de Deus, no pacto de redenção…

Deus se regozija quando pecadores se arrependem porque trazê-los ao arrependimento é uma obra dEle mesmo. É uma conseqüência do dom de seu Filho, uma conseqüência realizada pelo poder de seu Espírito. As Escrituras nos informam que Ele se alegra em suas obras. Com razão Deus se alegra nelas, pois são muito boas. Se Deus se regozija em suas outras obras, Ele se regozija muito mais nesta obra, visto que ela é a maior, a mais gloriosa e a mais digna de suas obras. Nesta obra, a imagem de Satanás é destruída, e a imagem de Deus é restaurada em uma alma imortal. Nesta obra, um filho da ira é transformado em herdeiro da glória. Nesta obra, um tição fumegante é removido das chamas eternas e plantado entre as estrelas do firmamento, no céu, para resplandecer ali com fulgor crescente e para sempre! E isso não é uma obra digna de Deus, uma obra em que Ele pode… se alegrar?

Deus se regozija com o arrependimento de pecadores porque isso Lhe dá oportunidade de exercer misericórdia e mostrar seu amor a Cristo, ao perdoá-los por causa dEle. Cristo é o Filho amado de Deus, que sempre se compraz nEle. Deus ama o Filho, como ama a Si mesmo, com infinito amor, uma amor que é inconcebível por nós quanto ao seu poder criativo e à sua duração eterna. Deus ama a Cristo não somente por causa da relação íntima e da união inseparável que existe entre Eles, mas também por causa da santidade e excelência perfeita de seu caráter, especialmente a infinita benevolência que Ele demonstrou em realizar e consumar a grande obra da redenção do homem. Visto que a natureza do amor consiste em manifestar-se a si mesmo em atos de bondade para com o objeto amado, Deus não pode fazer outra coisa senão revelar seu amor por Cristo e mostrar a todos os seres inteligentes quão perfeitamente Ele se agrada do caráter e da conduta de Cristo como Mediador…

Deus se regozija quando pecadores se arrependem porque se satisfaz em vê-los livres da tirania e das conseqüências do pecado. Deus é luz — perfeita santidade. Deus é amor — pura benevolência. A sua santidade e a sua benevolência fazem com que Ele se alegre quando pecadores são libertos do pecado. O pecado é aquela coisa abominável que Deus odeia. Ele odeia o pecado como uma coisa má ou perniciosa, repugnante ou destrutiva. O pecado é a praga, a lepra, a morte de criaturas inteligentes. Infecta e envenena as faculdades dessas criaturas. Lança-as nas maiores profundezas de culpa e miséria. Contamina-as com uma mancha que não pode ser removida por todas as águas dos oceanos, nem por todo o fogo do inferno, uma mancha que nada pode limpar, exceto o sangue de Cristo.

A malignidade da natureza do pecado é tal que, se pudesse ter acesso às regiões celestiais, logo transformaria os anjos em demônios e o céu, em inferno… O pecado já transformou os anjos em demônios. Já converteu o mundo, transformando em prisão aquilo que outrora era paraíso… Trouxe a morte ao mundo, bem como todas as nossas aflições… Agora mesmo o pecado anda com passadas gigantescas em nosso mundo escravizado, propagando ruína e infelicidade em inúmeras formas. Conflitos e discórdias, guerras e derramamento de sangue, fome e pestilência, doença e sofrimento seguem o rastro do pecado…

Se desejamos ver a consumação desses males e conhecer toda a extensão da miséria que o pecado tende a produzir, temos de segui-lo até ao mundo eterno. Temos de descer às regiões aonde não chegam a paz e a esperança. Ali, pela luz da revelação, contemplamos o pecado tiranizando suas vitimas infelizes com furor incontrolável, fomentando o fogo inextinguível e aguçando os dentes dos vermes imortais. Ali, vemos anjos e arcanjos, tronos e domínios, principados e potestades destituídos de sua glória e beleza primitivas, presos em cadeias eternas e vociferando furor e maldade contra Aquele em cuja presença eles, antes, se alegravam e cujo louvor entoavam. Seguindo-os através das longas eras da eternidade e vendo-os a se aprofundarem cada vez mais nos insondáveis abismos da ruína, blasfemando perpetuamente de Deus, por causa de suas misérias, e recebendo a punição dessas blasfêmias em acréscimos contínuos à sua infelicidade. Essas são as conseqüências do pecado. Essa é a inevitável condenação do impenitente.

Dessas profundezas de angústia e desespero, olhe para as mansões dos benditos e veja a que sublimidade de glória e felicidade a graça de Deus levará todo pecador que se arrepende. Veja em indescritível êxtase de alegria, amor e adoração aqueles que foram assim favorecidos, contemplando a Deus face a face, refletindo sua imagem perfeita, resplandecendo com um fulgor semelhante ao de seu glorioso Redentor. Veja-os repletos de toda a plenitude da Divindade e banhando-se naqueles rios de deleite que fluem para sempre à destra de Deus… Veja isso e diga se a infinita santidade e benevolência não pode se regozijar apropriadamente em todo pecador que, por meio do arrependimento, escapa das misérias e se assegura da felicidade aqui descrita de modo tão imperfeito!

Por que o Filho de Deus se regozija quando o pecador se arrepende?… Se perguntássemos por que Cristo se alegra por pecadores que se arrependem, responderíamos: porque lhes dá vida e nutrição espiritual; porque os redimiu, com seu precioso sangue, da miséria e desespero eternos. Cristo participa com o Pai e o Espírito Santo do gozo proveniente de outras razões. Todavia, o arrependimento é uma causa de alegria especial para Ele mesmo. Há muito fora predito que Cristo veria o fruto do penoso trabalho de sua alma e ficaria satisfeito (Is 53.11). Em outras palavras, Ele veria os efeitos de seus sofrimentos no arrependimento e salvação de pecadores e consideraria isso uma recompensa suficiente por todos os labores e tristezas que Lhe foram designados e pelos quais teve de passar. Essa predição se cumpre todos os dias. Nosso Emanuel vê o fruto do penoso trabalho de sua alma em todo pecador que se arrepende e se regozija no fato de que suas agonias não foram sofridas em vão…

Quem pode imaginar as emoções com as quais o Filho de Davi contempla uma alma imortal sendo atraída aos seus pés pelos laços do amor, uma alma que Ele resgatou do leão rugidor pagando um preço tão infinito? Se amamos, valorizamos em qualquer objeto e nele nos regozijamos em proporção ao labor, sofrimento e preço que nos custou, para que o obtivéssemos, Cristo ama, valoriza e se regozija muito mais em todo pecador que se arrepende! Seu amor e gozo são indescritíveis, inconcebíveis e infinitos… E, permita-me acrescentar, se Ele se regozija em pecadores que se arrependem, qual será o seu gozo quanto todas as pessoas forem reunidas, de toda língua, raça e nação, e apresentadas imaculadas diante do trono de seu Pai?… Quão grande deve ser o gozo e a felicidade que satisfaz à benevolência de Cristo!

Por que os anjos se alegram a respeito de cada pecador que se arrepende? Eles se regozijam quando pecadores se arrependem porque Deus é glorificado, e suas perfeições são manifestadas em outorgar-lhes o arrependimento e a remissão dos pecados. As perfeições de Deus são vistas somente em suas obras. Suas perfeições morais são vistas apenas, ou pelos menos  principalmente, em suas obras de graça. Deus manifesta mais de Si mesmo e mais de sua glória essencial em trazer um pecador ao arrependimento e perdoar seus pecados, por amor a Cristo, do que em todas as maravilhas da criação… Nesta obra, as criaturas podem ver, se posso assim dizer, o próprio coração de Deus.

Desta obra, os próprios anjos aprendem mais do caráter moral de Deus do que eram capazes de aprender antes. Eles sabiam que Deus era sábio e poderoso, pois viram a sua obra em criar todas as coisas. Sabiam que Deus era bom, pois os fizera perfeitamente santos e felizes. Sabiam que Deus era justo, porque O viram expulsar os seus irmãos rebeldes do céu para o inferno, por causa de seus pecados. Mas, enquanto não O viram outorgar arrependimento e remissão de pecados, por meio de Cristo, não sabiam que Ele era misericordioso. Não sabiam que Ele poderia perdoar um pecador.

Oh! que hora foi aquela quando esta grande verdade foi conhecida pela primeira vez no céu, quando o primeiro penitente foi perdoado! Uma nova canção foi colocada nos lábios dos anjos. E, embora tenham começado a entoá-la com indescritíveis emoções de amor, admiração e louvor, suas vozes se ergueram a um nível elevado, e eles experimentaram alegrias que não sentiam antes! Oh! como o som jubiloso: “Sua misericórdia dura para sempre”, se propagou de coro em coro, ecoou pelas abóbadas celestes e vibrou no peito de todos os anjos extasiados! E como eles clamaram a uma voz: “Glória a Deus nas maiores alturas, e paz na terra entre os homens, a quem ele quer bem” (Lc 2.14).

A misericórdia de Deus não é a única perfeição revelada nesta obra. Há mais poder e sabedoria demonstradas em trazer um pecado ao arrependimento do que em criar um mundo! Portanto, assim como os filhos de Deus cantaram e rejubilaram juntos quando Deus lançou os fundamentos da terra, assim também eles se regozijam com maior razão ao contemplarem as maravilhas da novacriação na alma de homens! Eles se deleitam em ver o começo da vida espiritual naqueles que, por muito tempo, estivavam mortos em delitos e pecados; em ver a luz e a ordem irrompendo nas trevas e confusão natural da mente; em ver a imagem de Satanás desaparecendo e as primeiras características peculiares da imagem de Deus surgindo na alma. Com satisfação inexpressível, eles vêem os corações de pedra transformados em corações de carne; observam as primeiras lágrimas do arrependimento que jorram dos olhos dos pecadores e ouvem as súplicas formuladas com imperfeição, os clamores infantis dos jovens filhos da graça. Com máxima prontidão, eles descem de sua habitação bendita para ministrar ao nascidos de novo, herdeiro da salvação. E cercam-no em hostes jubilosas, celebrando o seu nascimento com canções de louvor. Eles clamam: “Olhem, outro troféu da graça soberana e conquistadora!” Vejam outro cativo que o Filho de Davi libertou da escravidão ao pecado, outra ovelha do seu rebanho resgatado das garras do leão e da mandíbulas do urso! Vejam os principados e poderes das trevas frustrados. Vejam o homem forte banido. Vejam o reino de Jesus se expandindo. Vejam a imagem de nossos Deus multiplicada. Vejam outra voz afinada para unir-se nos aleluias dos coros celestiais. Isto é, ó nosso Criador, obra de tuas mãos. Glória a Deus nas alturas! Este é, ó adorável Emanuel, o fruto de teus sofrimentos. Hosana ao Filho de Davi! Adoração, honra e poder sejam tributados Àquele que se assenta no trono e ao Cordeiro para sempre!…

Ó meus amigos, deixem-se persuadir… deixem-se persuadir para dar júbilo a Deus, ao seu Filho e aos anjos benditos, fazendo deste dia um tempo festivo no céu, por arrependerem-se.

O arrependimento é um volver-se do pecado para Deus, por meio de Jesus Cristo; e a fé é a aceitação de Cristo para retornarmos a Deus. Assim, todo aquele que crê se arrepende, e todo que se arrepende crê. (Charles Hodge)

 

Extraído de “Joy in Heaven over Repenting Sinners”, em The Complete Works of Edward Payson, vol. III, reimpresso por Sprinkle Publications.

Traduzido por: Pr. Wellington Ferreira


Autor: Edward Payson

Edward Payson (1783-1827), pregador congregacional americano, nasceu em 1783 em Rindge, New Hampshire, onde seu pai, Seth Payson (1758-1820), foi pastor da Congregational Church. Seu tio, Phillips Payson (1736-1801), pastor de uma igreja em Chelsea, Massachusetts, foi físico e astrônomo. Edward Payson se formou em Harvard em 1803, enquanto era diretor de uma escola em Portland, Maine. Em 1807 tornou-se um dos pastores da Igreja Congregacional em Portland, onde permaneceu, depois de 1811, como pastor sênior até a sua morte, em 1827. A mais completa coleção de seus sermões, com dedicatória por Asa Cummings, publicado originalmente em 1828, é o Memoir, Select Thoughts and Sermons of the late Rev. Edward Payson (3 vols, Portland, 1846;. Philadelphia, 1859).

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Ministério Fiel: Apoiando a Igreja de Deus.

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