quarta-feira, 1 de maio

Sim, a leitura da palavra realmente muda as pessoas

Eu cresci em uma igreja evangélica típica dos anos 60 e 70. Precisamente, era a Primeira Igreja Batista de Dominguez, uma igreja batista missionária, que ficava entre Carson e Long Beach, na Califórnia. Era uma igreja que cria na bíblia, que pregava o evangelho, que fazia apelos e de conexões denominacionais com diversas igrejas no sul e nos vales centrais da Califórnia, ricos em fazendas. Essas congregações, inicialmente, consistiam de famílias que fugiram do Dust Bowl1 e das dificuldades da Grande Depressão, para recomeçar no oeste do país. Nossa igreja era boa, centrada no evangelho, fiel, assim como suas igrejas irmãs. 

Mesmo assim, eu não me lembro de alguma vez ouvir a Escritura ser lida durante os cultos, tirando os poucos versículos em que a pregação era baseada.

A NEGLIGÊNCIA EVANGÉLICA 

O que era realidade na minha igreja de bairro, também era para todas as grandes igrejas evangélicas do sul da Califórnia que eu visitei uma vez ou outra durante minha adolescência e início da juventude: Swindoll’s Evangelical Free Church of Fullerton, Chuck Smith’s Calvary Chapel, Ray Ortlund’s Lake Avenue Congregational, David Hocking’s Grace Brethren of Long Beach, MacArthur’s Grace Community Church e Lloyd John Ogilvie’s 1st Presbyterian Church of Hollywood. A leitura substancial da Bíblia simplesmente não era uma característica presente nas igrejas evangélicas daquela época e lugar. Também suspeito que ainda não seja uma característica das igrejas evangélicas de hoje. 

O CONTRASTE ANGLICANO 

Eu passei dois anos frequentando a Trinity, uma faculdade teológica anglicana, em Bristol, na Inglaterra. Isso significava frequentar uma infinidade de igrejas anglicanas locais: igrejas baixas2, altas3, liberais e conservadoras. Contudo, todas elas tinham algo em comum: o Livro de Oração e a leitura substancial da Bíblia, como mandado pelo lecionário4. Essas leituras percorriam toda a Escritura: Antigo Testamento, Epístolas do Novo Testamento, Evangelhos e Salmos. 

A ironia era grande e continua a ser.

De modo geral, os evangélicos dos Estados Unidos não leem a Bíblia em seus cultos públicos. Já os anglicanos, mesmo com alguns membros que são céticos liberais, que pouco acreditam na inerrância, têm essa prática de leitura. Estranho. 

Por que as igrejas evangélicas não leem a Bíblia? Só consigo chegar a uma conclusão: elas não acham que é importante. Em seus cultos, um tempo considerável é dedicado a canções, pregação, avisos e até conversas informais. Entretanto, a leitura da Escritura é omitida, tirando os versículos que farão parte da pregação. Por quê? Eu repito: as igrejas parecem não dar a devida importância a essa prática. Elas não veem seu valor. Pode ser que seja ou é provável que seja enfadonho. E assim, igrejas evangélicas bíblicas, que defendem a inerrância, não dão valor suficiente à simples leitura da Bíblia para dar-lhe um lugar em seus cultos públicos.

O AUTOTESTEMUNHO DAS ESCRITURAS

Em “Adoração Reformada: Adoração Segundo As Escrituras”, eu dou exemplos de pessoas que foram transformadas pela simples leitura pública das Escrituras, incluindo J. C. Ryle (1816-1900). Contudo, os evangélicos não devem exigir testemunhos anedóticos do poder transformador da leitura da Escritura. Afinal, nós temos seu autotestemunho. Não nos dizem que nascemos de novo pela “palavra viva e permanente”? Não chegamos à fé por “ouvir a palavra de Cristo”? Não crescemos pelo “leite puro da Palavra de Deus”? Não somos santificados pela verdade da Palavra de Deus? A Palavra de graça não é capaz de nos edificar e de nos dar uma herança eterna? A Palavra da verdade do evangelho não está constantemente dando frutos e crescendo? A Palavra de Deus não é viva e ativa e mais afiada do que uma espada de dois gumes? O evangelho não é o poder de Deus para a salvação? Eu poderia continuar (1Pe 1.23-25; Rm 10.17; 1Pe 2.2; Jo 17.17; At 20.32; Cl 1.6; Hb 4.12; Rm 1.16; cf Ef 6.1; 1Ts 2.13; 2Tm 3:15; Jr 23.29; Is 55.11; 1Ts 1.5; Tg 1.21). 

MEU PONTO DE VIRADA

O momento decisivo, para mim, veio em uma noite tempestuosa no outono de 1977. Eu e vários estudantes da Trinity caminhamos de Bristol Downs até a igreja paroquial St. Mary ‘s Redcliff, uma congregação anglicana conservadora. Quando estávamos por volta da metade do culto, um homem se levantou para a leitura do Antigo Testamento, no profeta Isaías. Ele leu devagar, de forma cuidadosa e com ênfase. O efeito foi poderoso. Não, foi dinâmico. 

Então a ironia me atingiu. Comecei a me perguntar: “Por que nós evangélicos não incluímos lectio continua das Escrituras (uma histórica prática Reformada) em nossas igrejas?”. É claro que essa leitura pode ser enfadonha. Mas qualquer elemento da liturgia pode ser mal administrado. É por isso que devemos ter o cuidado de ler a Escritura com certa habilidade. O leitor deve estar familiarizado com o texto de modo que consiga ler com uma boa tonalidade e dinamismo. Mesmo assim, sejamos francos – o medo de entediar a congregação é uma desculpa esfarrapada para não fazer a leitura das Escrituras. 

CONCLUSÃO 

Se nós acreditamos no autotestemunho das Escrituras, não podemos perpetuar a negligência da leitura substancial e sistemática da Bíblia nos cultos públicos da igreja. É um dos apenas cinco itens identificados na Confissão de Fé de Westminster (XXI.3-5) e suas confissões irmãs (Londres, Sabóia) como elementos necessários de um culto regulado pela Palavra de Deus. O documento irmão da Assembléia de Westminster, o Diretório para o Culto Público a Deus, recomenda um capítulo de cada testamento em cada um dos dois cultos dominicais. 

Pelo menos um capítulo seria um bom lugar para começar.

 

1 N. do tradutor: fenômeno climático de tempestade de areia que ocorreu nos Estados Unidos durante quase dez anos.
2 N. do tradutor: mais próximas ao protestantismo.
3 N. do tradutor: mais próximas ao catolicismo.
4 N. do tradutor: livro que contém as leituras recomendadas para os cultos.

Por: Terry Johnson. ©️ 9Marks. Website: 9marks.org. Traduzido com permissão. Fonte: Yes, Scripture Reading Really Does Change People
©️ Ministério Fiel. Website: ministériofiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradutor: Luise Massa Santos. Editor: Vinicius Lima. Revisor: Pedro Henrique Lima de Oliveira.


Autor: Terry L. Johnson

Rev. Terry L. Johnson é ministro sênior da Igreja Presbiteriana Independente em Savannah, GA. Ele é o autor de The Case for Traditional Protestantism and Reformed Worship.

Parceiro: 9Marks

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