domingo, 17 de novembro
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A bênção da disciplina de Deus

Pais veem os benefícios da disciplina mais facilmente do que seus filhos. Quando eu era criança, nunca engoli de verdade a ideia de que eu estava sendo punido porque meus pais me amavam. Minha opinião simplesmente era diferente. Agindo como meu próprio advogado de defesa, eu ensaiava na minha mente a severidade da minha punição; eu considerava a precipitação do veredito, a desproporção entre o crime e a punição. Eu alimentava minha autocomiseração e chorava no meu travesseiro. Injusto! Só quando fiquei mais velho passei a ver a disciplina através de lentes mais limpas. E, claro, hoje fico feliz pela disciplina amorosa dos meus pais.

Mas e quanto à disciplina de Deus? Nós somos gratos por ela? Nós vemos o seu amor nela?

Como crentes, lutamos para aplicar essa lição de infância para a nossa caminhada na fé. Frequentemente vemos a disciplina de Deus de uma perspectiva infantil. Nós sofremos — nos apressamos em perguntar: por quê? Quando coisas ruins acontecem com o povo de Deus, nós ficamos confusos com espanto, frustração ou dúvida. Nós questionamos a sabedoria de Deus. Nós questionamos os motivos de Deus. Assim como a disciplina paternal que enfrentamos quando crianças, questionamos a severidade do sofrimento, a competência, a justiça da prova. Por que eu deveria passar por toda essa dor?

Isso certamente se encaixa na situação abordada no livro de Hebreus. O autor insta que os cristãos hebreus considerem suas provas e os sofrimentos pelos quais estavam passando com maturidade espiritual. Ele os encoraja a lembrar de como Deus age com seus filhos. Eles precisavam de que alguém os lembrasse.

Todos nós não precisamos? Assim como eles, precisamos ser lembrados da Palavra de Deus: “e estais esquecidos da exortação que, como a filhos, discorre convosco?” (Hb 12.5). Tais palavras são parte de uma exortação anterior para fazê-los lembrar de Jesus Cristo em seu sofrimento, aquele que “suportou a cruz” e “a oposição dos pecadores” (12.2-3).

Nós escorregamos para um esquecimento da Palavra de Deus. O autor de Hebreus, portanto, nos lembra daquela passagem, referindo-se à disciplina paternal como uma “exortação” ou um “encorajamento”. A palavra específica usada aqui tem parentesco com a palavra usada para o Espírito Santo no evangelho de João, onde ele é chamado de nosso “Advogado”, “Consolador” ou “Ajudador”. No evangelho de João a palavra é paracl?tos; aqui, a palavra é paracl?sis. Essa palavra confortadora de Deus, que o autor de Hebreus nos diz para não esquecermos, é na verdade uma citação de Provérbios 3.11-12. O autor bíblico nos informa de duas coisas, seguidas por uma explicação: primeiro, não devemos menosprezar a disciplina do Senhor; segundo, não devemos desmaiar quando formos reprovados; e terceiro, a explicação: “Porque o Senhor corrige a quem ama e açoita a todo filho a quem recebe” (v. 6). A disciplina é fundamentada no cuidado paternal de Deus para conosco. O ponto é claro, e não devemos perdê-lo: Diante de sofrimento e luta, diante de frustrações e perseguição, Deus não nos abandonou. Ele não nos esqueceu, nem está nos tratando como rejeitados ou indesejados. Pelo contrário, ele está nos tratando como filhos e filhas.

O autor nos dá mais informações sobre o tema. Ele mostra para esses crentes rodeados por provações o exemplo de amor da paternidade humana. Nossos pais terrenos “nos corrigiam por pouco tempo, segundo melhor lhes parecia”. Ao dizer “segundo melhor lhes parecia”, o autor indica que nossos pais não eram infalíveis. Eles trabalhavam para nos criar da melhor forma que podiam — “e os respeitávamos” por isso. Sob circunstâncias normais, como adultos, nós apreciamos os esforços de nossos pais em nos criar, especialmente quando nós mesmos temos filhos. Nós respeitamos os nossos pais porque eles tentaram nos melhorar e desenvolver o nosso caráter. Honestamente, devemos ter pena de pessoas que nunca foram ensinadas a guardar os seus corações, resistir aos seus impulsos ou frear as suas línguas.

Mas Deus não nos disciplina “segundo melhor lhe parece”; mas “nos disciplina para aproveitamento, a fim de sermos participantes da sua santidade”. Não há dúvidas aqui quanto ao fato de Deus saber o que está fazendo.  Nunca há nada desinformado, mal orientado ou injusto em suas palmadas. É agradável? O autor de Hebreus diz que não é. “Toda disciplina no momento não parece ser motivo de alegria, mas de tristeza” (12.11a). Não tem como fugir do fato — disciplina é desagradável. Ela é corretiva. Ela nos conduz a uma nova direção. Ela nos força a sair dos vícios de posturas, ações, pensamentos e palavras pecaminosas. Ela nos faz olhar para os nossos hábitos a partir de uma perspectiva melhor e mais bíblica. Embora o caminho seja doloroso, suas recompensas são benditas: “depois, produz fruto pacífico aos que têm sido por ela exercitados, fruto de justiça” (v. 11b).

“Aos que têm sido por ela exercitados”. Nós não devemos perder esse ponto essencial. Os cristãos hebreus são instados a serem “exercitados” pelos seus sofrimentos. Em outras palavras, se querem que a disciplina tenha seu efeito desejado, eles não devem meramente suportar o que sofrem. Eles devem ser “exercitados” pelo sofrimento. Eles devem aprender dele, pois “exercício” não acontece automaticamente, assim como ir à escola não garante que aprendamos qualquer coisa. Alguns cristãos que sofreram muito aprenderam muito pouco. Outros, contudo, foram “exercitados” pela disciplina de Deus, e o “fruto de justiça” está lá para Deus e nós vermos.

A história de Jó nos ajuda nesse sentido. Jó sofreu a mais severa provação de fé. As tragédias que afligiram a sua vida não foram porque ele era um pecador, ou por causa de seus pecados. Ele foi testado porque ele era fiel (Jó 1.1, 8; 2.3). Satanás tinha um propósito na provação de Jó, mas Deus tinha outro. Lembre-se que Jó perdeu grande parte da sua família, assim como de sua riqueza e saúde — tudo isso tão cruelmente sincronizado. Até mesmo a sua esposa o abandonou. O conselho dela: “Amaldiçoa a Deus e morre!” (2.9). Jó sofreu todos esses terrores; e depois sofreu sob a acusação de três de seus supostos amigos que o informaram que coisas ruins não acontecem com pessoas boas. O conselho deles: “Arrependa-se!” (8.5-6; 15.4-5; e mais). Jó, contudo, era um homem instruído na Palavra de Deus, e então argumentou seu caso contra seus supostos consoladores. Ele também argumentou com Deus. Cambaleante de confusão, ele pediu a Deus esclarecimento. Ele queria que Deus explicasse. Deus finalmente falou, mas foi Jó que ficou sob divino interrogatório, não o Senhor (capítulo 38).

Jó se arrependeu no pó e nas cinzas (42.6). Ele se arrependeu por não confiar em Deus no meio do seu sofrimento. Ele se arrependeu por “desmaiar” e por duvidar da justiça e do bom propósito de Deus para ele através do seu sofrimento. Ele se arrependeu de questionar a sabedoria, o favor e o amor de Deus. Ele se arrependeu por falhar em ver que Deus usara as provas que ele enfrentou para o seu bem. E é isso que o autor de Hebreus também está dizendo. Deus usa as nossas provações como disciplina “para aproveitamento”.

Se queremos crer nisso, precisamos de ouvidos para ouvir.

A palavra de Deus é o agente da sua disciplina. Contudo, circunstâncias ganham a nossa atenção — e Deus usa todo tipo de circunstância como “ganhadoras de atenção”: perda de emprego, bebês desobedientes ou adolescentes problemáticos, uma lesão, uma doença, um divórcio, um acidente e muito mais. Os fardos podem ser grandes ou pequenos. O de Jó era grande.

Talvez, em comparação com o dele, o seu seja pequeno. Não importa. Deus disciplina aqueles a quem ama. Ao ganhar a sua atenção com provações e circunstâncias difíceis, a Palavra de Deus serve como o agente de correção, como uma voz em seus ouvidos para corrigir, consolar, reprovar, exercitar, etc. Isso é “disciplina” paternal. Perceba quão próxima a palavra disciplina está de outra palavra bíblica, discípulo. A disciplina de Deus serve para nos tornar discípulos de Cristo. As provações que enfrentamos são divinamente designadas para nos amadurecer, a fim de que nos tornemos discípulos mais úteis na igreja e no reino de Deus.

Você está sendo corrigido e “exercitado” pela dificuldade que está suportando? Você está se tornando um discípulo adequado de Cristo a partir da disciplina paternal de Deus? A disciplina paternal de Deus é apenas para crentes; é para discípulos. Sem dúvida, incrédulos também podem aprender muito das duras batidas da vida e, como resultado, eles podem se tornar melhores pessoas por causa das provações. Mas as duras batidas da vida não os santificam. Eles não se tornam discípulos de Jesus através do sofrimento. A disciplina de Deus para com seus filhos, contudo, é santificadora. A sua disciplina é amor em ação, pois ele nos ama não nos mimando, mas nos corrigindo. Ele está nos tornando discípulos.

Se a voz da disciplina de Deus está em seus ouvidos — talvez circunstâncias difíceis estejam fazendo você pausar para ouvir a sua voz — você é sábio e obediente somente quando dá adeus à incredulidade, marca um ponto contra o pecado e deixa para trás, sem arrependimento, seus hábitos caprichosos, posturas, rancores, questionamentos ou autocomiseração. Faça isso e confie em Deus , aprendendo a orar: “Senhor, não se faça a minha vontade, mas a tua”.

 

Tradução: Alan Cristie


Autor: J. Mark Beach

J. Mark Beach é deão e professor de estudos ministeriais e doutrinários no Mid-America Reformed Seminary em Dyer, Indiana. Ele é editor e escreve regularmente para o Mid-America Journal of Theology.

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