Existem meios para dormir melhor — e pregar um sermão melhor enquanto dorme. Eis algumas maneiras de melhorar os seus hábitos de sono.
Conhecimento
Se nossas escolas estudassem sobre o sono em vez de álgebra, a sociedade seria mais saudável, segura e alerta. Apesar do sono tomar de um quarto a um terço de nossa vida e ter tanta influência no restante dela, a maioria de nós sai da escola em total ignorância do porquê e do como dormir. Visto que o conhecimento não somente nos guia como também nos motiva, por que não buscar mais informações em algumas das notas de rodapé deste capítulo ou ler The Power of Rest (O poder do descanso) pelo médico do sono Matthew Edlund (deixe de lado a parte que cheira a Nova Era) ou And So to Bed…: A Biblical View of Sleep por Adrian Reynolds.[i]
Conheça melhor a você mesmo e descubra o quanto você realmente precisa dormir para viver bem. A maioria das pessoas precisa entre sete a nove horas de sono todo dia. Eu consigo passar bem com sete e melhor ainda com sete e meia, mas oito horas ou mais não parece fazer diferença apreciável. Se eu durmo menos que sete por alguns dias, as consequências começam a se multiplicar. Encontre seu ponto ideal e fique com ele.
Disciplina
Só conhecimento não basta; precisamos de planeja- mento, força de vontade e disciplina para fazer os ajustes necessários às nossas expectativas, agendas e estilos de vida. Precisamos pedir a Deus que nos ajude a ver isso como uma prioridade na vida, uma questão de obediência e uma maneira de agradar a nosso Pai e Criador. Imploremos que ele nos dê a força necessária para fazer o que sabemos que temos de fazer.
Rotina
Se buscamos ser coerentes em nossa hora de dormir, na hora de se levantar e na rotina antes de ir para a cama, nosso corpo aprenderá essa rotina, construirá um ritmo e injetará as substâncias químicas corretas que nos preparam para dormir. Conforme escreve Edlund:
Preparar para dormir pode ser tão importante quanto o tempo em que você vai dormir. O seu corpo não foi feito para pular de repente da extrema atividade mental e física para um sono imediato. Descanso e atividade exigem transições… tudo funciona melhor se o seu período antes do sono for rotineiro, rítmico e ritualizado. Você realiza um ritual de dormir noite após noite, e com isso seu cérebro e corpo se acostumam à ideia que esse pequeno grupo de comportamentos vai ajudá-lo a dormir e proverá descanso completo.[ii]
Jejum da Mídia
Um amigo não conseguia descobrir por que achava difícil dormir e acordava frequentemente com pesadelos. Eventualmente, admitiu que estava assistindo filmes logo antes de tentar dormir! Se estimularmos nosso cérebro (e a química do corpo) com e-mail, Facebook, filmes, noticiários na TV, jogos de computador, noticiários esportivos, cafeína ou outros energizantes, estaremos pedindo sono em atraso e perturbado — e vamos obter exatamente isso.
Cooperação da Família
Adolescentes barulhentos até tarde da noite ou uma es- posa que prefere ficar acordada até tarde pode tornar difícil estabelecer uma hora de dormir mais cedo e mais tempo para dormir. Talvez seja preciso uma conversa entre os membros da família, para examinar maneiras de um ajudar o outro a fazer as concessões necessárias, a fim de se obter sono suficiente para todos. Nós estabelecemos um toque de recolher às dez da noite para as noites de domingo até quinta-feira. Nas sextas e sábados, até às onze da noite.
Exercício
Se ficamos sentados à escrivaninha ou no carro o dia inteiro e esperamos estar cansados a ponto de dormir, podemos esperar uns protestos do corpo: “Ei, você ainda não fez nada comigo!” Em um experimento na Universidade Loughborough, foi verificado que fazer exercícios entre três e seis horas antes de dormir melhorava o sono.[iii]
Contentamento
Talvez o materialismo e a ambição sejam as maiores causas de privação de sono em nossa cultura. As pessoas olham a ideia de passar um terço da vida dormindo como “perder” mais de vinte anos de suas vidas, e pensam: “Eu conseguiria ganhar muito mais dinheiro e me tornar muito mais bem-sucedido (ou construir uma igreja maior) se eu cortasse um pouco do tempo de sono”. A maioria das pessoas que procura isto a curto prazo consegue resultados, mas perde a longo prazo, quando aos poucos a saúde é impactada e a vida é abreviada. O contentamento é uma maravilhosa cura para a insônia.
Fé
Embora a curto prazo os medicamentos para dormir, às vezes, possam ser necessários em situações extremas, no mundo todo a fé é um dos melhores remédios para dormir (ainda que menos usado) — e só tem bons efeitos colaterais.
Se eu estiver com dificuldade de dormir, uso minha fé na Palavra de Deus para dissipar minha ansiedade. Oro: “Pai Celeste, creio em Mateus 6.25-27, que diz que tu cuidas de mim mais do que das aves, e confio em ti para prover-me em tudo. Lanço meus cuidados sobre ti, sabendo que tu cuidas de mim”. A fé me ajuda a obedecer a ordem de Deus para dormir: “Pai, mesmo quando acho que dormir menos e trabalhar mais beneficiarão a mim e até a tua igreja, creio no Salmo 127.2, que diz ser vão, totalmente sem razão, levantar cedo demais ou ficar acordado até tarde demais”.
A fé me capacita a receber com alegria o sono como dom de Deus: “Pai, embora as vezes eu veja o sono como uma intrusão, um mal necessário, creio no Salmo 3.5, que o sono é o teu presente amável para mim, e o recebo com gratidão”.
A fé dissipa meus temores: “Pai, tem hora que tenho medo por meu emprego, minha igreja, ou meu país, mas creio no Salmo 4.8, que diz: “Em paz me deito e logo pego no sono, porque, SENHOR, só tu me fazes repousar seguro”.
Aconselhamento
Certa vez, um homem perguntou: “O que fazer quando os sofrimentos, temores, tristezas e as pressões são tantas que mesmo quando procuro dormir, o sono me foge? Se estes se acumulam, começo a sentir mais estresse pelo fato de não estar conseguindo dormir o suficiente”.
Quando estou caindo nesse redemoinho, é útil escrever tudo o que me perturba, junto com o próximo passo que terei de dar para tratar de cada problema. Assim, quando a ansiedade levanta a cabeça na hora em que a minha cabeça vai ao travesseiro, aponto para essa lista e digo: “Sei sobre isso e tenho um plano para tratá-lo”.
Nos casos mais sérios de insônia, o aconselhamento pode ter papel importante para a cura. Meu amigo Paul estava aconselhando a si mesmo ao escrever um diário e através da leitura do livro The Anxiety Cure (A cura da ansiedade), por Archibald Hart,18 [iv]livro esse que ele descreveu como “um salva-vidas”. Mas admitiu: “Eu não havia levado a sério a necessidade de trabalhar os meus hábitos de pensamentos e hábitos não bíblicos, pecaminosos e contraproducentes, que contribuíram para minhas depressões”. Foi ali que Paul começou a fazer aconselhamento bíblico comportamental-cognitivo com um pastor cristão de sua região. Ele prosseguiu, dizendo:
Eu estava resolvido a colocar rédeas sobre meu mundo mental, a despeito do que a química do corpo estivesse fazendo ou não fazendo. Foi a peça que faltava. Levou tempo, mas tenho crescido cada vez mais no domínio dessas toxinas espirituais, mentais e emocionais: tentando ler a mente de outros, pensando demais em segundas opções, sensibilidade exagerada, dando importância demasiada às opiniões das pessoas a meu respeito, exagerando os problemas dos outros, e ao presumir o pior das pessoas e situações. Comecei a ter prazer na vitória sobre minha mente no momento de pegar no sono. Estava encontrando o interruptor mental — depois de muitos anos de achar que não tinha como encontrá-lo — para desligar os pensamentos que surgiam no travesseiro. “Sinto muito, sr. pensamento. Agora é hora de dormir. Volte amanhã para me visitar. Boa noite!”
Humildade
Quando dormimos, estamos entregando o controle, e — pelo menos por algumas horas — nos lembrando que, na verdade, Deus não precisa de nós. Ao fechar os olhos a cada noite, dizemos: “Não sou eu quem manda no mundo, ou na igreja, e nem ao menos em minha pequena vida”. Até mesmo o presidente tem de vestir seu pijama toda noite, confessando efetivamente (mesmo contra a vontade) que Deus não precisa dele, que existe um Superpoderoso muito maior. Mas o sono do cristão deve ser diferente do sono daquele que não é cristão. Quando e quanto nós dormimos é uma enorme declaração de quem somos e no que cremos sobre nós mesmos e sobre Deus.
Os homens em especial encontram dificuldades em admitir a necessidade de dormir mais, especialmente quando sobreviveram muitos anos com menos. Ali é que uma voz objetiva, de fora, pode ajudar a nos humilharmos e a aceitarmos as nossas limitações. Um homem cristão esgotado admitiu: “O sono tem sido essencial para o meu ‘resetar’. É quase como se eu precisasse permissão do meu conselheiro para me convencer que não estava dormindo o bastante e que necessitava tirar duas semanas para me restaurar”.
Um pastor confessou que estava se privando de dormir durante muitos anos porque “era isso que os puritanos faziam”. Se eles podiam, por que não ele? Depois que acabou de entender que sua frágil humanidade precisava de descanso, ele disse:
O horário de todo mundo é diferente, e as necessidades de sono variam. Enquanto estivermos trabalhando bem e dormindo o suficiente para a necessidade de nosso corpo, estaremos honrando ao Senhor. Na verdade, eu estava desonrando a Deus quando dizia, “eu entendo que me dizes no Salmo 127 que dormir é um presente. Mas realmente, por que o Senhor não dá isso a outra pessoa? Dê para alguém mais necessitado? Para um mero mortal, de quem o mundo não dependa tanto?” Eu exagerava no consumo de café, tentando compensar. No papel eu era calvinista, mas no armário, um pelagiano, trabalhando mais pela lei do que pelo amor. Trabalhar é bom. Mas só é bom se for ancorado e totalmente condicionado pela graça. Agora estou recebendo graça e recebendo também a graça de dormir, porque meu Pai é bom e eu sou necessitado.
Aceitação de Períodos Especiais
Há horas em que as coisas não dão certo, quando o sono demora ou é encurtado por uma ou outra razão. Por exemplo: podemos ter de dormir menos, quando temos períodos especiais de trabalho ou ministério extra. Não devemos nos preocupar demais com períodos breves de intensidade. Deus pode nos sustentar nesses tempos excepcionais. Mas se isso se transformar em norma e hábito, não estaremos trabalhando ou ministrando bem ou por muito tempo.
Muitas vezes as pessoas apontam para cristãos famosos “que só dormiam uma hora por semana” (estou exagerando um pouco). O que não foi dito é que muitos deles sofriam terríveis problemas de saúde, e não poucos morreram bem jovens. Temos em nossos tanques apenas uma quantia limitada de combustível, que no fim vai acabar. Se corrermos a cento e vinte quilômetros por hora sem pausa para descanso, o combustível vai acabar muito mais depressa do que para aqueles que levam a sério a sua mortalidade, examinam os seus moto- res, e dirigem com economia.
Fazer a Sesta
Tomo café demais para fazer isso dar certo comigo, mas muita gente descobriu que uma soneca de quinze a vinte minutos durante o dia melhora tanto a sua produtividade, disposição e seus relacionamentos interpessoais que algumas companhias de alta tecnologia estabeleceram “cantinhos de soneca” ou “áreas para a sesta” para membros de suas equipes. Um estudo da NASA descobriu que sestas de vinte e seis minutos melhoraram o desempenho de algumas tarefas no trabalho em trinta e oito por cento.[v] Outro estudo a respeito dos melhores violinistas descobriu o fato que, além de dormir oito horas e meia por noite, uma hora a mais que a média norte-americana, eles também dormiam quase três horas por semana tirando a sesta.[vi]
Mesmo que não chegue sempre a dormir, o relaxar de um tempo de “soneca” pode ser incrivelmente repousante. Conforme explicou um homem: “Minha ‘soneca poderosa’ depois do lanche da tarde sobre o sofá me dá um estímulo de energia. Na verdade, eu não durmo, mas me relaxo conscientemente por quinze a vinte minutos. Outros podem fazer o barulho que quiserem; não me incomodo. Lembro de meu pai fazer o mesmo quando éramos crianças”.
Médico do Sono
Se você tiver tentado de tudo e ainda estiver exausto por dormir pouco, não é porque esteja negligenciando o sono. Não, você deseja desesperadamente dormir e não consegue. Talvez o problema tenha um componente físico, algo como apneia do sono. Neste caso, parte da solução será procurar um especialista em sono. De acordo com o Centro Americano de Controle e Prevenção de Doenças (Center for Disease Control and Prevention), “cerca de cinquenta a setenta milhões de adultos nos Estados Unidos têm dificuldades para dormir ou mesmo um distúrbio de vigília”.[vii]
Teologia do Sono
Em última análise, o sono, como tudo mais, deve nos levar ao evangelho e ao Salvador. Primeiro, isso nos leva a pensar sobre a morte; todos nós devemos fechar nossos olhos como no sono e acordar em outro mundo (1Ts 4.14).
O sono também nos ensina sobre o nosso Salvador. O fato de Jesus ter dormido (Mc 4.38) é tão profundo quanto “Jesus chorou” ( Jo 11.35). Estes fatos nos lembram da plena humanidade de Cristo, que o Filho de Deus se tornou tão frágil, tão fraco, tão humano que também precisava dormir. Que humildade! Que amor! Que exemplo! Que conforto! Que comprimido para dormir!
O ato de dormir ilustra a salvação. Quanto estamos fazendo quando dormimos? Nada! É por isso que Jesus usou o descanso para ilustrar a salvação. “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28).
O sono também nos aponta para o céu. Permanece um repouso para o povo de Deus (Hb 4.9). Isso não quer dizer que o céu vai ser um lugar onde estaremos apenas deitados, sem fazer nada – significa, sim, que o céu será um lugar de renovação e refrigério, de conforto e paz perfeita.
Espero que esta oficina o ajude a dormir melhor — com uma teologia mais saudável! Mas agora, quero que você acorde, vá entrando na quarta oficina de reparos, e arrume seus apetrechos de ginástica para nos exercitarmos na oficina de reparos de “Recriação”.
Este artigo é um trecho adaptado do livro Reset, de David Murray, Editora Fiel
[i] Adrian Reynolds, And So to Bed…: A Biblical View of Sleep (Fearn, Tain, Rossshire: Christian Focus, 2014); Matthew Edlund, The Power of Rest: Why Sleep Alone Is Not Enough (New York: Harper Collins, 2010).
[ii] Edlund, The Power of Rest, Kindle edition, locs. 959, 972.
[iii] 17 Ibid., loc. 1174.
[iv] Archibald Hart, The Anxiety Cure (Nashville: Thomas Nelson, 2001).
[v] Citado em Edlund, The Power of Rest, loc. 1666.
[vi] K. Anders Ericcson et al., “The Role of Deliberate Practice in the Acquisition of Expert Performance”, Psychological Review 1993, Vol. 100. No. 3, 363–406.
[vii] “Insufficient Sleep Is a Public Health Problem”, Centers for Disease Control and Prevention, September 3, 2015, http://www.cdc.gov/features/dssleep/.