terça-feira, 24 de dezembro
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Uma introdução à pregação e à teologia bíblica (parte 1)

Diagnóstico – O Problema com Grande Parte da Pregação de Hoje

Na associação de igrejas à qual eu pertenço – a Southern Baptist Convention [Convenção Batista do Sul] -, a batalha pela inerrância da Escritura pode ter sido ganha. Entretanto, nem nós nem outras denominações ou igrejas evangélicas que ganharam batalhas semelhantes deveríamos nos congratular tão rapidamente. Isso porque muitas igrejas conservadoras podem abraçar a inerrância da Escritura, mas, ainda assim, negar na prática a suficiência da Palavra de Deus. Nós podemos dizer que a Escritura é a palavra inerrante de Deus, mas, ainda assim, falhar em proclamá-la seriamente de nossos púlpitos.

Existe, na verdade, uma fome pela palavra de Deus em muitas igrejas evangélicas hoje. Algumas séries de sermões fazem, em seus títulos, referências a programas de TV tais como Gilligan’s Island, Bonanza e Mary Tyler Moore. A pregação, com frequência, foca em passos para um casamento bem-sucedido ou em como criar filhos em nossa cultura. Sermões sobre questões familiares, obviamente, são adequados e necessários, mas dois problemas frequentemente aparecem. Primeiro, o que as Escrituras de fato ensinam acerca desses assuntos é frequentemente negligenciado. Quantos sermões sobre casamento apresentam com fidelidade e urgência o que Paulo de fato ensina sobre os papeis do homem e da mulher (Ef 5.22-23)? Ou acaso nós estamos constrangidos pelo que as Escrituras ensinam?

Segundo, e talvez mais sério, tais sermões são quase sempre pregados no nível horizontal. Eles se tornam o centro da vida semanal da congregação, e a cosmovisão teológica que permeia a Palavra de Deus e provê o fundamento para toda a vida é simplesmente ignorada. Nossos pastores se tornam moralistas como Dear Abby, dando conselhos sobre como viver uma vida feliz semana após semana.

Muitas congregações não percebem o que está acontecendo porque a vida moral que tal pregação promove está de acordo, ao menos em parte, com a Escritura. Ela vai ao encontro das necessidades sentidas tanto por crentes como por incrédulos.

Pastores também creem que devem preencher seus sermões com histórias e ilustrações, de modo que as anedotas enfatizem o ensino moral apresentado. Todo bom pregador usará ilustrações. Todavia, sermões podem se tornar tão repletos de histórias que acabam desprovidos de qualquer teologia.

Eu tenho ouvido evangélicos afirmarem com certa frequência que as igrejas evangélicas estão indo bem em teologia porque as congregações não estão reclamando daquilo que lhes é ensinado. Tal comentário é completamente assustador. Nós, como pastores, temos a responsabilidade de proclamar “todo o desígnio de Deus” (At 20.27). Nós não podemos pôr a nossa confiança em pesquisas de opinião congregacionais para determinar se nós estamos cumprindo o nosso chamado. Nós devemos pôr a nossa confiança naquilo que as Escrituras exigem. Pode ser que uma congregação jamais tenha sido seriamente ensinada na Palavra de Deus, de modo que os crentes não percebem onde nós estamos falhando como pastores.

Paulo nos alerta que “entre vós penetrarão lobos vorazes, que não pouparão o rebanho” (At 20.29). E, em outro lugar, ele afirma que “haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas” (2Tm 4.3-4). Se nós avaliamos nossa pregação pelo que as congregações desejam, nós podemos estar dando espaço para as heresias. Eu não estou dizendo que nossas congregações são heréticas, mas apenas que o teste para a fidelidade é a Palavra de Deus, e não a opinião popular. O chamado dos pastores é para alimentar o rebanho com a Palavra de Deus, não para agradar as pessoas com o que elas desejam ouvir.

Muito frequentemente, nossas congregações são treinadas de modo pobre por aqueles de nós que pregam. Considere o que acontece quando alimentamos uma congregação com uma dieta constante de pregação moralista. Eles podem aprender a ser gentis, perdoadores, amorosos, bons maridos ou esposas (tudo isso é bom, obviamente!). Os seus corações podem ser aquecidos e até edificados. Mas, à medida que o fundamento teológico é negligenciado, o lobo da heresia passa a espreitar cada vez mais de perto. Como? Não que o próprio pastor seja um herege. Ele pode ser completamente ortodoxo e fiel em sua própria teologia. No entanto, ele presume a teologia em toda a sua pregação e, assim, torna-se negligente em pregar ao seu povo o enredo e a teologia da Bíblia. Em uma ou duas gerações, portanto, a congregação pode, desavisadamente e por ignorância, chamar um pastor mais liberal. Esse novo pastor também pregará que as pessoas devem ser boas, gentis e amorosas. Ele também enfatizará a importância de bons casamentos e relacionamentos dinâmicos. As pessoas nos bancos podem nem sequer discernir a diferença, uma vez que a teologia parece exatamente igual à do pastor conservador que o precedeu. E, em um sentido, ela o é, pois o pastor conservador nunca proclamou ou pregou a sua teologia. O pastor conservador cria na inerrância da Escritura, mas não em sua suficiência, pois ele deixou de proclamar tudo o que as Escrituras ensinam à sua congregação.

Nossa ignorância acerca da teologia constantemente se evidencia. Não saem da minha mente duas ocasiões nos últimos dez anos (uma em um grande estádio, por um pregador cujo nome não lembro) em que um pregador convidava as pessoas para virem à frente. O sermão no estádio pretendia ser um sermão evangelístico, mas eu posso honestamente dizer que o evangelho não foi pregado de modo algum. Nada foi dito acerca de Cristo crucificado e ressurreto, ou por que ele foi crucificado e ressurreto. Nada foi dito sobre por que a fé salva, e não as obras. Milhares vieram à frente e foram, sem dúvida, contados como salvos. Mas eu coçava minha cabeça e indagava o que de fato estava acontecendo. Eu orei para que ao menos alguns fossem verdadeiramente convertidos, talvez porque eles já conhecessem o conteúdo do evangelho de ouvi-lo em outras ocasiões. O mesmo aconteceu no culto de uma igreja que eu visitava. O pregador prolongou-se em um inspirado convite para que os ouvintes “viessem à frente” e “fossem salvos”, mas ele não deu qualquer explicação acerca do evangelho!

Tal pregação pode encher nossas igrejas de pessoas não convertidas, as quais são duplamente perigosas: elas foram asseguradas por seus pastores de que são convertidas e de que nunca podem perder a sua salvação, mas ainda estão perdidas. Então, daquele dia em diante, essas mesmas pessoas são exortadas, semana após semana, com o nosso novo evangelho para esses tempos pós-modernos: sejam legais.


Autor: Thomas R. Schreiner

Thomas R. Schreiner serve como pastor de pregação na Clifton Baptist Church em Louisville, Kentucky. Ele é também professor de Novo Testamento no Southern Baptist Theological Seminary e escreveu Romans (Baker, 1998) e Paul, Apostle of God’s Glory in Christ: A Pauline Theology (InterVarsity, 2001), entre muitos outros títulos.

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