quarta-feira, 30 de outubro
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O papel da consciência

O trecho abaixo foi retirado com permissão do livro Teologia Afetuosa de Richards Sibbes, de Mark Dever, Editora Fiel.

Uma pessoa não é composta somente por suas faculdades naturais. “Em sua grande misericórdia”, Deus deixou a consciência. Sibbes ensinou que a consciência no homem age como “o vicário [de Deus]; um pequeno deus em nós que exerce

o seu ofício, chamando-nos, direcionando-nos, examinando-nos e condenando-nos”. Essa citação resume os diferentes papéis da consciência no arrependimento e na conversão, na santificação e na orientação.

Em seus sermões, Sibbes falava sobre a consciência em termos exaltados, como o “vice regente e delegado [de Deus] em nós”, O juiz de Deus, seu trono na alma, seu “tribunal, por assim dizer, onde ele realiza seu julgamento”. Para seus ouvintes advogados na Gray’s Inn, ele trabalhava em cima das ilustrações jurídicas de Paulo, descrevendo a consciência como um informante, um acusador, uma testemunha, um juiz e um carrasco, todos juntos no tribunal de Deus, o “tribunal [inferior] da consciência”. A consciência, basicamente, “exerce a função de Deus” em nós. É um “capelão real, um teólogo doméstico” dentro da alma. Com base nas origens etimológicas no grego e no latim, Sibbes ensinava que a consciência é um “conhecimento com Deus”, especialmente um “conhecimento do coração com Deus” que foi posto na alma por Deus. Até os analfabetos podem “ler” esse “livro” que foi “escrito em seus corações”.

O Testemunho Interior

Sibbes ensinou que a principal maneira de a consciência exercer a função de Deus na alma é “acusando-nos por causa de nossos pecados”, (como em Romanos 2.15). Aqueles que contrariam suas consciências e vivem no pecado abusam da liberdade cristã, enfraquecem sua fé e suas afeições pelo que é bom e deterioram seu amor por Deus e o senso do favor de Deus. Eles são impedidos de se achegar confiantemente a Deus, pois calaram a boca da consciência. Sibbes diz que essas pessoas estão “mortas para as boas ações” e são “piores do que sodomitas”. Elas renunciam ao batismo, alimentam suas corrupções, mortificam seus espíritos e jogam fora a consolação. Ademais, evidenciam que não estão sendo ensinadas por Cristo por meio de seu Espírito. Elas não podem pensar que amam a Deus, que seu Espírito habita nelas, que elas têm alguma coisa a ver com Cristo, que Deus será misericordioso com elas ou que elas vão para o Céu. Embora usem o uniforme de Cristo, essas pessoas servem ao inimigo de Cristo e, por isso, não podem esperar nada de Deus, exceto sua vingança. Essa “consciência inflamada não é capaz de suportar a presença de Deus”, porque somente nos aterroriza e enche de medo, especialmente de Deus.

Em vez de descartá-la, precisamos dar ouvidos ao veredicto da consciência. Sibbes ensinou que há dois tipos de veredictos da consciência: o natural e o espiritual.30 O primeiro tipo é o veredicto comum da consciência e é fraco; ele não é suficiente para que um homem mude, mas somente o atormenta. Todos os não cristãos experimentam esse veredicto comum do Espírito. Sibbes usa uma ilustração dramática para descrever esse medo da consciência no homem não regenerado: “ele não pode voltar para a casa de sua consciência”, pois sente medo da própria consciência; os não regenerados são como “estranhos na própria casa, sentindo mais medo de si mesmos do que de qualquer outra coisa”. Sibbes descreveu os tormentos da culpa na consciência usando o exemplo de Charles IX, “o qual, depois do massacre traiçoeiro que promoveu, nunca mais conseguiu ter paz e tranquilidade. Por isso, toda noite, na hora de descansar, que é o período em que a consciência mais trabalha, ele precisava receber os meninos cantores”.

Uma das ideias mais recorrentes em Sibbes é que, inevitavelmente, a consciência cumprirá seu papel de juiz, nesta vida ou na próxima: “Quanto mais sua consciência é silenciada e violentada neste mundo, mais se abrirá no momento da morte e no dia do julgamento”. Portanto, Sibbes incentivava seus ouvintes a estarem atentos para suas consciências agora, pois Deus poderia fazer de suas camas seus túmulos. Eles deveriam fazer amizade com suas consciências agora, pois “a consciência […] ou é o maior amigo ou é o maior inimigo do mundo”.

Com a ajuda do Espírito, sendo iluminada por ele, a consciência prevalece contra o homem para que ele siga inteiramente sua consciência e para exercer a função de Deus contra ele. Ao colocar a consciência acusadora no homem, a intenção de Deus sempre foi triunfar sobre ela por meio de Cristo, que, pelo seu Espírito, expurga a consciência, lavando-a em seu próprio sangue e, assim, ela é finalmente pacificada.

A Convicção do Pecado e a Santificação

Em Sibbes, a fé não pressupõe a segurança pessoal, mas é fundamentalmente antitética a ela e está sempre se guardando dela. Ele ensinava que a “segurança” é um estado perigoso porque é o estado em que o crente deixa de prestar atenção na consciência. Uma segurança que pode livrar-se da consciência não é para este mundo; em vez disso, a consciência tem um papel não somente na conversão, mas também na santificação, exigindo que o cristão dê atenção à sua consciência.

Sibbes defendia esse papel contínuo da consciência por dois motivos. O primeiro motivo é que a consciência é importante: “todo homem deve seguir a maioria dos ditames da própria consciência, depois de informada, porque a consciência é o delegado de Deus em nós e, abaixo de Deus, ela é quem deve ser mais estimada. Quem peca contra a consciência peca contra Deus em sua própria constituição. O segundo motivo é que a consciência é delicada e pode ser reprimida ou deturpada. Ele advertia seus ouvintes: “alguns de vocês, por anseios de grandeza, pelo medo de perder ou pela esperança de avançar, deturpam a consciência e fazem qualquer coisa”. Portanto, tanto por sua importância como por sua delicadeza, a consciência deveria ser cuidadosamente examinada. A falta de paz na consciência de um cristão provavelmente indica uma culpa que precisa ser examinada; a “paz de consciência está acima de tudo de bom que se pode desejar”. Portanto, Sibbes aconselhou um amigo separatista que estava sofrendo com a consciência aflita: “Meu desejo sincero é que você, diligentemente, examine o livro de sua consciência, perscrute seu coração e sua vida; todos os dias antes de dormir, separe um tempo para lembrar e meditar”. Em vez de negligenciarmos o dever da contabilidade espiritual, Sibbes sugeriu que “o exame das nossas consciências e dos nossos caminhos nos forçará a viver pela fé todos os dias em Cristo Jesus”, quando nos dermos conta da grandeza de nossa necessidade e da provisão dele.


Autor: Mark Dever

Mark Dever é diretor do Ministério 9 Marcas, nos Estados Unidos, e pastor da Igreja Batista de Capitol Hill, em Washington D.C. Graduado na Universidade de Duke, obteve mestrado em Divindade no Gordon Conwell Theological Seminary e Ph.D. em História Eclesiástica na Universidade de Cambridge.

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