quarta-feira, 14 de maio
Home / Artigos / Quando os filhos crescem e vão embora

Quando os filhos crescem e vão embora

A vida é uma série de perdas

Scrapbooking[1] se tornou uma febre nos últimos tempos, não é? Como sempre falo para grupos de mulheres e sempre estou em retiros femininos, conheço todos os tipos de artesanato que as mulheres adoram. E, pelo menos nos últimos anos, scrapbooking tem sido o tipo mais popular de artesanato.

Como é seu scrapbook? Eu não tenho um. Quero dizer, eu tenho caixas de fotos que, há cerca de dois anos, foram organizadas e categorizadas. “Onde está aquela caixa com as fotos do pôr do sol? E a coleção de fotos de aniversário?”, perguntávamos meu filho Joel e eu enquanto examinávamos envelopes com fotos de anos atrás.

Para nosso aniversário de casamento de 25 anos, nossos filhos fizeram um lindo scrapbook para mim e Phil. Que presente precioso! Cada um deles foi responsável por determinadas seções e pela decoração das páginas. As fotos são maravilhosas, porém o que mais nos cativou foi a personalidade e o bom humor que cada página transmite.

Tenho apreço por nosso livro de aniversário de casamento porque ele me traz à memória momentos que estou colecionando há três décadas. De diversas maneiras, essas lembranças definiram a minha vida, enriqueceram a minha alma e registraram a narrativa da minha existência ao longo de dias que se fundiram para formar retratos harmoniosos, os quais foram pintados com lágrimas, sorrisos e alegria.

Do que me lembro? Quais fotos foram indelevelmente gravadas em meu coração? Quando fecho os olhos e me lembro dos dias que agora estão perdendo o brilho e a cor, ainda posso ver fotos variadas e vívidas de uma vida como Mãe.

Vejo que os dias difíceis eram cheios de pequenos sorrisos, esforços para conseguir caminhar e falar. Vejo o jogo de beisebol e as lanchonetes. Lembro-me de quando obriguei Jessica, nossa filha, a fazer um teste para a equipe de softbol (algo que tínhamos de fazer todo ano) porque ela sentia muito medo de não ser aprovada.

Lembro-me do agradável cheiro do xampu de bebê que vinha do cabelo lavado. Posso reviver as gargalhadas e os gritos de alegria enquanto fazíamos barulhos engraçados assoprando na barriga das crianças. “Para, para!”, gritavam eles. “Ah, você quer que eu pare? Tudo bem”, dizíamos. E, assim que eles tentavam se levantar, nós os puxávamos e eles começavam a dar gargalhadas novamente. Lembro-me das “brigas de geleca”, que manchavam nossas paredes em nossa guerra pelo domínio familiar, e lembro-me do pique-bandeira no desfiladeiro perto da nossa casa.

Nós nos divertíamos muito em casa, mas nem tudo era diversão. Lembro-me de quanto eles choravam e de quanto eu ficava ofendida quando eles não recebiam o cobiçado convite para “aquela festa”. Lembro-me das derrotas naquelas temporadas que pareciam intermináveis e das listas de palavras que eles esqueciam no momento da prova. Ainda posso ouvir as portas batendo e como eu tinha de me controlar quando abria a porta e mandava meu filho fechá-la novamente, mas com educação. Lembro-me de dizer: “Peça perdão ao seu irmão e dê um abraço nele. Diga a ele que você o ama”. Também me lembro de quando ouvi: “Você sempre implica comigo!”, “Você nunca vê o que ele/ela faz de errado!”, “Esse lugar parece um presídio! Por que vocês não podem ser como os pais das outras crianças?” ou “Mãe, por que você tem que estragar todos os filmes? Sabia que nem todo filme tem um ‘significado mais profundo’? Às vezes é só entretenimento!”. Às vezes, eu esperava Phil voltar do trabalho para dizer aquelas temíveis palavras: “Você precisa disciplinar aquele garoto de novo”.

Lembro-me de ler As Crônicas de Nárnia e de ir ao cinema na sessão da meia-noite para assistir ao Império Contra-ataca. Lembro-me de discussões sobre as razões para considerar o filme Procura-se Susan Desesperadamente e delineadores pretos como inapropriados; por que brincos (nos meninos) e tatuagens e piercings (em qualquer um) não eram a melhor decisão. Lembro-me de cabelos longos que precisavam ser lavados (para onde foi aquele xampu de bebê?), das bolhas de queimaduras de sol, dos dentes moles, das descidas no rio, da catapora, da hera venenosa e dos baldes ao lado da cama porque era temporada de gripe.

Lembro-me de quando tentei explicar por que é importante saber o que está escrito na Declaração dos Direitos dos Estados Unidos e de quando tentei esconder as lágrimas enquanto escutava Joel recitar o Discurso de Gettysburg.

Também tenho lembranças mais recentes. Lembro-me quando eles se formaram no ensino médio e na faculdade, da cerimônia de graduação de James no curso de formação do exército e também de quando dois de nossos três filhos se casaram.

Essas são as fotos no meu scrapbook. Elas são vivas. Elas são a minha alegria. Elas são o legado da minha vida e da vida do Phil nos últimos trinta anos e especialmente da misericordiosa graça de Deus. O que seu álbum diz? Quais preciosas lembranças enchem as páginas de sua mente? Qual é o valor delas para você?

Beco sem saída

Na reunião de orientação aos pais da faculdade de nosso filho, Joel, eu me sentei com uma velha amiga, Annie, e seu marido, Finn. A filha deles, Hannah, estava entrando para a mesma faculdade que o nosso filho e nós conversamos sobre nossas lembranças como pais.

“Eu não entendo”, disse Annie. “Por que eles têm que crescer e ir embora?”

Admito que realmente é difícil explicar. Parece que, quanto mais levamos a sério os mandamentos de Deus para criar nossos filhos na disciplina e na admoestação, mais nos envolvemos com suas vidas e, consequentemente, torna-se mais doloroso quando eles vão embora. Por que eles tiveram de crescer e ir embora? Por que a vida não poderia continuar sempre da mesma maneira? Nós estamos presos em uma situação difícil. Parece haver somente duas alternativas: ignorar os mandamentos de Deus de nos dedicar aos nossos filhos e criá-los para a glória dele, construindo nossa vida à parte deles, ou nos dedicar a eles, de coração e alma, e depois ficarmos sozinhos. Que decisão!

A vida é uma série de perdas

Há algum tempo, ouvi um professor de um seminário local fazer uma declaração impressionante. Ele disse: “A vida é uma série de perdas”.[2] Embora aquele culto tenha sumido da minha memória, essa afirmação ficou na minha cabeça até hoje. Perder significa despir-se e desapossar-se;[3] é um processo de separação e desapego.

Quando nosso primeiro neto, Wesley, começou a engatinhar, não demorou até ele sair pela porta corrediça de vidro para explorar o pátio dos fundos. “Olhe, Jessica”, disse eu. “Ele já está saindo de casa”. “Mãe!”, gritou ela. “Não diga isso!” “É importante que você veja isso, grave em seu coração e valorize esses momentos”, avisei. “Eles vão acabar mais rápido do que você imagina.”

Desde o momento em que nossos filhos nascem, já estão caminhando em direção à porta. E pare para pensar: é o que nós os encorajamos a fazer! Como seria terrível se tentássemos mantê-los usando fraldas, impedindo-os de explorar, crescer e mudar. Mas, sempre que os encorajamos a avançar, estamos apressando aquele dia em que teremos de nos despir de nosso uniforme de mãe e colocar outra roupa.

Parece que nossa vida com os filhos nunca vai mudar. E, às vezes, guerreamos contra essa mudança quando vemos que ela está em curso, tentando controlar e proteger nossos queridos filhotes além do período designado pelo Senhor. Quando ele passou a ter asas tão fortes… eu realmente preciso deixá-lo voar?

Você já sentiu falta deles? Você já se despiu? Lembre-se do que descobrimos no primeiro capítulo: “Tudo tem o seu tempo determinado”. Como tem sido esse momento da sua vida? Mudar de roupa pode ser difícil, especialmente quando aquela calça jeans velha cabia tão bem e quando não temos certeza do que vamos colocar em seu lugar.

Meu marido não foi o primeiro pai que teve de se despedir de um filho. Nós aprendemos sobre amor e sobre perda quando olhamos para nosso Pai celestial. Ele enviou seu único Filho unigênito de seu lar glorioso para nascer como infante em uma manjedoura imunda. Ele enviou seu Filho para aqueles que “não o receberam” (Jo 1.11), embora fossem criaturas dele. Ele é o Pai que se voltou contra seu Filho enquanto o Filho clamava, angustiado: “Pai, por que me desamparaste?”. E ele é o Pai que derramou toda a sua ira sobre seu Filho amado por amor aos seus eleitos. Ele sabe o que significa abrir mão. Enquanto você medita sobre os versículos seguintes, considere as características de Deus que você está aprendendo a imitar:

Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna (Jo 3.16).

Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas? (Rm 8.32).

Nisto se manifestou o amor de Deus em nós: em haver Deus enviado o seu Filho unigênito ao mundo, para vivermos por meio dele. Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado a Deus, mas em que ele nos amou e enviou o seu Filho como propiciação pelos nossos pecados (1Jo 4.9-10).

Além de Deus ter, voluntariamente, entregue seu Filho por amor a nós, o Filho também abriu mão de seu direito de exigir igualdade com o Pai:

Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e, reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte e morte de cruz (Fp 2.5-8).

Seu Pai celestial e seu maravilhoso Salvador sabem o que significa perder. Eles sabem o que significa amar e abrir mão de uma relação próxima por amor a outro. Eles fizeram esse sacrifício antes de você, e você pode contar com eles para receber a graça e a força necessárias quando seu coração doer. Você pode ter certeza de que eles estão moldando seu coração para que seja cada vez mais parecido com o deles.

Este artigo é um trecho adaptado e retirado com permissão do livro Sem medo da minha idade, de Elyze Fitzpatrick, Editora Fiel.


[1] Terminologia em inglês para designar um livro feito com a colagem de recortes de fotos, convites ou qualquer outro material que possa ser guardado. (N. da E.)

[2] Dr. Peter Jones, em um culto da capela no Westminster Theological Seminary, na Califórnia. Material não publicado.

[3] Reader’s Digest Oxford Complete Wordfinder (Pleasantville, NY: Reader’s Digest Association, Inc.), 1996.


Autor: Elyse Fitzpatrick

Elyse Fitzpatrick é conselheira bíblica no Institute for Biblical Counseling and Discipleship, na Califórnia, e possui mestrado em Aconselhamento Bíblico no Trinity Theological Seminary. Elyse é coautora do livro Pais Fracos, Deus Forte.

Ministério: Editora Fiel

Editora Fiel
A Editora Fiel tem como missão publicar livros comprometidos com a sã doutrina bíblica, visando a edificação da igreja de fala portuguesa ao redor do mundo. Atualmente, o catálogo da Fiel possui títulos de autores clássicos da literatura reformada, como João Calvino, Charles Spurgeon, Martyn Lloyd-Jones, bem como escritores contemporâneos, como John MacArthur, R.C. Sproul e John Piper.

Veja Também

O gênero e a estrutura literária de Números

O livro de Números pode ser visto como alinhando quatro seções principais, a primeira e a última ressaltando os preparativos para entrar na terra de Canaã.