A Bíblia nos diz que Abraão procurava por uma cidade cujo arquiteto e edificador é Deus (Hb 11.10). Jesus nos prometeu que ele prepararia uma morada para nós (Jo 14.3). E quando a história chega ao seu fim, uma grande cidade, a Nova Jerusalém, descerá do alto (Ap 21.2). É alguma surpresa que nós, como o Peregrino antes de nós, vejamos a nossa caminhada como uma metáfora, uma jornada à cidade celestial? E não é isso mesmo, um curto passo para então concluirmos que o nosso chamado de buscar primeiro o reino de Deus é um chamado para nos fazer chegar lá?
Não existe nada de errado com esse tipo de metáfora espacial. Não se reclama quando o Espírito Santo usa um figura de linguagem. Contudo, existe um perigo associado. Nós, de fato, estamos em uma jornada. Mas estamos indo mais para uma Pessoa do que para um lugar. Buscar primeiro o reino diz menos respeito sobre chegar lá ou construir o reino, e mais a respeito de buscar o Rei. Nós chegaremos, não quando ultrapassarmos a divisa da cidade, mas quando formos envolvidos pelos braços do nosso Salvador.
A glória do evangelho, da mesma maneira, é menos a respeito da glória de como nós temos paz com Deus e mais sobre a glória de que temos paz com Deus. As boas novas não são apenas o perdão dos pecados, mas a nossa adoção como filhos. Nossa religião não é um relacionamento, mas uma união do relacionamento. Nós somos trazidos, pela graça de Deus e sem nos tornarmos nós mesmos Deus, à própria família de Deus.
Ao longo dos anos, tem sido um hábito quando falo aqui e ali em conferências e em cultos, oferecer um pequeno presente aos que participam. É um panorama da Bíblia inteira. Já era hora de eu oferecer esse presente aqui:
I. Gênesis 1-2: Criação
II. Gênesis 3: Queda
III. De Gênesis 4 a Apocalipse 22: Tente voltar para Gênesis 1-2, e fazer uma leitura melhor.
A História do mundo é a história do retorno ao jardim. A História termina no começo. Receio que nós temamos a eternidade, que relutemos ir para onde vamos, que possamos ficar entediados justamente porque sentimos saudade da beleza de onde viemos. Nós não ansiamos o céu porque não olhamos de volta para o jardim.
No jardim nós éramos, primeiro, sem pecado. Antes de minha esposa falecer, ela perguntou se eu pensava que ela seria capaz de reconhecer aqueles que foram para o céu antes dela. Eu expliquei: “Querida, estou bem certo de que eu não reconhecerei a mim mesmo quando eu chegar ao céu. Eu me conheço hoje. Eu sem pecado, eu não posso imaginar com o que me pareceria”. Que coisa assombrosa será quando chegarmos em casa e descobrirmos que deixamos o pecado para trás. Em certo sentido, não reconheceremos a nós mesmos. Em outro, contudo, finalmente seremos o que sempre fomos. Vamos entrar em nosso próprio país. Vamos nos desfazer completamente da nossa natureza caída, e recordar a nossa natureza criada.
Segundo, no jardim nós estávamos em harmonia com o mundo e uns com os outros. No jardim, não apenas o leão e o cordeiro se deitavam juntos, mas também o marido e a mulher. O relancionamento humano não havia sido tocado pela morte, pela enfermidade, pelo pecado. Não havia necessidade de estar ou se sentir na defensiva, nem necessidade de preservar os “direitos” de alguém. E assim será no reino consumado. Todos os nossos relacionamentos serão purificados do pecado e do medo. Estaremos em paz. Cardos e abrolhos serão banidos, e não haverá mais suor nas nossas frontes. Tudo estará bem.
Tudo isso, contudo, Adão e Eva, antes da queda, e nós, após a nossa glorificação, trocaríamos pela única glória acima de todas as outras: nós caminharíamos com Ele no frescor da noite. A glória da eternidade é que estaremos com ele. Nós veremos a sua face e viveremos (Ap 22.4). Ainda melhor, o veremos como ele é e seremos feitos à sua semelhança.
O reino, contudo, não é meramente futuro, mas presente. Nossa santificação não é nada mais do que nos tornarmos o que seremos. Nosso viver em comunhão aqui na terra não é nada mais do que o que faremos. E o nosso viver coram Deo, diante da face de Deus, não é nada mais do que como e onde viveremos. Nosso progresso como peregrinos é medido não por quilômetros, mas por véus. Pois agora vemos através deles, sombriamente. Mas conforme crescemos em graça, conforme buscamos primeiro o seu reino e a sua justiça, os véus são progressivamente removidos.
Primeiro a glória começa a espreitar, dando apenas indícios do que há de vir. Mas conforme descemos ao vale, os véus começam a cair, e a visão dos olhos que havia começado a ficar turva se torna a visão da fé, que agora contempla a Shekinah.
Ore para que ele nos dê olhos para ver o que o olho não viu. Ore para que ele nos dê ouvidos para ouvir o que o ouvido não ouviu. Ore para que ele nos dê mentes para compreender, mesmo que seja apenas um indício, tudo o que ele prometeu aos seus amados. Delícias perpetuamente repousam sobre a Sua destra.
Tradução: Alan Cristie