terça-feira, 16 de abril

A ética humana

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A história humana é tragicamente cheia de exemplos de perseguição e opressão que surgem quando aqueles que estão no poder criam suas próprias definições da humanidade e dos direitos humanos, de modo a excluir e abusar de certos grupos de pessoas. A Bíblia é clara ao dizer que Deus deu a todos os seres humanos a dignidade, a humanidade e os direitos. A compreensão bíblica de humanidade fornece a base essencial para as decisões éticas sobre como tratar as outras pessoas.

A visão bíblica sobre a humanidade

A Bíblia começa com Deus, o soberano Criador de todas as coisas: “No princípio, criou Deus os céus e a terra” (Gênesis 1:1). Sua obra, tudo desde a luz na terra, às  criaturas viventes, é chamado de “bom”. No entanto, a humanidade, sendo a própria imagem de Deus, é a coroa da criação—“eis que era muito bom” (versículo 31). Neste sentido, Deus é revelado nos seres humanos de forma mais maravilhosa do que em qualquer outra criatura.

Em Gênesis 1:26, Deus disse: “Façamos o homem à nossa imagem”. No início, nosso Criador nos deu um título notável: “imagem de Deus”. Esta expressão revela a dignidade de todos os seres humanos, pois estabelece as pessoas como representantes do Rei do universo. De acordo com a imagem de Deus, aos seres humanos são dados a dignidade e o domínio especial, e eles são comissionados a cuidar da criação de Deus (versículos 28-30).

As consequências da visão bíblica sobre a humanidade

Como portadores da imagem de Deus, os seres humanos são imbuídos de uma dignidade e um valor maior do que os animais. Quando falou a Noé, após o dilúvio, Deus enfatizou que a vida humana deve ser muito valorizada, e que a violência contra qualquer ser humano deve ser rigorosamente punida (Gênesis 9:5-6).

Em Gênesis 1 e 2, vemos que o plano de Deus era que a terra fosse preenchida pelos portadores de sua imagem, os quais deviam glorificá-lo através da adoração e da obediência. Este estado de consciência, que desfruta da bênção intencionada de Deus e de seu governo sábio, é chamado “shalom”. Segundo escreve Cornelius Plantinga Jr.:

Na Bíblia, “shalom” significa florescimento, plenitude e deleite completo—um estado rico em que as necessidades naturais são supridas e os dons naturais aplicados proveitosamente… . “Shalom”, em outras palavras, é como as coisas deveriam ser (“The Way It’s Supposed to Be: A Breviary of Sin” [Como deveria ser: Uma síntese sobre o pecado], página 10).

“Shalom” significa a plenitude da paz, a visão de uma sociedade sem violência ou medo: “Estabelecerei paz na terra; deitar-vos-eis, e não haverá quem vos espante; farei cessar os animais nocivos da terra, e pela vossa terra não passará espada” (Levíticos 26:6). “Shalom” é uma espécie de bem-estar profundo e abrangente—bem-estar abundante—com suas conotações de paz, justiça e bem comum. Em resumo, os escritores bíblicos usam shalom para descrever o mundo de paz, segurança, justiça, ordem e plenitude universal que Deus planejou, no qual todos os seres humanos gozam de liberdade, segurança e paz.

As visões antibíblicas da humanidade

Gênesis 3 registra o terrível dia em que a humanidade caiu e o shalom foi violado. Adão e Eva quebraram seu relacionamento com Deus, rebelando-se contra o seu mandamento. Foi uma traição cósmica. Ao invés de confiar na boa e sábia palavra de Deus, eles confiaram nas palavras astutas e enganosas da Serpente. Em resposta, o Criador amaldiçoou a humanidade com o vazio e a morte. A imagem real de Deus caiu na extrema desonra que todos nós experimentamos.

Esta queda trágica mergulhou a humanidade em um abismo relacional. Após a queda, a humanidade foi escravizada na idolatria (ódio a Deus) e na violência (o ódio do outro). O pecado inverte o amor de Deus, que por sua vez torna-se idolatria, e inverte o amor ao próximo, que se torna a exploração de outros.

O coração do homem caído encontra maneiras para justificar seu ódio por outras pessoas e seu desejo de explorá-los. O resultado é a multiplicidade dos pontos de vista antibíblicos sobre a humanidade, encontrados ao longo da história, os quais desumanizam e excluem as pessoas criadas à imagem de Deus. Existiram muitas grandes visões não cristãs sobre a natureza da humanidade, tais como o dualismo racionalista de Platão, o determinismo econômico materialista de Karl Marx, o determinismo psíquico de Sigmund Freud, e o determinismo do condicionamento ambiental de B.F. Skinner. Milhares de outras ideologias antibíblicas sobre a humanidade existiram, tais como o tribalismo, o darwinismo social, o racismo, o nazismo, e pontos de vista sobre uma humanidade superior com base na religião, riqueza, gênero, idade, intelecto, hereditariedade, e muitos outros fatores.

As consequências dos pontos de vista não bíblicos sobre a humanidade

Sem o entendimento bíblico sobre a humanidade e a dignidade humana como portadores da imagem de Deus, a sociedade fica livre para se degenerar em violência, opressão e exploração dos fracos pelos fortes. O Antigo Testamento mostra claramente a crueldade e a violência que resulta da queda: a violência contra crianças (Salmo 137:9), mulheres (Amós 1:13) e de nascituro (2 Reis 15:16); estupro (Juízes 19:22-30); massacres (1 Samuel 22:18-19) e escravidão (Amós 4:2).

Ao longo da história, vemos como os pontos de vista antibíblicos sobre a humanidade são usados ??para explorar e oprimir o povo. Os fortes oprimem os fracos, e há injustiça contra os grupos malquistos e menos valorizados, desde o nascituro ao idoso. Há aborto, infanticídio, abuso infantil e a exploração do trabalho infantil. Há escravidão, violência baseada em gênero, violência sexual, tráfico sexual, tráfico de trabalho, racismo, genocídio e guerra étnica. Há luta de classes, privação, discriminação de idade, opressão aos pobres e discriminação contra os malquistos, os deficientes, os não instruídos, os fracos e os impotentes. As injustiças e as explorações que acontecem quando a humanidade é redefinida são inúmeras e decepcionantes.

O chamado bíblico para a justiça e a misericórdia

Embora não hesite em descrever a dura realidade da violência e da opressão, a Bíblia chama-nos claramente a lutar pela justiça e pela misericórdia para todas as pessoas como Deus planejou (Êxodo 23:2-3,6; Deuteronômio 24:17-18; Provérbios 21:3).

O profeta Zacarias retrata o povo de Deus como uma nação que pratica a justiça e a misericórdia em sua sociedade:

Assim falara o SENHOR dos Exércitos: Executai juízo verdadeiro, mostrai bondade e misericórdia, cada um a seu irmão; não oprimais a viúva, nem o órfão, nem o estrangeiro, nem o pobre, nem intente cada um, em seu coração, o mal contra o seu próximo (Zacarias 7:9-10).

Quando Israel falha e continua a se rebelar contra a lei de Deus, Deus profere ameaças de juízo, mas, em seguida, derrama graça e os restaura. Zacarias prevê a graça de Deus que conduz ao arrependimento e um povo que ardentemente busca a justiça e a misericórdia para todos. Como resultado, as nações descrentes virão perguntando sobre o Senhor (Zacarias 8:20-23). O povo de Deus será uma luz para as nações (Isaías 49:6), a esperança de que culmina com o Messias.

No início do ministério de Jesus, ele declarou que estas palavras de Isaías foram cumpridas nele:

O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista aos cegos, para pôr em liberdade os oprimidos e apregoar o ano aceitável do Senhor (Lucas 4:18-19)

Libertar os cativos e aliviar os pobres e oprimidos era o centro de sua missão divina (Mateus 4:24; Lucas 6:20; 7:18-23; 14:12-24; João 8:36). Seu último ato de libertação foi a sua morte vicária e ressurreição vitoriosa, que libertou o seu povo da escravidão do pecado e da morte (Atos 13:36-39; Romanos 8:1-4; Gálatas 1:3-4; Hebreus 9:27-28; 1 Pedro 2:24; Apocalipse 1:5).

Ao longo de seu ministério, Jesus se opõe aos pressupostos desumanizadores da sua cultura. Ele passou um tempo significativo com as crianças, as mulheres, os pobres, os doentes, os samaritanos e outros marginalizados (Mateus 8:1-4; 9:9-13; 21:28-32; Marcos 10:13-16; Lucas 6:17-19; 10:38-42; João 4:1-45). Paulo ecoa esta abordagem paradoxal:

Pelo contrário, Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes, e Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são, a fim de que ninguém se vanglorie na presença de Deus. (1 Coríntios. 1:27-29)

Na melhor das hipóteses, a igreja tem sido conhecida pelo amor e serviço sacrificial para com os pobres, oprimidos e marginalizados. Esse serviço tem sido um apologético poderoso para o evangelho. Ao defender a dignidade de todas as pessoas como imagem de Deus e expressar tangivelmente a ética bíblica da humanidade que flui a partir disso, a igreja pode ser uma luz para as nações e participar na missão de Deus por acolher os fracos e os impotentes para achar a graça, a misericórdia e o descanso em Jesus Cristo.


Autor: Justin Holcomb

Justin Holcomb é bispo Episcopal (Ministro de Vocações na Diocese da Flórida Central) e ensina teologia, filosofia e pensamento cristão no Gordon Conwell Theological Seminary e no Reformed Theological Seminary. Anteriormente, ele lecionou na University of Virginia e na Emory University. Justin tem dois mestrados pelo Reformed Theological Seminary e doutorado pela Emory University.

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