sexta-feira, 12 de setembro
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O gênero e a estrutura literária do livro de Juízes

Este artigo faz parte da série Gênero e Características literárias dos livros da Bíblia, que são artigos retirados e adaptados com permissão da Bíblia de Estudo da Fé Reformada, Editora Fiel.


O conhecimento do gênero literário de um livro bíblico visa conduzir o leitor ao melhor entendimento das Escrituras, já que a Palavra de Deus é inspirada e que o próprio Deus planejou a escrita de cada gênero para um determinado fim. Esperamos que conhecer o gênero e a estrutura literária de cada livro ofereça ao leitor uma leitura e estudo bíblico mais profundo e proveitoso.

O livro de Juízes, com sua estrutura literária marcada por ciclos de apostasia e livramento, retrata a fragilidade espiritual do povo de Israel e a necessidade constante da graça de Deus. Neste artigo, extraído da Bíblia de Estudo da Fé Reformada, conheça como o gênero e a composição do livro revelam sua mensagem teológica central. “Naqueles dias não havia rei em Israel; cada um fazia o que parecia certo aos seus próprios olhos.” (Jz 21.25) “Naqueles dias não havia rei em Israel; cada um fazia o que parecia certo aos seus próprios olhos.” (Jz 21.25)

Gênero

O formato literário dominante de Juízes é a narrativa histórica. No entanto, o autor bíblico empregou vários outros gêneros em sua composição. Por exemplo, ele incluiu poesia (5.1-31), enigma (14.14, 18), oração (13.8) e conquistas itinerantes (1.1-36).

O cerne do livro é uma série de histórias heroicas que demonstram a apostasia sempre crescente dos israelitas e o reiterado livramento que Deus efetuava em prol do povo tirando-o da opressão.

Características literárias

Juízes pode ser dividido em três seções distintas (ver Esboço, a seguir). Cada seção tem os próprios estilo e consistência internos, contendo a narrativa vívida do povo de Deus e dos líderes em ação. Ocasionalmente bem-humoradas, algumas vezes trágicas, porém nunca insípidas, as histórias individuais dentro de cada seção, embora sejam completas em si mesmas, convidam o leitor a comparar um juiz com outro.

A Introdução (1.1–3.6) contém duas seções balanceadas que mostram como Israel se moveu da conquista para a apostasia, fracassando nas guerras estrangeiras (1.1–2.5) e cedendo espaço aos ídolos estrangeiros (2.6–3.6). O corpo (3.7–16.31) contém as histórias dos juízes organizadas em um padrão concêntrico que tem Gideão no centro; essa estrutura sublinha a espiral descendente rumo à apostasia. Otniel (3.7-11), que se casa com a piedosa Acsa, contrasta com Sansão (13.1–16.31), que está sempre à caça de mulheres estrangeiras; a tomada dos vaus do Jordão, nos dias de Eúde (3.28), que resulta na conquista dos cananeus, contrasta com a tomada dos vaus do Jordão nos dias de Jefté (12.5), que resulta na conquista dos israelitas; o ato de uma mulher cravar uma estaca de tenda na cabeça de um líder cananeu nos dias de Débora (4.21) contrasta com o ato de uma mulher lançar uma pedra de moinho na cabeça de um líder israelita, nos dias de Abimeleque (9.53). A conclusão (17.1–21.25) contém duas seções que mostram os resultados da apostasia em termos do culto (ou seja, adoração) e em termos da moralidade. Esses fracassos refletem a introdução com foco no fracasso através dos ídolos domésticos (17.1–18.31; cf. 2.6–3.6) e o fracasso nas guerras domésticas (19.1–21.25; cf. 1.1–2.5).

Cada episódio e cada seção em 1.1–2.5 empregam repetição verbal, comparação histórica e citações do livro de Josué para enfatizar as conexões entre pessoas, lugares e eventos. O leitor é convidado a procurar o padrão e a estrutura moral da história. Em comparação ao quadro largamente positivo apresentado em Josué, o perfil de Israel em Juízes é amplamente negativo. 

Juízes 2.11-19 delineia um padrão que percorre toda a história de Israel durante a maior parte do período dos juízes (3.7–16.31). Isso fornece a macroestrutura para cada uma das histórias de magistratura que ocorrem no livro.

A parte inicial do ciclo é a apostasia do povo de Deus (vv. 11-13). Reiteradamente, os israelitas cometem idolatria (p. ex., 3.7, 12; 4.1; 6.1; 8.33; 10.6; 13.1). O segundo elemento do padrão é a resposta de Deus à deserção de seu povo: ele fica irado e o entrega nas mãos de seus inimigos (vv. 14, 15). Na maior parte das histórias, Deus castiga e disciplina seu povo dessa maneira (p. ex., 3.8, 12-14; 4.2; 6.1, 2; 10.7). Por causa da opressão, o povo clama ao Senhor por livramento (p. ex., 3.9, 15; 4.3; 6.7; 10.10). Então, Deus levanta um juiz por certo tempo para livrar o povo de seus opressores (v. 16). A maior parte do material no livro focaliza esse aspecto do ciclo (p. ex., 3.9-11, 15-29; 4.4-24; 6.8–8.27; 13.2–16.30). Normalmente, o ciclo termina com a afirmação “Então, a terra ficou em paz durante quarenta anos” (p. ex., 3.11, 30; 5.31; 8.28).

Mudanças sutis são evidentes no ciclo e destacam a espiral descendente nas histórias. O padrão do clamor, o Senhor levantando um juiz e a terra em repouso começando a sucumbir com Débora, quando o texto diz que Débora “mandou (…) chamar a Baraque” (4.6), em vez de declarar que o Senhor levantou um juiz. Depois de o povo clamar nos dias de Gideão, o texto registra: “o Senhor lhes enviou um profeta” (6.8). Mais colapso é evidente nos dias de Jefté, quando, em vez de clamar ao Senhor, “foram os anciãos de Gileade buscar Jefté da terra de Tobe” (11.5). O colapso no padrão culmina nos dias de Sansão, quando não há clamor nem descanso.

Juízes 2.11-19 sublinha a repetição do ciclo. Muito embora os juízes individuais se sucedam por um período curto, a nação volta rapidamente aos seus caminhos de idolatria (v. 17), tornando-se mais corrupta em cada ciclo subsequente do padrão (vv. 18, 19). Já no final do livro, o leitor se vê confrontado com uma trágica história em que a tribo de Benjamim age de modo semelhante aos sodomitas em Gênesis 19.1-13 (Jz 19.14–20.48). O ciclo do período dos juízes forma uma espiral descendente rumo à hecatombe religiosa e moral.

O ciclo completo aparece em Juízes sete vezes (3.7-11, 12-30; 4.1–5.31; 6.1–8.28; 8.33–10.5; 10.6–12.7; 13.1–16.31). Na cultura hebraica, o número sete às vezes simbolizava inteireza e cumprimento (p. ex., Gn 1.1–2.3). Portanto, já no final de Juízes, o leitor testemunha em Israel uma anarquia quase completa: “cada um fazia o que parecia certo aos seus próprios olhos”. Além disso, o leitor se vê perplexo com quão altamente estruturado e bem-composto é esse livro.

Edição por Renata Gandolfo.

Este artigo foi retirado e adaptado com permissão do material de estudo da Bíblia de Estudo da Fé Reformada, Editora Fiel e Ligonier.

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Autor: Editorial online do Ministério Fiel

Ministério: Editora Fiel

Editora Fiel
A Editora Fiel tem como missão publicar livros comprometidos com a sã doutrina bíblica, visando a edificação da igreja de fala portuguesa ao redor do mundo. Atualmente, o catálogo da Fiel possui títulos de autores clássicos da literatura reformada, como João Calvino, Charles Spurgeon, Martyn Lloyd-Jones, bem como escritores contemporâneos, como John MacArthur, R.C. Sproul e John Piper.

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