Muitos hoje expressam surpresa quando ouvem o nome de Asahel Nettleton, o último grande evangelista que expôs as Doutrinas da Graça. Embora Nettleton (1783-1844) tenha visto trinta mil pessoas convertidas durante um ministério ativo de dez anos no início do século XIX, seu legado sofre de trágica negligência, talvez até de menosprezo, nas mãos dos historiadores eclesiásticos contemporâneos.
Por outro lado, Charles G. Finney (1792-1875) tem sido objeto de extensiva abordagem biográfica. Considerado o pai do avivalismo moderno, Charles Finney representa o marco divisor na mudança do calvinismo para o arminianismo como a teologia predominante no evangelismo. Conservadores gostam muito de Charles Finney por causa de seu zelo evangelístico, e liberais se referem com orgulho ao envolvimento de Finney na reforma social. Mark A. Noll considera Charles Finney “a figura crucial no evangelicalismo dos norte-americanos brancos, depois de Jonathan Edwards”, tendo impacto mais duradouro do que Ralph Waldo Emerson, Daniel Webster e Horace Mann, na vida da nação emergente.
O legado de Charles Finney moldou, em muitos aspectos, a teologia e a metodologia do evangelismo, em especial o evangelismo dos batistas do Sul. A publicação das obras mais importantes de Finney, Lectures on Revivals of Religion (Palestras em Avivamentos da Religião) e Lectures on Systematic Theology (Palestras em Teologia Sistemática), causaram um impacto no evangelismo que se estende até aos nossos dias. A ênfase dos batistas do Sul nas cruzadas simultâneas, na preparação das cruzadas e no sistema de apelo público e a utilização de reuniões de avivamento como estratégia podem ser atribuídas à considerável influência de Charles Finney sobre o evangelicalismo de seus dias.
Este artigo afirma o ponto de vista de que a crença de uma denominação, uma igreja ou uma pessoa a respeito da salvação está diretamente relacionada ao evangelismo que elas praticam. A soteriologia molda a metodologia de evangelismo. O pressuposto é que a sã doutrina da salvação deve produzir uma prática correta de evangelismo.
O avivalismo de Asahel Nettleton — centralizado em Deus
Seguindo a linha teológica de Jonathan Edwards, que enfatizava a responsabilidade humana na perspectiva calvinista sobre o mundo, Asahel Nettleton representava o aprimorado calvinismo da Nova Inglaterra de seus dias. Enquanto se apegava firmemente a cada um dos artigos do Sínodo de Dort (também conhecidos como os Cinco Pontos do Calvinismo), conforme o entenderam os teólogos que o antecederam na Nova Inglaterra (Jonathan Edwards, Joseph Bellamy e Timothy Dwight), Asahel Nettleton acreditava, antes e acima de tudo, que seu sistema de doutrina era fiel à verdadeira revelação bíblica.
As crenças de Asahel Nettleton podem ser resumidas nas seguintes afirmações. O homem, sendo totalmente depravado em sua natureza e escolha, não pode salvar a si mesmo. Pela graça de Deus, alguns foram escolhidos para a vida eterna. Para os eleitos por Deus, o Senhor Jesus realizou uma expiação penal e vicária em favor dos pecados deles, na cruz. O eleito, por quem Jesus morreu, será atraído pela triunfante graça de Deus ao arrependimento e à fé salvadora em Cristo. Eles serão preservados por Deus para a salvação eterna.
Os seres humanos têm de ser regenerados por Deus e precisam ter sua natureza humana transformada, antes que se arrependam e confiem em Cristo para a salvação. Na teologia de Nettleton, a capacidade humana de reagir em cada etapa da salvação provém de um ato soberano de Deus. A menos que Deus o impulsione, o homem permanecerá desesperadamente perdido.
A metodologia de Nettleton correspondia perfeitamente à sua teologia. Ele utilizava a pregação como meio de trazer os pecadores à convicção de seus pecados. Nettleton regava todos os seus esforços evangelísticos com ardente e humilde oração a Deus, o único que podia regenerar uma pessoa perdida. Aos despertados, que respondiam à chamada para se reunirem fora dos cultos normais, Nettleton oferecia reuniões de inquirição, que eram essencialmente sessões de aconselhamento evangelístico em grupo. Nestas reuniões, as pessoas podiam receber ajuda pessoal sem a pressão pública de oferecerem uma resposta positiva.
Poucos homens chegaram ao nível de perspicácia que Nettleton demonstrou no evangelismo pessoal. Ele era um habilidoso cirurgião da alma. Instava com aqueles que se sentiam despertados a colocarem o assunto da salvação de sua alma diante de Deus, em particular. Muitos vieram à fé salvadora em Cristo como resultado do ministério de Nettleton nos “lugares ermos”, em igrejas de todos os tipos e tamanhos. Poucos dos convertidos de Nettleton abandonaram sua confissão, retornando ao mundo.
O avivalismo de Charles Finney — centralizado no homem
Nos primeiros dias de sua mocidade, Charles G. Finney decidiu reagir contra o que acreditava ser os resultados do evangelismo deficiente do calvinismo exposto por homens como Asahel Nettleton. Acreditando ser ele mesmo um corretivo para a excessiva ênfase na soberania divina, Finney enfatizava a responsabilidade dos homens como agentes livres e possuidores de moralidade.
Finney havia sido treinado como advogado e, infelizmente, não possuía educação teológica formal; por isso, ao ler as Escrituras, ele ficou persuadido de uma salvação em termos de uma filosofia de legalismo e moralidade. Tal mentalidade exigia que os responsáveis por obedecerem à lei tinham de ser livres para obedecer. Enquanto Nettleton enfatizava a liberdade de Deus, Finney decidiu enfatizar a liberdade do homem.
Finney acreditava que os seres humanos eram depravados em sua vontade e não em sua constituição; a eleição para a salvação resultou do conhecimento antecipado da resposta dos homens ao convite do evangelho; a expiação realizada por Jesus não pagou a dívida do pecado de ninguém, como um substituto penal; pelo contrário, a expiação apenas permitiu que Deus perdoasse pecadores, sem violar sua própria natureza e lei.
Michael Horton resumiu com exatidão as crenças de Finney: “Deus não é soberano; o homem não é pecador por natureza; a expiação não é o verdadeiro pagamento do pecado; a justificação, por imputação, é um insulto à razão e à moralidade. O novo nascimento é simplesmente o resultado de técnicas bem-sucedidas. E o avivamento é o resultado natural de campanhas inteligentes”.
Visto que os seres humanos são agentes morais livres, Finney acreditava que eles podiam rejeitar a graça de Deus. Mesmo depois de arrepender-se e professar a fé em Cristo, a salvação final de uma pessoa permanecia incerta, dependente de sua obediência até à morte”.
A teologia de Finney o levou a perceber que somente um inimigo, a vontade obstinada, impedia a salvação de todas as pessoas. Os métodos que Finney empregava eram avaliados com base em sua eficácia de quebrar a vontade obstinada dos pecadores. Este pragmatismo dominou o ministério de Finney. Servindo-se de um amálgama de métodos que já estavam em uso, ele revolucionou o evangelismo e fez surgir o avivalismo moderno. Finney popularizou uma forma mais dramática de pregar, utilizou a oração pública como uma ferramenta para se pressionar os pecadores, permitiu que mulheres orassem em reuniões mistas, denunciou oponentes, mudou a tradição aceita nas reuniões de inquirição, organizou as reuniões de oração de grupos pequenos e equipes de visitação às casas, fez surgir as campanhas evangelísticas e preparou o caminho para o que mais tarde se tornaria o sistema de apelos públicos. Estas novas medidas causaram grande controvérsia, mas também são reportadas como o meio para trazer aproximadamente 500.000 pessoas ao despertamento.
Aplicações ao evangelismo contemporâneo
Estas descobertas são aplicáveis ao evangelismo moderno em dois níveis. Primeiro, que princípios podemos aprender desse estudo? Segundo, que homem pode oferecer melhor exemplo ao futuro do evangelismo, Nettleton ou Finney?
No que se refere aos métodos, os dois podem nos oferecer um excelente ponto de partida quanto às aplicações. Se a pregação for marcada por paixão, fidelidade às Escrituras, aplicação pessoal pertinente, apresentação clara e poder espiritual, o evangelismo será aprimorado. Se ministros do evangelho e membros de igreja assumirem o empenho de orar como o fizeram Nettleton, Finney e seus cooperadores em avivamentos, o evangelismo será revolucionado. Eles não somente praticaram a oração pessoal, mas também organizaram a oração das igrejas em preparação para avivamentos. Se os interessados forem corretamente aconselhados e não forem publicamente pressionados a tomarem decisões prematuras (e, conseqüentemente, espúrias), os resultados do evangelismo serão preservados em um grau mais elevado. Se os ministros do evangelho e membros de igreja praticassem evangelismo pessoal teologicamente correto, as igrejas seriam transformadas pela infusão de uma nova vida espiritual.
Se considerarmos esses dois homens do passado como exemplo para o futuro do evangelismo, qual deles se tornaria o exemplo mais desejável? Duas razões me levam a escolher Nettleton: a) o legado de Finney não pode resistir a uma avaliação rigorosa; b) quanto mais consideramos o legado de Nettleton, tanto mais claramente enxergamos um quadro de equilíbrio doutrinário.
O legado de Charles Finney tem sido questionado há muito tempo. Alvin L. Reid, professor de evangelismo do Seminário Batista do Sul, fez a seguinte observação:
Finney recebeu o crédito por haver produzido o ímpeto que causou a mudança da obra de Deus para a obra de homens, no avivamento e no despertamento espiritual…. O convite público, as reuniões prolongadas (hoje chamadas “cultos de avivamento” ou apenas “avivamentos”) e a preparação para tais reuniões podem, em grande medida, ter sua origem em Charles Finney. Ele tem sido elogiado e condenado por esta mudança. Ao avaliarmos Finney, temos de lembrar que ele estava reagindo ao calvinismo frio, inerte e extremo de seus dias.
Muitos dos milhares que foram tocados pelo ministério de Charles Finney retornaram ao mundo, depois que desapareceu a influência local do evangelista carismático. B. B. Warfield advertiu que “grande proporção daqueles que foram introduzidos nas igrejas, pela excitação do avivamento, não eram verdadeiramente convertidos, conforme demonstra claramente a história subseqüente de suas vidas”.
A fim de que ninguém rejeite Warfield como um calvinista de Princeton e inimigo de Finney, os testemunhos dos amigos e colaboradores de Finney, James Boyle e Asa Mahan, oferecem evidências adicionais de que o trabalho de Finney precisa ser visto com bastante reserva e suspeita. James E. Johnson admitiu que esses testemunhos dão crédito “à acusação de que muitas pessoas introduzidas nas igrejas pela excitação das reuniões de avivamento nunca experimentaram realmente uma mudança de coração”. Boyle escreve a Finney, em 1834:
Consideremos os campos onde eu, você e outros trabalhamos como ministros de avivamento, e qual é o estado moral de tais campos hoje? Qual era o estado deles alguns meses depois que os deixamos? Visitei diversas vezes alguns desses campos e gemi, em espírito, ao ver o estado infeliz, carnal, gélido e contencioso em que as igrejas caíram — e caíram logo depois que partimos de entre elas.
Em sua autobiografia, Mahan escreveu que muitas pessoas supostamente convertidas nos avivamentos, os pastores que organizavam as reuniões e até os evangelistas que dirigiam as mesmas subseqüentemente sofreram tanto moral como espiritualmente. Ele disse:
Eu estava pessoalmente familiarizado com todos eles. Não posso recordar um homem sequer, exceto o irmão Finney e o pai Nash, que poucos anos depois de nossa partida não tenha perdido sua unção, tornando-se igualmente desqualificado para o ofício de evangelista e de pastor.
Entre os evangélicos, Michael S. Horton tem liderado, com vigor, ataques ao legado de Charles G. Finney. Horton retrata Finney como o pai espiritual do movimento de crescimento de igrejas, do pentecostalismo e do avivalismo político. Ele acusa Finney (utilizando as palavras do próprio Finney) de negar estas doutrinas cardeais: o pecado original, a substituição penal como o motivo da expiação e a natureza divina do novo nascimento.
Visto que Finney repudiou muitos dos dogmas da fé cristã histórica, Horton o chamou “não somente de inimigo do protestantismo evangélico, mas também do cristianismo histórico”. Horton admitiu que Finney estava certo em um ponto: “O evangelho afirmado pelos teólogos de Westminster, que Finney atacou diretamente e, de fato, o evangelho afirmado pela maioria dos evangélicos é ‘outro evangelho’, em distinção ao evangelho proclamado por Finney”. Horton faz uma pergunta embaraçadora aos evangélicos que, inconscientemente, em nome do sucesso no evangelismo, têm colocado Finney em um pedestal de herói: “Ao lado de qual desses evangelhos você se colocará?”
Monte Wilson vincula corretamente Finney às mudanças no evangelismo e percebe que a estimativa incorreta de Finney a respeito da natureza humana é a raiz de sua crença no fato de que “avivamentos podem ser planejados, promovidos, propagados pelo homem”. A tendência moderna de confiar em técnicas de preparação para avivamentos pode ser atribuída a uma adoção desta falsa premissa de Finney. Quando o evangelismo é avaliado somente com base nos resultados, a responsabilidade desta avaliação tem de ser atribuída a Finney. Quando ministros do evangelho que não produzem os números apropriados de membros são vergonhosamente demitidos de seu púlpito, o observador prudente vê, por trás da tragédia, uma das máximas de Finney — “um ministro sábio será bem-sucedido”. Finney acreditava que, se todos os ministros do evangelho seguissem seu exemplo, o avivamento varreria a terra, introduzindo o milênio. Somente uma década depois da publicação de seu livro sobre avivamento — Lectures on Revivals of Religion(Palestras em Avivamentos da Religião), Finney queixou-se de que os avivamentos haviam diminuído, tanto em quantidade como em qualidade. Wilson comentou com exatidão: “Avaliados pelos padrões do próprio Finney, seus ensinos a respeito da maneira de produzir convertidos e avivamentos, bem como as pressuposições que fundamentavam tais ensinos se comprovaram errados”. Somente a eternidade revelará quantas das pessoas que começavam a experimentar verdadeira convicção de pecado nos avivamentos de Finney foram impelidos a tomar uma decisão espúria de salvação, arriscando assim a sua alma eterna.
Finney se tornou um grande catalisador na mudança da teologia que fundamenta o evangelismo. Visto que o arminianismo suplantou o calvinismo, o homem substituiu a Deus como centro da teologia de evangelismo. Robert H. Lescelius afirmou corretamente que, “desde aquela época, o arminianismo tem predominado no evangelicalismo americano”.
A teologia e o ministério de Finney foram construídos sobre a falsa premissa de que o calvinismo prejudica o evangelismo. Dois anos antes de Charles Finney ser batizado, sessenta e quatro pessoas haviam se convertido na mesma igreja. Finney chegou à fé em Cristo em meio a um avivamento regional, durante uma época em que o calvinismo dominava a atmosfera teológica.
A premissa permanece tão falsa hoje quanto o era nos dias de Charles Finney. Um contemporâneo de Finney na Inglaterra, o pregador batista Charles Haddon Spurgeon, edificou uma grande igreja e estava comprometido com a soteriologia reformada. O fenomenal e popular treinamento de evangelismo chamado Evangelismo Explosivo foi criado por um pastor presbiteriano, D. James Kennedy, cuja igreja continua a crescer fundamentada em uma teologia reformada. O autor e pregador John MacArthur Jr. pastoreia uma igreja próspera e mantém pontos de vista reformados. Ninguém pode defender com sucesso a premissa de que assumir uma posição arminiana na soteriologia significa tornar-se mais evangelístico do que uma igreja que mantém uma teologia reformada.
O legado de Charles Finney tem de ser considerado tão perigoso por causa da natureza antropológica de sua teologia e dos métodos resultantes dessa teologia. Em seu esforço de combater o que ele via como uma forma extrema de calvinismo, Finney alterou desordenadamente a balança, ou seja, mudou o agir de Deus para o agir do homem na salvação. O evangelismo de Finney carecia do primeiro ponto do evangelho — uma transformação divina dos seres humanos, de pecadores a santos. O avivalismo de Finney deixou como resultado igrejas que ficaram em piores condições porque se dividiram quanto às “novas medidas” ou porque demitiram ministros piedosos que não tinham as propensões evangelísticas de Finney. Todos os métodos de Finney devem ser reavaliados sob um ponto de vista crítico no que diz respeito ao seu alicerce doutrinário. Em benefício da saúde futura do evangelismo, aquilo que é proveitoso tem de ser separado do que é prejudicial, no que diz respeito ao ministério de Charles Finney.Por outro lado, Asahel Nettleton de- monstrou o potencial saudável do evangelismo fundamenta do na teologia sã. O ministério de Nettleton não prejudicou as igrejas; em vez disso, proporcionou-lhes edificação. Pastores que trabalharam ao lado de Nettleton sentiam que estavam sendo abençoados por um co-pastor. Nettleton entendia que a igreja existia antes de chegar o avivamento e que continuaria ministrando ao povo, depois que o evangelista se dirigisse a outro lugar. Ele acreditava que era muito importante manter a saúde da igreja.
Comparado com o elevado índice de abandono dos convertidos de Finney, Nettleton obteve uma marca notável na quantidade de pessoas que se mantiveram firmes, como resultado de suas reuniões. Pastores geralmente testemunhavam que, depois de mais de vinte e cinco anos, quase todos os que se haviam declarado convertidos permaneciam fiéis seguidores de Cristo.
Embora os números de Nettleton não alcancem os números de Finney, temos de perguntar quantos supostamente ganhos por Finney retornaram ao mundo. Comparado com Finney, Nettleton trabalhou em um campo geograficamente menor. Os lugares em que ele ministrou eram menos populosos. Alguém poderia indagar o que aconteceria se Nettleton tivesse ministrado nos centros populacionais visitados por Finney.
Asahel Nettleton entendia que “a teologia determina a metodologia”. Ele trabalhou conscientemente com pessoas, de um modo que honrou a ação divina que produziria conversões autênticas. O testemunho de Bennet Tyler descreveu o ministério de Nettleton como uma chuva generosa que nutria o solo ressecado e produzia fruto espiritual permanente. James Ehrhard afirmou que “muito surpreendente aos leitores modernos é a descoberta de que a tremenda eficácia de Nettleton aconteceu sem a instrumentalidade de qualquer dos métodos que os evangélicos modernos pensam ser essenciais no evangelismo”. Asahel Nettleton provou a metodologia pelo padrão das Escrituras, porque sabia que qualquer outro procedimento causaria ruína no final, não importando quão bem-sucedida parecesse tal metodologia.
O legado de Asahel Nettleton oferece um fundamento melhor para o futuro do evangelismo. Ele não estava certo porque era um calvinista; estava certo porque avaliou o certo e o errado pela revelação bíblica, em vez de fazê-lo utilizando o raciocínio humano. Nettleton acreditava que os homens são totalmente depravados em sua natureza, porque a Bíblia o afirma. Acreditava também que Deus tinha de agir inicialmente na salvação, porque Jesus declarou isso com clareza (Jo 6.44; 6.65). Nettleton cria que a expiação foi uma substituição penal, porque ele a via retratada deste modo nas Escrituras. Nettleton acreditava que as pessoas podiam ser reconciliadas com Deus tão-somente pela fé em Cristo e pelo arrependimento para com Deus, porque a Bíblia ensinava isso. Ele acreditava que os verdadeiros crentes seriam conhecidos, em última instância, pelo viver santo, porque este era um princípio bíblico.
Os batistas do Sul têm jurado sua lealdade à revelação bíblica. Eles deveriam reavaliar seu comprometimento com o evangelismo pragmático de Finney, comparando-o com as Escrituras. Descobririam que as opiniões dele a respeito da natureza humana têm de ser repudiadas. Finney estava errado no que se refere à expiação como um pagamento em favor dos pecados de ninguém, em particular. Ele acreditava que a agência humana cumpria um grande papel na salvação, um papel maior do que as Escrituras lhe permitem. Os erros de Charles Finney referentes às Escrituras produziram erros no viver diário, erros que até hoje são uma praga entre os batistas do Sul, especialmente a baixíssima taxa de retenção dos novos convertidos.
O excelente livro de J. I. Packer, A Evangelização e a Soberania de Deus, representa uma posição mais bíblica. Começando com o pressuposto de que Deus é soberano em todas as coisas e, particularmente, na salvação, Packer descreve a tensão bíblica entre a soberania de Deus e a vontade do homem como uma antinomia que tem de ser aceita. Packer adverte aqueles que enfatizam a responsabilidade humana em detrimento da soberania de Deus, afirmando que tal abordagem leva ao evangelismo “pragmático e calculado” com uma filosofia aparentada com a “lavagem cerebral”. Ele admite que tal evangelismo seria apropriado, “se o produzir convertidos”, e não a fiel proclamação da verdade, fosse a responsabilidade do crente. Packer também faz uma advertência àqueles que negligenciam a responsabilidade humana, a fim de exaltar a soberania de Deus. A tentação de tais pessoas é negligenciar a responsabilidade evangelística de todos os crentes, com base na suposição de que Deus salvará os eleitos. Packer censura essa atitude, chamando-a de apatia evangelística inescusável.
Citando o exemplo de Charles Spurgeon, que disse nunca haver tentado reconciliar amigos, J. I. Packer oferece uma perspectiva sadia e equilibrada que reconhece a dependência mútua das verdades aparentemente contraditórias. Ele aconselhou com sabedoria: “Na Bíblia, a soberania divina e a responsabilidade humana não são inimigos…. São amigos e trabalham juntos”. Isto levou Packer à seguinte conclusão: “O melhor método de evangelismo…. é aquele que torna possível a mais ampla e completa explanação das boas-novas de Cristo e de sua cruz, bem como a mais exata e perscrutadora aplicação destas boas-novas”.
Visto que os batistas do Sul professam a crença na autoridade das Escrituras, eles acreditam na depravação humana e, portanto, têm de se posicionar contra Finney, juntamente com aqueles que afirmam que os homens são pecadores e necessitam de salvação, e não de uma reforma moral auto-induzida. Os batistas do Sul crêem que a salvação procede do coração de um Deus santo, mas gracioso, que providenciou uma expiação vicária na morte de seu Filho, Jesus Cristo. Eles crêem que a salvação pode ser obtida por meio do arrependimento e da fé em Cristo, como resposta à graciosa chamada de Deus, por intermédio do poder de convencimento do Espírito Santo.
Essas crenças devem compelir os batistas do Sul a repudiarem sua associação teológica e metodológica com Charles Finney, impulsionando-os a se aproximarem do modelo fornecido por Asahel Nettleton, que incorporou a teologia e a prática sobre a qual a Convenção foi estabelecida. Finney acreditava que seus dias necessitavam de uma mudança rumo ao arminianismo, para que houvesse equilíbrio. A influência de Finney causou um mudança extrema na direção da responsabilidade humana. Os batistas do Sul precisam contra-balancear a excessiva mudança de Charles Finney em direção ao homem, atingindo novamente o equilíbrio bíblico em sua teologia e prática de evangelismo.
Em dias recentes, regozijei-me em ouvir o Dr. Timothy George afirmando ser excelente o fato de que os batistas do Sul estão abrindo novamente o diálogo a respeito destes assuntos cruciais. Conforme disse o Dr. George, é positivo que estejamos conversando sobre a doutrina da salvação nestes dias, em vez de estarmos falando sobre a ordenação de homossexuais ao ministério. Isso testemunha a certeza da autoridade bíblica em nossa família de fé. Portanto, andemos juntos, com a Bíblia e o coração abertos, tendo uma conduta controlada por Cristo, restabelecendo o equilíbrio correto entre a soberania de Deus e a responsabilidade humana, na soteriologia.