O trecho abaixo foi extraído do livro Triunfo da Fé, da Editora Fiel.
Ainda que a existência do mal seja considerada um problema filosófico apenas para aqueles que afirmam a existência de um Deus bom e onipotente (teísmo cristão), o mal, seja ele físico ou moral, precisa ser explicado por qualquer cosmovisão. As respostas são as mais diversas em religiões não cristãs. As religiões de caráter monista (todas as realidades se confundem em Deus), falam do mal como uma ilusão, maya (Ex: Hinduísmo, Budismo). Essas religiões orientais propõem técnicas de meditação e espiritualidade para transcender a experiência de sofrimento. A Nova Era, a versão ocidentalizada das mesmas ideias, teve muita proeminência a partir da década de 1960 quando propôs a utilização de entorpecentes para transcender o mal. Seja a versão oriental ou a ocidental, ambas negam que o mal seja objetivo. Trata-se de uma experiência subjetiva da qual alguns não conseguem sair.
Mas negar o sofrimento não produz qualquer amor para com o próximo ou para com Deus. Veja primeiro a falta de amor para com o próximo. Essa postura não demonstra qualquer simpatia para o sofredor que enxerga os seus sofrimentos como eminentemente reais. Dizer a uma mãe que acabou de perder sua filha por causa de um assassinato que seu sofrimento pertence a um mundo de ilusões é terrível! Tal afirmação não só não é confortadora, pior, é zombar da realidade e veracidade da dor daquela mãe. Essa atitude é, na melhor das hipóteses, insensível ao sofrimento da pessoa (negando sua realidade) e, na pior, desprezo para com a pessoa que sofre por considerá-la fraca espiritualmente. Além disso, negar a realidade da dor seria negar a realidade do amor pela filha. Afinal, a dor da perda é proporcional ao amor que se tem pela filha. A realidade do amor, porém, ninguém quer negar. Em última análise, porém, a teoria da ilusão não resiste sob o peso da experiência humana. Na época do tsunami no Japão, em março de 2011, missionários cristãos testemunharam do desespero de inúmeros japoneses diante da tragédia, afinal, não lhes foi possível afirmar ser apenas uma ilusão.
Negar o mal também é uma proposta odiosa ao Deus da Bíblia, pois ele próprio assevera a realidade do mal quando a vitória sobre o mesmo custou a vida do seu Filho. Jesus não veio simplesmente ensinar as pessoas como transcender o mal por intermédio de meditação ou de algum conhecimento. Ele precisou sofrer de verdade, morrer de fato, e ressurgir para vencer o mal. O Servo Sofredor descrito tão vividamente por Isaías (52.13-53.12), o Cristo crucificado pregado por Paulo (1 Co 2.1-2), foi tão distinto de outras religiões que acabou sendo escândalo para os judeus e loucura para os demais povos (1 Co 1.22-23). Até o apóstolo Pedro precisou ser repreendido por Jesus porque não entendera que o mal era tão mais abrangente do que forças político-militares, que era necessário que o Salvador carregasse o mal e padecesse a fim de vencê-lo (Mt 16.21-23).
R. C. Sproul afirma: “Na vida e paixão de Cristo vemos com perfeita clareza que o sofrimento é a maneira que Deus escolheu para trazer redenção a um mundo perdido. Jesus era conhecido como um homem de dores, que sabe o que é padecer.” Esse sofrimento de Cristo é singular, inimitável. Esse foi o seu caminho de glória (Hb 2.9-10). Quem nega a realidade do mal rouba de Cristo a glória de redentor.
Outra proposta não cristã comum na história vem das religiões dualistas quando afirmam haver uma divindade boa e outra má, esta sendo a causa dos males neste mundo. Essa proposta aparece na mitologia egípcia quando sugere a existência do caos desde o princípio como parte integrante da realidade, ganha forma clássica nas religiões persas (Zoroastrismo e Maniqueísmo) com dois princípios independentes que só se resolvem no final (o bem vencendo no final), mas é mais conhecido a partir do pensamento grego (Platão, gnosticismo, neoplatonismo) com o seu conceito de matéria má.
Infelizmente existem pregadores que adotam uma versão desse dualismo em seus conceitos de batalha espiritual, especialmente em meios neopentecostais, como se Satanás fosse o responsável por todos os males deste mundo e Deus não tivesse nada a ver com os ocorridos. Essa posição parece oferecer uma resposta racional para o problema do mal, mas ela cria problemas para a ortodoxia cristã. Ela não é fiel ao retrato bíblico sobre a participação de Deus nos fatos ocorridos neste mundo. Tal cosmovisão dualista que atribui tudo de ruim para Satanás não contempla a doutrina da providência divina que atribui causa primária ao Senhor Deus até para as coisas ruins (cf. Is 45.1-7). Além disso, a perspectiva dualista concede tantos poderes para Satanás que praticamente o faz uma divindade das trevas que tem quase o mesmo tanto de poder que o Criador; como se ambos travassem uma batalha que no final Deus ganhasse, mas “no sufoco”. Na tentativa de justificar Deus, essa perspectiva dualista de batalha espiritual diminui Deus e não é fiel às Escrituras.