O texto abaixo foi extraído do livro Vocábulos de Deus, de J. I. Packer, da Editora Fiel.
Uma das mais tristes experiências para uma esposa ou um esposo é um parto de um natimorto, que é o aborto. Com frequência, há um momento de expectativa quando um bebê nasce e todos esperam que ele chore e agite os seus membros, então, mame o leite materno, mostrando estar bem vivo. Por igual modo, nem toda alma “agitada” torna-se uma alma espiritualmente nascida e viva. A prova de que a vida nova realmente começou precisa ser buscada na conduta diária da pessoa. Os sinais mediante os quais uma pessoa regenerada pode ser conhecida correspondem às ações naturais de uma criança recém-nascida.
Primeiramente, o bebê chora instintivamente. A pessoa regenerada ora instintivamente, clamando a Deus em atitude de dependência, esperança e confiança, como um filho faz com seu pai. O evangelho que ela recebeu, ao qual reagiu ao receber a Cristo como seu Salvador e Senhor, promete-lhe a adoção na família de Deus (Gl 4.4, 5). Agora, faz parte de sua natureza tratar Deus como seu Pai, trazendo a Ele todas as suas necessidades e desejos. Nós, os crentes, os regenerados, temos
recebido o Espírito de filiação, “baseados no qual clamamos: Aba, Pai” (Rm 8.15). As orações do novo crente são honestas e do fundo do coração, tal como sempre são todos os pedidos de ajuda dos infantes. E, embora as suas orações possam tornar-se mais intensas, à medida em que o crente vai amadurecendo, elas nunca deixam de ser a atividade mais natural na qual ele se ocupa. Olhar constantemente para Deus, como seu Pai celeste e conversar com Ele de todo coração é um sinal de que a pessoa foi regenerada.
Em segundo lugar, o bebê mama instintivamente. A pessoa regenerada também sente fome pelo alimento espiritual – primeiramente o leite, e, então, a carne da Palavra revelada de Deus (1Pe 2.2; Hb 5.12-14; 1Co 3.2). Ela ouve a Palavra pregada, ensinada e exposta; ela lê a sua Bíblia, bem como os livros que lançam luz sobre a Bíblia; ela faz perguntas acerca da Bíblia, memoriza-a, medita nela, esforçando-se por extrair dela tudo quanto for bom. “Quanto amo a tua lei! É a minha meditação todo o dia… Quão doces são as tuas palavras ao meu paladar! Mais que o mel à minha boca” (Sl 119.97, 103). Anelar constantemente pela Palavra de Deus e desejar aprofundar-se nela, portanto, é o segundo sinal de que a pessoa foi regenerada.
Em terceiro lugar, o bebê se movimenta, virando a cabeça, flexionando os membros, e, mais tarde, rolando, engatinhando, cambaleando, dando os primeiros passos, explorando. De modo semelhante, a pessoa regenerada movimenta-se na esfera espiritual, na qual penetrou, selecionando prioridades, remodelando a própria vida à luz de sua nova lealdade, explorando as relações cristãs e os modos de adoração, usando sua iniciativa para o Senhor, em vários tipos de serviço e testemunho. Um terceiro sinal de que alguém foi regenerado, portanto, é mostrar-se constantemente “zeloso de boas obras” (Tt 2.14) e estar procurando e tentando fazer mais e mais para o reino de Deus.
Em quarto lugar, o bebê descansa, relaxando completamente e dormindo profundamente nos braços de uma pessoa adulta, ou onde quer que se sinta seguro. Por semelhante modo, a pessoa descansa na certeza de que os braços eternos de Deus a estão protegendo, sendo capaz de passar os seus dias sem importar as pressões que venham sobre ela sem pânico e em paz. “Como a criança desmamada se aquieta nos braços de sua mãe, como essa criança é a minha alma para comigo” (Sl 131.2). “Aos seus amados ele o dá [o pão] enquanto dormem” (Sl 127.2). Viver constantemente em tranquilo contentamento, interessado apenas em ser fiel e obediente, permitindo que Deus controle o resultado, é o quarto sinal de que uma pessoa foi regenerada. Jesus ensinou que ser semelhante a uma criança perante Deus expressando confiança, receptividade e dependência singulares é a única atitude mediante a qual entramos no reino de Deus e vivemos a vida do reino (Mt 18.3, 4). É claro que essa atitude de ser semelhante a uma criança (que não deve ser confundida com infantilidade, algo muito menos admirável) é vista nos quatro sinais da pessoa regenerada, conforme acabamos de investigar. Também é patente que essa quádrupla disposição é a raiz da qual crescem aqueles frutos da regeneração, salientados por João: a docilidade diante de Deus, que apreende e mantém a fé apostólica em Cristo; a preocupação por agradar a Deus, que se expressa no renunciar ao pecado e no praticar a retidão; e a apreciação pelo amor salvífico de Deus, que gera o amor abnegado por nossos irmãos na fé, um reflexo do amor divino. Ser semelhante a uma criança perante Deus é exatamente o que está envolvido na regeneração, visto que o evangelho a reivindica e é, nem mais nem menos, a obra de Deus em nossos corações, levando-nos a aceitar o evangelho de todo o coração. Se ao menos Deus nos tornasse simples o bastante para vermos isso e, tendo-o visto, nunca mais o perdermos de vista! Então o mundo cristão seria um lugar bem diferente.