Este foi o versículo que motivou o grande David Livingstone a deixar a Inglaterra para ser missionário no coração da África. Ele amou tanto aquele povo que deu a sua vida, no empenho de ser um instrumento nas mãos de Cristo, para conduzir aquelas ovelhas que o Pai escolheu desde a eternidade. Deus realmente ama os seus eleitos da África e está disposto a mover todos os obstáculos possíveis a fim de alcançá-los. Ele trasladou sobrenaturalmente o evangelista Filipe para alcançar um africano da Etiópia e pregar a ele o Evangelho da Graça, do Servo Sofredor que entregou a vida pelo seu povo, conforme a passagem de Isaías 53.
Foi no dia 22 de julho que pastor Ricardo, Tiago e eu nos dirigimos para o Aeroporto de Guarulhos, a fim de partirmos com destino a África, para mais uma Conferência Fiel. Ao chegarmos lá, fomos surpreendidos com a notícia que a companhia aérea que nos conduziria àquele continente estava em greve! O que fazer? A alternativa que nos era apresentada pela companhia era ficar num hotel, aguardando quantos dias fossem necessários, até que tudo retornasse ao normal. Logo percebemos que necessitávamos de uma interferência urgente da parte de Deus. Tiago e Rick (filho de pastor Ricardo que veio até o aeroporto para nos embarcar) corriam desesperados de balcão a balcão buscando outra solução. Não podíamos esperar; um dia a menos e todo o esquema montado para nossa chegada à conferência seria deitado por terra. Pastor Ricardo e eu ficamos em oração. Depois de um tempo considerável, a solução veio como por um milagre; fomos acomodados por outra empresa aérea em um vôo para Portugal, a fim de viajar a noite toda, passar o dia em Lisboa e, novamente, embarcar à noite para Johannesburg. Havia um casal, próximo a nós, que estava na mesma situação. Eram sul-africanos e precisavam também chegar com urgência em casa. O gerente da empresa aérea resolveu colocá-los em nosso grupo e recomendou que viajassem conosco até a África. Foi interessante ter a companhia de um casal não- crente; eram da Igreja Ortodoxa com idéias espíritas, e tínhamos todo o tempo do mundo para evangelizá-los. O pastor Ricardo falou-lhes da salvação pela graça, Tiago destruiu a idolatria, e eu lhes falei da obra da Cruz e de como cria com convicção na santa e sábia providência de Deus, que muito provavelmente os teria escolhido desde a fundação do mundo e, por isso, fizera com que tudo aquilo acontecesse.
Quando chegamos a Johannesburg tudo estava numa grande confusão. Havia centenas de pessoas, todas amontoadas em volta dos guichês da companhia aérea, procurando embarcar, mas era impossível. Tínhamos de seguir para Maputo, e mais uma vez necessitávamos ser “transladados”. Foi assim que nos dirigimos a um balcão, para tentarmos alugar um carro e seguir por terra até nosso destino, mas parece que todo o mundo pensou a mesma coisa, e as companhias estavam sem carro à disposição. Mais uma vez, oramos e encontramos, pela interferência de Deus, um carro simples que estava ao alcance das finanças da Fiel. Enquanto o pastor Ricardo e Tiago preenchiam os formulários, eu tomava conta das bagagens de mão (os livros e o restante das bagagens foram despachados direto do Brasil para Maputo); de repente, vejo Tiago dirigindo-se para o meu lado, com os olhos arregalados; pensei comigo mesmo que alguma coisa dera errado! Ele se aproximou e me disse: “Recebi um telefonema de São Paulo, dizendo que a mãe do pastor Ricardo acabou de falecer, e não sei como dizer a ele!” Depois de os formulários estarem devidamente preenchidos, ainda no meio da loja, Tiago disse: “Sr.Ricardo, sua mãe acaba de falecer!” Observei o pastor Ricardo… sua face… inclinou-a silente… nenhuma palavra… grossas gotas de lágrimas rolaram e se derramaram molhando o chão… nos abraçamos e oramos ali mesmo, dando graças pela longa vida da missionária Aletha Denham, noventa e nove anos, e pelo seu precioso testemunho e serviço ao Senhor. Só mais tarde, o pastor Ricardo disse, consolado: “Ela estava mesmo querendo ir para casa!” Quando chegamos na fronteira, faltando apenas 10 minutos para fechar, problemas à vista! Cara fechada, má vontade, passaportes, registrar o carro, pagar tachas! E na hora de sair: “Cadê meu passaporte e carteira? – perguntou o pastor Ricardo. Procuramos por todos os cantos, bolsos, bolsas e nada… apelei a um policial, e este saiu correndo para fora, demorou um pouco e trouxe um jovem, surpreendido com a carteira e o passaporte na mão. “Ah! Eu achei ali!”, disse ele. “E por que não entregou às autoridades?”, perguntou o policial. Nenhuma resposta. Deus não permitiu que faltasse alguma coisa; o dinheiro estava bem escondido e o rapaz pensou que fossem apenas documentos. Seguimos viagem e, ao escurecer, chegamos a Maputo.
Karl Peterson é o nome daquele que Deus levantou para ser o representante da Fiel em Moçambique. Trata-se de um homem muito especial, com um amor comovente pelos africanos. Foi muito bom vê-lo; sentimos muita segurança em sua companhia, pois ele é dono de uma capacidade impressionante para resolver problemas e sabe como tratar com os moçambicanos. Recebemos dele a notícia de que nossa bagagem havia chegado bem e de que, de forma milagrosa, os livros haviam passado pela alfândega sem que fosse necessário pagar nada! Glória a Deus, mais uma bênção! No outro dia, embarcamos para Nampula, nordeste do país, local da Conferência. Durante todo o percurso, o celular de Karl não parava: eram pastores ligando com mil problemas, pedindo sua ajuda para chegar à Conferência; um deles foi deixado para trás pelo machimbombo (ônibus), no meio do mato, a quem Karl confortou dizendo que estava orando e que aguardasse o socorro do anjo do Senhor! Ao chegar a Nampula, fomos recepcionados pelo Dr. Charles, um homem impressionante por sua seriedade, dedicação e zelo na obra do Senhor. Dono de uma visão extraordinária e disposição incansável, foi ele que preparou toda a parte logística da Conferência, e tudo funcionou de maneira impecável; fico imaginando como funcionará o hospital que está construindo para servir àquela gente sofrida. Certamente Deus será glorificado!
Deus abençoou a Conferência de uma forma maravilhosa. O pastor Martin Holdt, da África do Sul, foi usado tremendamente ao falar sobre a Soberania, Sabedoria e Suficiência de Deus, e a mim coube falar da Glória de Deus, no Culto, na Disciplina, nas Ordenanças e no Crescimento Legítimo da igreja. No retorno a Maputo, quando fizemos escala em Beira, lá estava o Karl, no aeroporto, andando de um lado para o outro, grudado no celular. Tiago me disse: “Você sabe o que ele está fazendo?” Respondi: “Não”. Ele me informou: “Ele está ligando aos pastores para saber se chegaram bem!” Meus olhos se encheram de lágrimas…
E que dizer de Angola? Angola é um país destruído pela guerra. O povo vive em extrema pobreza, com lixo amontoado pelas ruas, trânsito desordenado e muita gente pela rua. Mas nada disso os abate; é um povo alegre e cheio de esperança! Pode-se ver no rosto de cada um a expressão de júbilo de quem acaba de ganhar um grande prêmio! A paz! Camisetas, vestidos estampados, todos com dizeres louvando a paz. Até os hinos falam da “paz que Deus trouxe ao país”. A pequena Conferência contou com a presença de quase setenta pastores ao todo. O tema era o Evangelho da Graça, mas a surpresa foi tão grande que, tenho certeza, não esperavam que o conteúdo fosse tão diferente daquilo que eles estavam acostumados a chamar de Evangelho da Graça. Foi um choque! Depois de pregar por mais de uma hora e meia, tive de responder perguntas por mais de duas horas! Perguntas inteligentes e que demonstravam o bom espírito dos Bereanos. Após a pregação da noite, o irmão Simia, nosso anfitrião, nos abraçou e, com os olhos marejados de lágrimas, agradeceu efusivamente.
Fomos recebidos como príncipes de Deus. Aqueles rostos nos pareciam tão familiares, senti-me como se estivesse em casa, pelo menos eu, que moro na Bahia! Tudo estava maravilhoso, mas a saudade de casa já começava a apertar… na hora de ir embora, parecia tão mais fácil nadar pelo Atlântico e chegar ao Brasil! Mas a jornada foi longa; longa o suficiente para pensarmos no grande desafio de propagar a Fé Reformada nos países de língua portuguesa. Desafio intransferível! Não pertence a mais ninguém somente a nós, reformados do Brasil.