sábado, 15 de fevereiro
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O gênero e a estrutura literária de Gênesis

Este artigo faz parte da série Gênero e Características literárias dos livros da Bíblia, que são artigos retirados e adaptados com permissão da Bíblia de Estudo da Fé Reformada, Editora Fiel.


O conhecimento do gênero literário de um livro bíblico visa conduzir o leitor ao melhor entendimento das Escrituras, já que a Palavra de Deus é inspirada e que o próprio Deus planejou a escrita de cada gênero para um determinado fim. Esperamos que o conhecer o gênero e a estrutura literária de cada livro ofereça ao leitor uma leitura e estudo bíblico mais profundo e proveitoso.

Gênero

Gênesis é parte de uma narrativa contínua (Gênesis–Reis) que relata, seletivamente, os eventos desde a criação do mundo à queda da cidade de Jerusalém, em 587/86 a.C. Não obstante, não se trata de uma história comum, porque inclui em seu escopo as ações de Deus. Por conseguinte, essa narrativa histórica é distinta das histórias modernas, as quais focam somente as atividades do povo. Embora o livro de Gênesis seja singular, apresenta pontos interessantes de similaridade com outros escritos do antigo Oriente Próximo. Os primeiros onze capítulos de Gênesis partilham muitos paralelos, bem como semelhanças com mitos do antigo Oriente Próximo que precederam o tempo de Moisés (relatos mesopotâmicos da Criação, tais como o Enuma Elish; relatos do Dilúvio, tais como os inclusos no Epopeia de Atrahasis, a décima primeira tábua do Épico de Gilgamesh). Nomes e costumes nas narrativas sobre os patriarcas (caps. 12–50) refletem acuradamente aquela era, sugerindo um autor mais antigo com acesso a documentos confiáveis. Os textos de Ebla (vigésimo quarto século a.C.) mencionam Ebrium, possivelmente o Héber de Gênesis 10.21, e os textos de Mari (décimo oitavo século a.C.) atestam nomes como “Abraão”, “Jacó” e “amorreus”. A prática de conceder uma primogenitura (privilégios adicionais ao filho mais velho, 25.5-6, 32-34; 43.33; 49.3) estava amplamente em uso no antigo Oriente Próximo, e a venda de uma herança (25.29-34) é documentada em diferentes períodos dessa época. A adoção de um escravo (15.1-3) se encontra numa carta de Larsa da antiga Babilônia, e a adoção de Efraim e Manassés por seu avô (48.5) pode ser comparada à adoção similar de um neto em Ugarite (décimo quarto século a.C.). A dádiva de uma escrava como parte de um dote e sua apresentação a seu esposo por uma esposa estéril (16.1-6; 30.1-3 e notas) são práticas atestadas nas leis de Hamurabi (por volta de 1750 a.C.). Esses fatos e outros similares endossam a natureza histórica da narrativa. Não se descobriu prova direta da confiabilidade histórica da narrativa de Gênesis, mas isso não surpreende, em face da época e da natureza dos eventos ali descritos. Infelizmente, a falta de tal evidência às vezes é citada como razão para questionar sua historicidade. Entretanto, essa argumentação é falha, e não leva em conta a antiguidade dos materiais considerados. Boa parte de Gênesis lança foco sobre as experiências de uma família seminômade que viveu por volta de 2000 a.C. Em última análise, o leitor é convidado a aceitar as reivindicações de Gênesis e avaliá-las à luz do restante da Escritura.

Estrutura literária de Gênesis

A estrutura literária de Gênesis é marcada por uma série de tópicos que formam o relato global. Depois do prólogo (1.1–2.3), Gênesis é dividido em dez partes que se caracterizam pela fórmula “Estas são as gerações de…”. Cada tópico é seguido por uma genealogia daqueles que descenderam da pessoa nomeada (ou objetos, em 2.4) ou pelas histórias que envolvem seus descendentes notáveis. Em certa extensão, os relatos um a três e os relatos quatro a seis formam paralelo entre si: (a) histórias universais acerca do desenvolvimento do gênero humano na criação e na recriação depois do Dilúvio (relatos um e quatro, respectivamente); (b) a genealogia das linhagens redentoras através de Sete e Sem (relatos dois e cinco); e (c) as histórias das tratativas da época pactual com Noé e Abraão (relatos três e seis). Os dois pares finais dos relatos se estendem à linhagem abraâmica, contrastando sua descendência rejeitada, Ismael e Esaú (relatos sete e nove), com as histórias acerca dos eleitos, Isaque e Jacó, respectivamente (relatos oito e dez).

Os tópicos em Gênesis chamam a atenção para uma singular linhagem de descendentes que começa com Adão e se conclui com a família de Jacó. Os membros dessa linhagem incluem indivíduos significativos, tais como Noé e Abraão. Começando com Adão, sua singular linhagem familiar se destina a desempenhar papel vital no cumprimento do plano redentor para o mundo, antecipando o posterior estabelecimento da dinastia davídica e, eventualmente, a vinda de Jesus Cristo. Gênesis revela o plano de Deus tanto para derrotar Satanás, por intermédio de um futuro membro dessa linhagem que descendeu de Eva (3.15), como para abençoar todas as nações da terra (12.3; 22.18). No final de Gênesis, duas linhagens régias em potencial são focalizadas. A primeira está associada a José e seu filho mais jovem, Efraim. A outra linhagem régia em potencial focaliza Judá e seu filho mais jovem, Perez. Gênesis 49.8-10 antecipa que a linhagem de José/Efraim eventualmente será rejeitada por Deus e substituída pela de Judá, mas esse estado de coisas não ocorrerá até o tempo de Davi (Sl 78.66-72).

Gênesis é um livro mais difícil de ler do que a maioria supõe. A tendência moderna é ler uma breve seção de Gênesis, dispensando-se pouca consideração ao conteúdo global do livro. Esse tipo de abordagem falha em reconhecer que a narrativa hebraica escrita costuma comunicar ideias importantes através de temas recorrentes, jogos de palavras e mudanças sutis entre cenas similares. Às vezes, perde-se a profundidade de Gênesis quando, então, muitos leitores falham em apreender verdades importantes contidas nesse texto.

Este artigo foi retirado e adaptado com permissão do material de estudo da Bíblia de Estudo da Fé Reformada, Editora Fiel e Ligonier.

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Autor: Editorial online do Ministério Fiel

Ministério: Editora Fiel

Editora Fiel
A Editora Fiel tem como missão publicar livros comprometidos com a sã doutrina bíblica, visando a edificação da igreja de fala portuguesa ao redor do mundo. Atualmente, o catálogo da Fiel possui títulos de autores clássicos da literatura reformada, como João Calvino, Charles Spurgeon, Martyn Lloyd-Jones, bem como escritores contemporâneos, como John MacArthur, R.C. Sproul e John Piper.

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