domingo, 15 de dezembro
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O comer e o beber dignamente

Um de nossos pregadores escoceses costumava dizer que o crente possui três visões sobre a Mesa do Senhor. Há, em primeiro lugar, uma visão retrospectiva. O sacramento da Ceia do Senhor é uma comemoração, uma celebração de um evento no passado. É um auxílio para que nos lembremos do ponto crucial e redentor da história, o ponto no qual o Filho de Deus morreu pelo seu povo. Não é uma reencenação do sacrifício, mas é um auxílio visual dramático para a fé, enquanto se olha para trás ao ponto da história em que o cordeiro sacrificial morreu por nós.

Em segundo lugar, há uma visão prospectiva no sacramento. Esse olhar é direcionado para frente com tanta certeza quanto se olha para trás. A visão prospectiva antecipa o retorno do Senhor. Ela pertence ao projeto da Ceia do Senhor, que é um arranjo temporário “até que ele venha”. A noiva de Cristo não se lembra da morte do seu noivo como uma viúva, mas como alguém que anseia pelo dia em que o noivo voltará para levá-la para casa.

No entanto, em terceiro lugar, deve haver uma visão introspectiva no sacramento. Somos chamados a olhar para dentro de nós mesmos, a fim de nos prepararmos para a Mesa do Senhor, examinando-nos. Não somos chamados para sermos auto-obsessivos, mas sim autoconscientes, e para nos colocarmos sob o escrutínio da Palavra de Deus, mesmo quando a Palavra de Deus nos convida a vir para a festa.

Em 1 Coríntios 11:27-28, o autoexame é necessário se quisermos evitar ser “réu do corpo e do sangue do Senhor”. O ser “réu” de que Paulo fala está ligado ao comer do pão ou beber do cálice “indignamente”. O autoexame é motivado por um desejo de glorificar a Deus em nossa participação no sacramento, para que possamos comer e beber “dignamente”.

A “dignidade” à qual Paulo se refere é adverbial, não adjetiva. Ou seja, não descreve as pessoas que participam, mas a maneira como elas fazem isso. Somos todos, cada um de nós, indignos do amor que nos convida à Mesa do Senhor. Nós não nos examinamos para ver se somos dignos ou se fizemos alguma coisa que nos torna mais dignos, desde a última vez que participamos do sacramento. Porém, temos que examinar a nós mesmos para ter certeza de que o nosso comer e o nosso beber são dignos, de que temos um título e um direito de estar à mesa, e de que o nosso tomar do pão e do vinho é apropriado e adequado.

Para isso, precisamos perguntar para quem o sacramento foi preparado? A resposta a essa pergunta é que foi preparado para os amigos de Jesus: “Vós sois meus amigos”, disse ele aos seus discípulos, “se fazeis o que eu vos mando” (João 15:14).

Aqui está um padrão segundo o qual podemos examinar nossa adequação para compartilhar do sacramento, para comer o pão e beber o vinho. Somos amigos de Jesus? Temos coisas em comum com ele, assim como têm os amigos? Sua glória é o nosso grande interesse? Sua obra salvadora no Calvário é a nossa única esperança? Sua morte e ressurreição são a base de toda a nossa vida?

Amigos compartilham segredos uns com os outros. Seria realmente estranho se amigos nunca se falassem e nunca se comunicassem. A verdadeira amizade gosta de expressar os anseios mais profundos e os pensamentos mais íntimos. Os amigos de Jesus não são diferentes. Ele tem falado com eles em sua Palavra, revelando-lhes os desejos do seu coração. Eles respondem a ele em oração e louvor, compartilhando todos os seus interesses com ele. Com Davi, eles dizem: “Na tua presença, Senhor, estão os meus desejos todos, e a minha ansiedade não te é oculta” (Salmo 38:9).

Amigos também cuidam um do outro. Os amigos de Jesus amam proteger seu nome e sua reputação. Eles amam fazer o que é certo e obedecer aos seus mandamentos. Sua obediência e serviço não são a base de sua participação digna no sacramento, pois sabem que eles lamentavelmente deixam a desejar mesmo em suas tentativas de servi-lo. No entanto, seu comer e beber dignamente têm a ver com o desejo que eles têm em suas almas de amar Jesus mais do que já amam, e de obedecê-Lo como ele merece.

Então, eu posso vir à Mesa do Senhor sobrecarregado com o sentimento da minha indignidade, quebrado pelo sentimento do meu pecado, triste por causa da minha desobediência. Mas nenhum desses sentimentos é suficiente para me manter longe da mesa se, em meu coração, eu sei que a morte do Cordeiro Pascal é a minha única esperança, e que Jesus ainda é o meu melhor amigo.

Não conheço nada que expresse melhor isso do que a primeira parte da resposta à pergunta “Quem deve vir à mesa do Senhor?”, do Catecismo de Heidelberg, a seguir:

Aqueles que, em verdade, estão descontentes consigo mesmos por causa dos seus pecados e que, mesmo assim, confiam que eles lhes foram perdoados e que o mal que ainda resta neles está coberto pelo sofrimento e morte de Cristo, e que também desejam fortalecer a sua fé e corrigir as suas vidas, cada vez mais.

Se, ao examinarmos os nossos corações, nós também encontramos esses anseios em nossas almas, então o Anfitrião da cerimônia nos diz: “Comei e bebei, amigos; bebei fartamente, ó amados” (Cantares 5:1).


Autor: Iain Campbell

Dr. Iain D. Campbell ministra na Point Free Church, uma congregação da Free Church of Scotland, localizada na Ilha de Lewis, Escócia. Ele é autor de The Seven Wonders of the World.

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