Artigo adaptado do livro 8 Mulheres de Fé, de Michael Haykin, pela Editora Fiel.
Então, uma das coisas mais importantes que Esther prezava em mantê-la próxima de Deus era a conversação espiritual com os amigos próximos, como ocorria com Sarah Prince:
Eu deveria valorizar altamente (assim como você, minha querida) amigas encantadoras como você – amigos com quem se pode desvendar a alma também… Entendo a conversação religiosa como uma das melhores ajudas para se manter a religião na alma, à exceção apenas da devoção secreta, não sei o que é melhor – então que coisa lamentável que isso seja negligenciado pelos próprios filhos de Deus.
Perceba a conexão entre amizade e o que Esther chama de “conversação religiosa”. Para o cristão, amigos verdadeiros são aqueles com quem é possível compartilhar as coisas mais profundas da vida. São pessoas com quem é possível ser transparente e aberto. Nas palavras de Esther, são pessoas com quem é possível “revelar toda a alma”. E, no curso da conversa sobre coisas espirituais, o crente pode encontrar força e encorajamento para levar uma vida cristã. Referindo-se à conversação espiritual com amigos como “um dos melhores auxílios para manter a religião na alma”, Esther obviamente a vê como meio da graça, uma das maneiras como o Espírito Santo de Deus mantém os cristãos em comunhão com o Salvador. Como outro cristão de New England, Nathanael Emmons (1745–1840), um teólogo que foi orientado por seguidores próximos de Jonathan Edwards, expressa em uma de suas máximas favoritas: “Um homem é feito por seus amigos”.
Esta é a forma como Esther verbalizou o mesmo pensamento em outra ocasião, ao enfatizar a importância da amizade cristã como um meio para andar com Deus:
Nada é mais refrescante para a alma (exceto a comunicação com o próprio Deus) do que a companhia e a associação com um amigo – alguém que tenha o espírito de verdadeira amizade e tenha gosto por ela – isso é tornar a alma racional – isso é a semelhança com Deus.
E Sarah era essa amiga, como os registros de Esther de 11 de outubro de 1754 e de 4 de junho de 1755 revelam:
É um grande consolo para mim, quando meus amigos estão longe, que eu os tenha em algum lugar do mundo, e você, minha querida, é uma delas, e não está entre as menores, pois eu a estimo como uma das melhores e, em alguns aspectos, mais próxima do que qualquer irmã que eu tenha. Não tenho nenhuma irmã para quem eu possa escrever tão livremente quanto para você, a irmã do meu coração.
Considere, minha amiga, que coisa rara é encontrar uma amiga como eu tenho em minha Fidelia – Quem não valorizaria e prezaria tal amigo acima do ouro, da honra ou de qualquer outra coisa que o Mundo possa proporcionar?
Esther estava convencida de que essa amizade era um dom dos céus. Como ela afirmou em dois registros em seu diário – o primeiro de 5 de outubro de 1754 e o segundo de 15 de fevereiro de 1755:
A sra. Smith e eu estávamos conversando (…) E concluímos que o que quer que tenha sido dito em confidência enquanto estávamos ali devia ser uma questão de amizade, mantendo-se em segredo. Embora a amizade estivesse encerrada, ainda assim a obrigação era tão forte quanto sempre foi, e a sra. Smith pensa ainda de forma mais intensa (…) Vejo os laços da Amizade como sagrados, e acredito que devem ser uma questão de Oração Solene a Deus (onde exista uma amizade contraída) que ela possa ser preservada.
Você pensará que não sou tão indiferente em relação a tudo neste mundo, mas, para dizer a verdade, quando falo de mundo e das coisas que estão no Mundo, não quero dizer amigos, pois a amizade não pertence a este mundo. A verdadeira amizade é, em primeiro lugar, acesa por uma centelha do céu, e o céu jamais irá lamentar que ela parta, mas ela arderá por toda a Eternidade.
Um ano mais tarde, em 23 de janeiro de 1756, Esther voltou a afirmar sua convicção sobre a vital necessidade de ter amigos cristãos:
É, minha querida, uma grande misericórdia que tenhamos quaisquer amigos – o que seria deste Mundo sem eles? – uma pessoa que considera a si mesma sem amigos deve, entre a maior parte das criaturas, ser miserável nesta vida – esta é a Vida da Vida.
Perceba o modo como Esther valoriza os amigos cristãos. Para ela, eles são uma das maiores fontes de felicidade neste mundo. Por que Esther depositava tanto valor na amizade? Bem, certamente porque percebia que os amigos cristãos e a conversa com eles são vitais para o crescimento espiritual.
As convicções de Esther em relação à amizade como um meio da graça foram desafiadas em 12 de abril de 1757, quando um dos tutores da faculdade, John Ewing (1732– 1802), que, mais tarde, seria professor de Ética na Universidade da Filadélfia e pastor da Primeira Igreja Presbiteriana na Filadélfia, desafiou sua compreensão acerca da amizade:
Tive um combate inteligente com o sr. Ewing a respeito de nosso sexo – ele é um homem talentoso e capacitado, mas que nutre pensamentos inferiores sobre as mulheres – ele começou a disputa dessa maneira. Ao falar de Miss Boudanot, eu disse que se tratava de uma criatura amigável e sociável (…). Mas o sr. Ewing disse: “Ela e os Stockton são cheios de conversa sobre Amizade e sociedade e coisas assim”, e fez uma careta, como se tivesse muito nojo – perguntei a ele sobre o que gostaria que eles falassem – se ele escolheria que eles falassem de moda ou vestidos – ele respondeu coisas que eles entendessem. Ele não acha que as mulheres saibam o que é amizade.
Dificilmente, elas seriam capazes de qualquer coisa tão agradável e racional quanto a amizade. (Minha língua, sabe, ali estava bem relaxada, e os pensamentos se acumulavam — então, falei gaguejando e com bastante cuidado.) Você pode imaginar que grande campo esse discurso abriu para mim – repliquei com muitas coisas severas sobre ele antes que tivesse tempo de voltar a falar. Ele corou e parecia confuso (…) mantivemos o debate ainda por uma hora. Eu o calei com minhas palavras. Ele se levantou e disse “seu servo” e foi embora (…). Uma das últimas coisas que ele disse foi que nunca, em toda a sua vida, conheceu ou ouviu falar de uma mulher que tivesse um pouco mais de aprendizado do que [o comum?] e que isso não a deixasse orgulhosa a tal ponto que ela se tornasse repulsiva [para] todos que a conheciam.
Ewing provavelmente nunca se esqueceu desse encontro com a formidável filha de Edwards. Esther sabia, por experiência própria, em virtude de sua rica amizade com Sarah Prince, do que se trata a verdadeira amizade e que Ewing não tinha ideia do que estava falando.
O comentário final de Esther sobre o desdém de Ewing pelas mulheres que eram educadas nos mostra muito do que ele era e também da própria Esther. Jonathan Edwards, seu pai, assim como o pai dele, Timothy Edwards (1669–1758), acreditavam no valor de se educarem as meninas. Edwards era o quinto de onze filhos – dez meninas e Jonathan! As irmãs de Edwards se tornaram mulheres altas, cada uma com mais de um metro e oitenta, e aqueles que as conheciam falavam dos “dezoito metros de filhas de Timothy Edwards”! Bem incomum para um homem do século XVII, Timothy Edwards as encorajou a se desenvolverem intelectualmente, assim como espiritualmente. Além de dar às suas filhas educação similar à de Jonathan, Timothy enviou todas elas, à exceção de uma, para uma escola de boas maneiras em Boston. Diante de tudo isso, essa educação produziu mulheres espiritualmente focadas que não receavam falar o que pensavam. Assim como o encontro de Esther com Ewing mostra, a forma como Jonathan criou suas filhas produziu mulheres igualmente fortes, assim como suas próprias irmãs.