Nós pastores sentimos profundamente a frustração de tentar transmitir nossa mensagem ao nosso povo. Quase diariamente, as nossas caixas de correio recebem panfletos que nos oferecem seminários sobre como podemos adaptar os nossos sermões e usar as mídias sociais de forma mais eficaz para “romper com a desordem” da nossa era da comunicação. Visto que fomos chamados para sermos arautos e mordomos de uma mensagem divina, não podemos ser culpados pelo fato de querermos nos certificar de que a mensagem está sendo ouvida.
Porém, nessa competição pela atenção do rebanho, estamos propensos a perder a importância do ouvir—não somente ouvir o Senhor (como alguns já abordaram neste assunto), mas também ouvir o nosso povo, bem como o conselho de colegas pastores e anciãos. Ainda mais quando é o próprio Senhor quem nos diz em sua Palavra: “Todo homem, pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar”. (Tiago 1:19). “Todos” inclui também os pregadores.
Assim como Paulo e o autor de Hebreus, devemos estar atentos ao nosso povo, a fim de avaliarmos a melhor forma de alimentá-los a partir do púlpito. Paulo diz em 1 Coríntios 3:2, “Leite vos dei a beber, não vos dei alimento sólido; porque ainda não podíeis suportá-lo. Nem ainda agora podeis, porque ainda sois carnais”. (leia também Hebreus 5:12). Quando eu comecei o meu ministério de pregação, um dos membros de noventa anos de idade da minha igreja me repreendeu, de maneira gentil, após ouvir uma pregação na qual eu fui além do que a congregação poderia assimilar. Ele disse: “Você quer um conselho de um homem idoso? Você precisa deixar o pote de biscoitos ao alcance das mãos das crianças”. Somente no final daquela tarde eu consegui deixar aquela dócil crítica penetrar as minhas defesas naturais, e, até hoje, sou grato por aquele feedback. Se quisermos alimentar nosso povo para um verdadeiro crescimento espiritual, temos o dever de saber em que parte do caminho eles estão. “Procura conhecer o estado das tuas ovelhas e cuida dos teus rebanhos” (Provérbios 27:23). E para isso é necessário ouvir.
Devemos também ouvir cuidadosamente nossos membros, de forma individual, para discernir onde realmente eles estão em Cristo. Paulo diz aos gálatas, “meus filhos, por quem, de novo, sofro as dores de parto, até ser Cristo formado em vós” (Gálatas 4:19). Facilmente os pastores supõem, de forma equivocada, que os irmãos que nos apoiam têm saúde espiritual e os que estão contra nós, não. No entanto, existem muitos que amam o pastor, mas estão longe de Cristo, e muitos que têm reclamações sobre o pastor, mas estão bem fundamentados. Devemos ouvir de forma mais profunda, e nos perguntar se ouvimos a Cristo que está sendo formado em nosso povo—em seus pedidos de oração, em suas palavras faladas de um leito de hospital, na maneira como expressam suas angústias sobre a situação do país, ouvimos a gramática da união com Cristo em sua morte e ressurreição? Ouvimos a doutrina da santificação sendo pessoalmente abraçada? Ouvimos um regozijo presente com o reino de Deus, aliado a um anseio por sua consumação futura? Ou, ao invés disso, ouvimos esperanças e suspiros que pulsam em uma batida de deísmo terapêutico moralista? Eles podem liderar ministérios em nossas igrejas com entusiasmo e competência, mas eles ainda têm muito medo de morrer? Essas são as coisas que devemos ouvir não apenas em suas palavras, mas também nos seus tons de voz.
Por último, devemos ouvir os presbíteros e outros pastores, tanto para nosso bem-estar pessoal quanto para o bem de nossos ministérios. Ser ordenado não nos coloca em posição superior à advertência de Provérbios 21:2: “Todo caminho do homem é reto aos seus próprios olhos, mas o SENHOR sonda os corações”. Todos nós conhecemos homens que perderam seus ministérios, não por causa de uma grande falha moral ou uma incompetência evidente, mas por conta da teimosia ou do desânimo que passou desapercebido com consequências debilitantes. Em tais casos, não é incomum saber que esses homens ficaram isolados e que lhes faltaram relacionamentos do tipo ferro-com-ferro-se-afia com presbíteros e outros pastores que poderiam ter dito uma palavra de repreensão, que salvaria seus ministérios, ou uma palavra de encorajamento que nutriria suas almas (Provérbios 27:17; 27:6; 12:25).
Anos atrás, J. Oswald Sanders observou em seu clássico “Spiritual Leadership” [Liderança Espiritual]: “Você pode avaliar os líderes pelo número e qualidade de seus amigos”. Agostinho era um homem que valorizava a amizade (há uma abundância de reflexões sobre a amizade em As Confissões e em seus sermões). A amizade de João Calvino e Pierre Viret (1511– 1571), conforme revelado em muitas de suas cartas, mostra o desejo de Calvino e sua grande confiança na amizade. Na recente busca por um novo diretor de música para a nossa igreja, minha primeira pergunta aos candidatos era: “Fale-me sobre os seus amigos mais íntimos. Você pode compartilhar algumas vezes em que o conselho deles o levou a uma mudança de caminho?”.
Os pastores precisam de amizades com cooperadores. Todo Timóteo precisa de um Paulo, e todo Paulo precisa de um Tito (2 Coríntios 2:13; 8:23). Se você se encontra sem amizades desse tipo, faria bem em começar a colocar este assunto em oração. Algumas vezes, o coração precisa de tempo para ser preparado para a amizade, para que nossos ouvidos se abram para aquilo que um amigo piedoso venha a dizer.
Sim, devemos ouvir e atentar para o Senhor primeiramente e acima de todos. Porém, de acordo com a sua Palavra, devemos também ouvir aqueles que estão abaixo de nós ou ao nosso lado. A qualidade de nossas vidas e ministérios depende disso.