Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus; sou exaltado entre as nações, sou exaltado na terra. (Sl 46.10)
Certa vez, fui buscar meus dois filhos — ambos com menos de cinco anos — na escola. Na época, morávamos a 60 km do meu trabalho e da escola. Era um trajeto longo e cansativo. Logo na primeira curva, destruí o pneu do carro em um buraco enorme. O buraco sempre estivera lá, mas, naquele dia, me pegou totalmente distraída.
E qual foi a distração? Eu estava tentando encontrar o CD1[i] do “sapo que não lava o pé”, que dois minipassageiros entusiasmados pediam em coro no banco de trás.
O pneu furou — e furou mesmo. Então, lá estava eu, com duas crianças pequenas, a 60 km de casa. Meu marido estava… em casa. Bem longe de mim.
Não sei trocar pneu. Naquele momento, eu só queria que meu marido estivesse ali. Um pânico sutil, porém, real, começou a tomar conta de mim: “O que vou fazer agora?”. O cenário mental era sempre o pior: “Vai anoitecer logo. Estou sozinha com duas crianças. E se aparecer alguém? E se…?” — esses pensamentos que conhecemos muito bem.
Consegui encostar o carro em um posto de apoio que havia ali perto. Enquanto tentava resolver o que fazer — se ligava para meu marido, se procurava o número do seguro ou se encontrava alguém conhecido nas redondezas —, virei o rosto para o banco de trás.
Ali estavam eles: animados, cantando a música do sapo, como se nada tivesse acontecido. Nem aí. Felizes, tranquilos. A única observação foi: “Olha, a mamãe parou o carro!”. E continuaram a cantar.
Naquele momento, meus olhos se encheram d’água. Ah, como eu queria ser filha de novo! Só isso. Ser “só filha”. Queria estar naquele carro como filha, como passageira. Queria ter o pneu furado e continuar em paz, porque alguém mais velho e responsável estaria ali, cuidando de tudo. “A mamãe estava ali.” E, se fosse preciso, o papai também chegaria. Estava tudo certo. Vida que segue.
Depois de algumas tentativas, consegui falar com a escola das crianças. Um pai, comovido com a situação, passou lá e trocou o pneu para mim em menos de dez minutos. Ele estava com o filho, e os meninos ficaram todos no banco de trás, dividindo um pacote de biscoito de chocolate. Cantaram, riram, comeram. Foi um “piquenique no carro”, ao som do sapo e do pirulito que bate-bate.
Voltei para casa aliviada. E, quando entramos, as crianças correram até o pai: “Pai! Hoje foi muito legal! A mamãe parou o carro e a gente fez piquenique com um menino da escola!”.
Meus olhos se encheram de lágrimas mais uma vez. Como é diferente a perspectiva de uma criança. Enquanto eu estava tensa, nervosa e preocupada com tudo, eles se sentiam seguros. A mamãe estava ali. Só isso bastava. E, pela graça de Deus, tudo terminou bem.
Essa história me marcou bastante porque, poucos dias depois, entrei em outra fase de “pneu furado”. Quatro dias após aquele episódio, meu marido perdeu o emprego — em uma época em que as perspectivas no Brasil não eram animadoras. Como mãe, esposa e mulher, eu me preocupei bastante. E, muitas vezes, só queria ser filha de novo.
Minha mãe me contou que, quando eu era pequena, meu pai passou quase cinco anos desempregado. E eu? Eu nem me lembro disso. Devia estar comendo bolacha de chocolate e cantando “Pintinho Amarelinho”. Papai e mamãe estavam ali. E tudo acabou bem.
Então, naquela nova fase, cheia de incertezas e orações, fui lembrada de algo que aqueceu meu coração: eu sou filha. Sim, eu sou filha. Filha de um Pai que tem absolutamente tudo sob controle. Filha daquele a quem até o vento e o mar obedecem. Filha de Deus, meu Pai, que, naquela tarde comum com o pneu furado, me lembrou que meu papel é descansar; o dele é guiar, prover e cuidar: “Aquietai-vos e sabei que eu sou Deus” (Sl 46.10). Ou seja, filha, descanse, “seu Pai está aqui”.
Não é nosso papel carregar o peso do controle. Ele está cuidando de tudo. Não é o medo que deve dominar nossos corações, mas a lembrança de quem somos, e de quem Deus é. Nós somos filhas. Ele é Pai. E não falha.
Naquele dia, meus filhos me lembraram de uma verdade que, às vezes, a alma adulta esquece: nós somos filhos; estamos no banco de trás. E podemos descansar nisso.
Como é bom saber que temos um Pai que cuida de tudo!
Pense nessas coisas:
O que desafia você hoje e que exige que se lembre que você pode descansar como filha nas mãos do Pai?

Este artigo é um trecho adaptado e retirado com permissão do livro Pensem nessas coisas: meditações inspiradas em Filipenses 4.8, Naná Castillo, Editora Fiel.
[i] Nota para os mais jovens: CD, também conhecido como Compact Disc, era um disquinho prateado que a gente colocava no carro ou no aparelho de som para ouvir música. É como se fosse o avô do Spotify. A diferença é que riscava, pulava faixas, cabiam apenas cerca de dez a doze músicas por disquinho e precisava ser manuseado com carinho e soprado de vez em quando.