O trecho abaixo foi retirado com permissão do livro O outro evangelho, de Alisa Childers, Editora Fiel
O que, neste mundo, faria com que uma cristã forte e dedicada duvidasse da sua fé?
O que, neste mundo, faria com que uma cristã forte e dedicada duvidasse da sua fé? Por que, repentinamente, teria dúvidas um membro do conhecido grupo de música cristã ZOEgirl, que fez um tour pelo mundo, convidando pessoas a se entregarem a Cristo e inspirando muitos jovens a proclamar sua fé e a “anunciar do alto da montanha”? Falarei sobre isso em instantes; mas, primeiro, deixo um pequeno pano de fundo.
Eu era aquela criança; você sabe como é: aquela criança que convidou Jesus para entrar no coração quando tinha cinco anos. Aquela que começou a estudar a Bíblia assim que aprendeu a ler. Aquela que, anos depois, levantava cedo para rodear a sua escola e orar por avivamento entre os seus colegas. Aquela que dirigiu o louvor na capela do Ensino Médio, e se mudou para Nova Iorque com vinte e um anos para fazer trabalho urbano com crianças carentes. Aquela que ia em todas as viagens missionárias possíveis, para evangelizar nas ruas de Los Angeles e de Nova Iorque durante o verão.
Eu era aquela com quem você nunca se preocuparia; aquela que você sabia que simplesmente estaria bem. Aquela que jamais duvidaria da fé.
Quando eu tinha cerca de dez anos de idade, a minha mãe era voluntária na Missão Fred Jordan, em Los Angeles. Ela nos levava para servir na fila da sopa nos fins de semana; e foi ali que a vi abraçar prostitutas e pôr cobertores no ombro de pessoas de rua malcheirosas. Foi lá que vi meu pai, um cantor e artista cristão, dirigir o louvor para multidões de almas famintas ou indiferentes, enquanto cantavam “Preciosa Graça” com todo o pulmão.
Alimentar os famintos, vestir os despidos, amar os desprezados, isso foi para mim o modelo de cristianismo genuíno. É isso que os cristãos faziam. Eles oravam, liam a Bíblia e serviam. Não era perfeito, mas era o que importava.
Por isso, não posso dizer que cresci com uma fé cega. A minha fé foi instruída através do testemunho do evangelho em ação. Mas era uma fé intelectualmente fraca e não testada. Eu não tinha um padrão de referência ou um lugar aonde lançar mão quando as minhas convicções fossem questionadas. E não foi um ateu, nem alguém mundano, humanista, hindu ou budista que serviu de causa para minha eventual crise de fé – foi um cristão. Mais especificamente, foi um pastor progressista.
Esse pastor pediu para que eu participasse de um pequeno e exclusivo grupo de discussão com convidados selecionados. Ele me disse que era um curso de formação ministerial, que resultaria em uma educação teológica comparável a quatro anos de seminário. Referir-se ao curso como “educação” teológica foi um eufemismo. Foi mais como uma reviravolta. A classe durou quatro anos. Eu, durei quatro meses.
Todos nós já ouvimos histórias de jovens cristãos que se afastaram da fé depois de serem desafiados por professores céticos em uma sala de aula de faculdade. A minha fé foi confrontada dessa maneira, mas não em uma universidade. Foi desafiada nos bancos de uma igreja. Foi abalada por um pastor que tinha conquistado minha confiança, respeito e lealdade. Não se tratava de um sujeito esquisito qualquer que eu tivesse conhecido durante um evangelismo de rua na Avenida Hollywood, que proferiu impropérios contra Deus ao receber um folheto evangélico. Ele era um líder estudioso da igreja, intelectual, calmo e eloquente; alguém que expressava amor por Jesus. Ele era um comunicador brilhante, e tinha discordâncias sobre o cristianismo.
Encontro após encontro, todas as crenças preciosas que eu tinha sobre Deus, Jesus e a Bíblia foram colocadas em uma mesa de corte intelectual e cortadas em pedaços. Referindo a si mesmo como um “agnóstico esperançoso”, esse pastor começou a examinar os princípios da fé. Nascimento virginal? Isso não importa. A Ressurreição? Provavelmente aconteceu, mas não é preciso acreditar nela. Expiação? Aqui cabe um “não”. E a Bíblia? Deus o livre de acreditar que a Escritura é inerrante. Ele assinalou que mesmo os eruditos já superaram essa noção primitiva. Durante nossas discussões, muitos da turma rejeitavam os que eles chamavam de “funds” (fundamentalistas), dizendo serem estes estúpidos e perigosos, que simplesmente seguiam o que lhes fora dito para acreditarem.
Certamente, eu já tinha visto algumas dessas alegações na capa da revista Newsweek ou em um documentário no Discovery Channel que tentava ridicularizar Jesus. Mas isso não era surpresa, pois espera-se que os não cristãos não acreditem. Naquela situação, era só fechar a revista ou desligar a televisão e continuar o meu dia. No entanto, nesse pequeno grupo de discussão não havia escape. Parecia que eu era a única na sala que se sentia perturbada ao responder o que me era perguntado. Mas eu não tinha respostas. Nunca tinha sequer pensado em algumas daquelas perguntas.
Mais tarde, vim a saber que esse desmantelamento dos princípios doutrinários – onde todas as crenças com as quais alguém foi criado, sem nunca questionar, são sistematicamente desmanchadas – é os cristãos progressistas chamam de desconstrução.
Depois de quatro meses eu me separei deles. O pastor e a igreja passaram a ser uma “comunidade cristã progressista”. Ao mesmo tempo, os cristãos de todo o país estavam tendo o mesmo tipo de conversa nas redes sociais, nas cafeterias e nas salas de aula das igrejas. Eles estavam questionando os seus pressupostos, há muito defendidos, sobre a natureza de Deus e da Bíblia, a exclusividade do cristianismo e as normas bíblicas relativas a gênero e orientação sexual. Essas pessoas desiludidas encontraram-se umas com as outras. Fizeram blogues, escreveram livros. As igrejas começaram a identificar-se como progressistas e removeram ou editaram as declarações de fé em suas páginas da web.
Hoje em dia, muitos dos autores, blogueiros e palestrantes cristãos mais populares são progressistas. Denominações inteiras estão cheias de pessoas que se identificam como tal. No entanto, muitos cristãos sentam-se nos bancos todos os domingos sem saberem que sua igreja adotou uma teologia progressista.
Os cristãos progressistas tendem a evitar absolutos e estão tipicamente em desacordo com os credos ou declarações de fé. De fato, o blogueiro progressista John Pavlovitz escreveu que no cristianismo progressista não há “vacas sagradas”. Por isso, pode ser mais prático procurar por certos sinais, tendências e atitudes, para com Deus e a Bíblia, ao tentar detectá-lo. Por exemplo, os cristãos progressistas veem a Bíblia como um livro essencialmente humano, e enfatizam a consciência e práticas pessoais em vez da convicção e da fé. São, também, muito abertos à redefinição, reinterpretação ou mesmo à rejeição das doutrinas essenciais da fé, como o nascimento virginal de Cristo, sua divindade e ressurreição corporal.
Quando o cristianismo progressista entrou em cena pela primeira vez, seus proponentes suscitaram críticas válidas sobre a cultura evangélica, quanto a necessidade da igreja examinar e reavaliar o assunto. Mas esses progressistas que rejeitam os ensinamentos essenciais, como a ressurreição física de Jesus, podem confundir cristãos desavisados e retirar os alicerces debaixo de seus pés.
Depois de sair daquela igreja progressista, caí em um vazio espiritual, um surto na escuridão que eu nunca antes havia conhecido. Eu sabia no que eu cria; mas agora fui obrigada a considerar a razão porque eu cria. Nadei como cachorrinho para manter minha cabeça acima da água, naquele oceano agitado pela tempestade, e implorei a Deus que me salvasse: “Deus, eu sei que estás aqui; por favor, envie-me um barco salva-vidas.”
Ao longo dos anos seguintes, Deus enviou, de fato, um barco salva-vidas. E depois outro, e mais outro. O primeiro socorro veio enquanto estava dirigindo pela rodovia e girava o botão do rádio. Parei de girar o botão quando sintonizei uma voz calma e paternal, abordando uma das argumentações que tinham sido lançadas sobre mim pelo pastor progressista. O que eu ouvi tirou o meu fôlego, e depois me fez respirar fundo outra vez. Aquele homem no rádio (cuja entrevista descobri depois ter sido gravada em uma universidade) respondendo a perguntas de céticos, sistematicamente derrubou objeção após objeção, sem apreensão e sem ira. Ele foi gentil e resoluto. Ele era muito mais convincente e fundamentado em fatos do que o pastor progressista. Eu estava à procura da verdade e, nesse dia na rádio, eu a encontrei.
Em pouco tempo, estava lendo todos os livros de apologética e teologia que chegavam em minhas mãos, e até comecei a frequentar as aulas de um seminário. A onda progressista que me atirou contra aquele que é a Rocha Eterna havia quebrado em pedaços as minhas convicções profundas e essenciais sobre Jesus, Deus e a Bíblia. Mas essa mesma Rocha dos Séculos começou, aos poucos, mas seguramente, a reordenar os pedaços, descartando alguns e recolocando outros em seus devidos lugares.
Mais forte do que antes
Esse é, portanto, o meu relato da reconstrução da minha fé. Hoje em dia, a minha vida cristã não se parece exatamente com o que era antes. Eu ajustei as minhas crenças em certos pontos teológicos e me tornei muito mais cuidadosa na forma como interpreto a Bíblia. Eu descartei algumas ideias não muito bíblicas, que faziam parte da minha identidade cristã, mas que nunca antes pensei em questioná-las.
Porém, ao longo desta jornada, descobri que as declarações históricas centrais do cristianismo são verdadeiras. Aprendi que a Bíblia, embora atacada e duramente criticada, século após século, eleva-se acima do topo dos escombros de acusações que têm sido amontoadas contra ela. Compreendi que a visão cristã sobre o mundo é a única que pode explicar suficientemente a realidade. Redescobri Jesus, o pregador surpreendente de Nazaré, que dividiu a história em duas e que cumpre a sua promessa de nunca me abandonar. Conforme você me acompanha nesta jornada, oro para que sua fé também seja fortalecida.
Estou mais ciente que nunca de que o cristianismo não é baseado em uma revelação mística ou em uma filosofia auto inspirada. Ele está profundamente enraizado na história. Na verdade, até onde posso pensar, é o único sistema religioso que depende de um acontecimento histórico (a ressurreição de Jesus) a qual é um fato real, e não fake news.
Quando tenho dúvidas sobre a minha fé, ou questões difíceis e incômodas que me mantém acordada durante a noite, não tenho o capricho de descobrir “a minha verdade”, porque estou comprometida com a verdade. Eu quero saber o que é real. Quero que a minha visão de mundo (a lente através da qual vejo o mundo) esteja alinhada com a realidade. Ou Deus existe, ou não existe. Ou a Bíblia é a sua Palavra, ou não é. Ou Jesus foi ressuscitado dentre os mortos, ou não foi. Ou o cristianismo é verdadeiro, ou não é. Não há “a minha verdade”, quando a verdade vem de Deus.
Infelizmente, para muitas pessoas hoje em dia, determinar o que é verdade em todas as áreas da vida tornou-se nada mais do que um jogo de “ele disse, ela disse”. Por exemplo, acabei de pesquisar no Google sobre os “benefícios da carne de porco para a saúde” (por causa do bacon), e descobri todo tipo de “fatos” interessantes. Descobri que a carne de porco é rica em proteínas, pobre em carboidratos, sem glúten e contém um bom equilíbrio de todos os aminoácidos essenciais. Li também um artigo que afirma que a carne de porco lhe confere uma pele mais saudável, promove a desintoxicação de metais pesados e previne a “doença de adulto” (seja lá o que for isso).
Obviamente, o que eu recolhi em uma pesquisa de cinco minutos no Google é uma combinação de fatos e fantasia. Como devo trilhar entre as informações para saber em que fontes confiar e em quais “fatos” posso acreditar? Será que posso simplesmente juntar um monte de bacon em uma tigela e chamar isso de salada sem glúten? Por mais que eu queira escolher no que acreditar e permitir que outros façam o mesmo, não é a realidade.
Se “a minha verdade” diz que a carne de porco é a nova couve, as consequências dessa ideia produzirão seus efeitos na vida real – não importa o quanto eu esteja positivo a esse respeito. Os meus sentimentos sobre o bacon não vão mudar o que ele causará ao meu coração, à minha pressão sanguínea e à minha cintura. É por isso que “a minha verdade” é um mito. Não existe tal coisa. O bacon é bom para mim ou não é (ou queira Deus que ele esteja em um meio termo!). O que eu acredito sobre alguma coisa pode ter consequências de vida ou morte.
Da mesma forma, ao passar pela minha crise de fé, reconheci que não bastava simplesmente conhecer os fatos – é preciso ponderá-los, saber avaliar as informações e chegar a conclusões razoáveis ao nos envolvermos de forma lógica e intelectual com as ideias religiosas. Não podemos permitir que a verdade seja sacrificada no altar dos nossos sentimentos. Não devemos admitir que o medo de ofender os outros nos impeça de avisá-los que estão prestes a entrar na frente de um ônibus. A verdade é importante para os apaixonados por bacon, e a verdade é importante para os cristãos.
Talvez você seja um cristão que se sente só nas suas crenças. Talvez você seja um crente que se enveredou para o cristianismo progressista sem perceber, ou talvez esteja preocupado com um amigo ou parente que está nesse caminho. Talvez se sinta frustrado, quando as suas redes sociais são inundadas com artigos, blogues e vídeos que acendem sinais de alerta, mas as coisas não estão bem nítidas para você. Talvez haja uma pedra no seu sapato por ter testemunhado uma atitude de hipocrisia em sua igreja, ou por ser vítima de algum abuso espiritual. Talvez você esteja sendo tentado a deixar-se levar pela onda e desistir totalmente da sua fé.
Seja você quem for, a minha oração, caro leitor, é que este livro lhe sirva como um bote salva-vidas.
Por: Alisa Childers. ©️ Ministério Fiel. Website: ministeriofiel.como.br. Todos os direitos reservados. Editor e revisor: Renata Gandolfo.