segunda-feira, 18 de novembro
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Disciplina: uma missão em benefício da redenção

O trecho abaixo foi retirado com permissão do livro Como meus pais nutriram a minha fé, de Elisabeth Elliot, Editora Fiel

Procurei mostrar que as regras e diretrizes do lar que meus pais estabeleceram, a ordem que caracterizava o lar e a nossa resposta como filhos estavam baseados no amor a Deus. O amor humano está sujeito a muitas flutuações. Ao moldar o nosso comportamento, meus pais procuraram seguir sabiamente a maneira como Deus lida com os filhos que ele ama.

“Se os seus filhos desprezarem a minha lei e não andarem nos meus juízos, se violarem os meus preceitos e não guardarem os meus mandamentos, então, punirei com vara as suas transgressões e com açoites, a sua iniquidade. Mas jamais retirarei dele a minha bondade, nem desmentirei a minha fidelidade” (Sl 89.30-33).

Nestas palavras do Senhor, achamos uma austera exigência de obediência, lado a lado com a segurança do seu imutável amor. Punição e amor não são incompatíveis. Não é difícil entender por que as duas andam necessariamente juntas. O pai que ama seu filho deseja seu crescimento em sabedoria e graça; por isso, está disposto a corrigi-lo, ainda que seja necessário usar uma vara. Há ocasiões em que não podemos ou não entenderemos por que Deus deve punir, embora não tenhamos dificuldade para entender a necessidade da execução de regras na família e da lei civil para o bem de todos. Singapura é uma das cidades mais limpas, mais bem administradas e mais livres de drogas em todo o mundo. Estampadas em grandes letras vermelhas no visto de entrada, acham-se estas palavras: PENA DE MORTE PARA TRÁFICO DE DROGAS. Funciona. Não somente protege a cidade para os cidadãos, mas também protege todo aquele que seria tentado pelo dinheiro a traficar drogas. Sua vida vale mais do que dinheiro. A lei, por- tanto, afirmada com clareza e executada consistentemente é a salvação dele. A própria cidade é, também, salva de muitos crimes.

“Visto como se não executa logo a sentença sobre a má obra, o coração dos filhos dos homens está inteiramente disposto a praticar o mal. Ainda que o pecador faça o mal cem vezes, e os dias se lhe prolonguem, eu sei com certeza que bem sucede aos que temem a Deus” (Ec 8.11-12).

Deus é amor. Sua vontade é amor. Sua lei é amor. Seu amor é sua lei. É somente uma visão rudemente distorcida de Deus e de seu amor que acha insuportável a ideia de sua disciplina. Podemos esquecer que Ele tomou sobre si a nossa punição antes mesmo da fundação do mundo? Ele era o Cordeiro que foi morto. E nos amou naquele tempo. Ele nos amou o sufi- ciente para pagar a penalidade de morte. Amaremos menos? Os que se achegam a Deus se achegam a um fogo consumidor. Esquecemo-nos disso facilmente, olhando para um vovô indulgente cujo amor, um mero senti- mento, se rende a nossos caprichos e ignora a nossa pecaminosidade. Deus não fará isso, porque fazer isso seria nos condenar. Ele não quer que nenhum seja condenado.

O Fogo Consumidor tem de fazer sua obra — queimar, purificar, refinar — porque seu objetivo é a nossa perfeição. Como o seu amor poderia querer menos do que isso? Isso é muito diferente da ideia de mera retribuição ou de “acertar as contas”.

Um livro sobre o moldar de nossa família tem de incluir o controverso assunto de castigo físico. O artigo de mamãe, “Ensinando Seu Filhinho”, apresentado na introdução, deixa claro que obediência tem de ser ensinada. Phil, o menininho teimoso na cadeira alta, entendia perfeitamente que tinha de beber seu leite. Mamãe estava determinada a que ele fizesse isso. Sua determinação resultava de amor. Ela queria o melhor para Phil. Nisso, havia duas coisas boas: era bom para ele beber seu leite e, ainda melhor, obedecer à sua mãe. O som da pequena carroça puxada por cachorro venceu seu desejo de ganhar o conflito, e ele obedeceu, tornando o castigo físico desnecessário naquela ocasião.

“Uma surra”, papai escreveu: não aplicada com ira, purificará uma atitude embirrada da parte do filho, como uma tempestade renova o ar em um dia abafado. Dá resultado mais rápido do que uma argumentação; é uma advertência para os outros filhos que estão observando; e até a criança que recebeu o castigo físico compreende, no fundo do coração, que teve o que merecia e fica, portanto, mais quieta, mais tratável e, realmente, mais feliz depois.

Quão insensato e perigoso é descartar a sabedoria dos séculos que Deus nos dá na Bíblia! Salomão disse: “A vara e a disciplina dão sabedoria, mas a criança entregue a si mesma vem a envergonhar a sua mãe […]. Corrige o teu filho, e te dará descanso, dará delícias à tua alma” (Pv 29.15, 17); “Castiga a teu filho, enquanto há esperança, mas não te excedas a ponto de matá-lo” (Pv 19.18); “Não retires da criança a disciplina, pois, se a fustigares com a vara, não morrerá. Tu a fustigarás com a vara e livrarás a sua alma do inferno” (Pv 23.13-14).

É literalmente verdadeiro que um filho corrigido “te dará descanso”. Logo depois da punição, ele parará de inquietar, reclamar e puxar a saia de sua mãe. E, quando a correção é mantida através dos anos, de acordo com as diretrizes bíblicas, ele certamente “dará delícias à tua alma”.

New Every Morning [Novas cada manhã], p. 92

Lembro-me de mamãe dizer a um ou dois de nós: “Acho que você está pedindo uma surra”. Isso foi provavelmente dito a Dave mais do que aos outros. Ele tinha uma tendência maliciosa e muitas ideias sobre como “irritar mamãe”. Ela o corrigia verbalmente, a tensão se formava, Dave ficava cada vez mais insuportável, “pedindo uma surra”, por assim dizer. A correção física restaurava a harmonia.

Tanto papai quanto mamãe eram cuidadosos em garantir que tivessem a nossa atenção quando nos davam instruções. Tanto é inútil quanto injusto dar ordens a um filho quando você não tem a atenção dele. Quem ainda não viu um pai impaciente gritar com um filho que parece estar surdo para a voz dele? Muito provavelmente o filho está acostumado a que o pai grite para ele (nós não éramos) e sabe que muitas demoras são possíveis antes que a força seja usada.

Nossos pais nos chamavam por nome. Quando os ouvíamos chamar nossos nomes, atendíamos.

Nossos pais falavam olhando-nos diretamente nos olhos. O contato direto de olhos prendia a nossa atenção.

As ordens deles eram dadas em um tom de voz normal. Certa mãe me disse que seus filhos prestavam atenção singular quando lhes falava num tom de voz especialmente calmo. O que ela estava falando, eles sabiam, era algo sério.

Se ouvíssemos o nome, víssemos o olhar nos olhos, escutássemos a ordem e, depois, não agíssemos, mamãe recorria ao que ela chamava de “apli- cação imediata de vara nas perninhas”. Era uma vara fina de 45 centímetros, uma das quais ela mantinha sobre a porta de todo cômodo da casa. Sabíamos que a vara era alcançável, mas, visto que sabíamos também que nossos pais queriam dizer exatamente o que disseram pela primeira vez, quando falaram conosco, usualmente, para sermos incentivados a ação, não era necessário mais do que o erguer dos olhos de mamãe para a verga da porta. Os hábitos comuns e bastante grosseiros de repetir ordens e levantar a voz não somente esgotam a paciência de um pai, levando-o a castigar com ira, mas também ensinam ao filho que ele não precisa prestar atenção até que ouça as ordens muitas vezes e as ouça em gritos. Ao redor de todos nós, há exemplos de filhos que não prestam atenção de maneira alguma.

Nossos pais nos diziam, às vezes, que “obediência demorada é desobediência”. Isso era uma regra geral, pois usualmente, quando nos pediam que fizéssemos algo, esperavam que o fizéssemos de imediato. Não era uma regra severa e inflexível. Mamãe foi sábia naquela lição anterior com Phil. Não havia urgência em que o leite fosse bebido imediatamente. O desejo do filho era sair da cadeira alta. Se ele se recusava a fazer o que devia fazer, tinha de fazer o que não desejava fazer: ficar onde estava. Quando apareceu algo que ele desejou fazer desesperadamente — ver a pequena carroça puxada por um cachorro — Phil teve de fazer uma escolha terrível: beber o leite ou deixar de ver a carroça.

O apanhar não é um abuso infantil. É uma medida de dor intencional, ministrada com calma, amor e autocontrole em um filho amado, a fim de livrá-lo da vontade própria e, em última instância, de autodestruição. É assim que Deus trata seus filhos. Foi dele que meus pais obtiveram suas diretrizes.

  1. C. Ryle diz:

Aplique punição raramente, mas de maneira real e em boa disposição — punição frequente e leviana é, de fato, um sistema perverso. No que diz respeito à melhor maneira de punir um filho, nenhuma regra geral pode ser estabelecida. Os filhos têm personalidades tão excessivamente diferentes, que uma punição que parece severa para um filho não é punição de maneira alguma para outro. Imploro que seja registrado o meu categórico protesto contra a noção moderna [1888!] de que nenhum filho deve receber castigo físico. Sem dúvida, alguns pais usam correção física excessivamente e muito violenta. Muitos outros, porém, eu receio, usam-na pouco demais.

The Duties os Parents [Os deveres dos pais], p. 27

O alvo de nossos pais era quebrar a vontade do filho sem quebrar o seu espírito. A diferença aqui é importante. Minha amiga Karen O´Keefe, que trabalhou com cavalos durante toda a sua vida, me garante que um cavalo que foi quebrado em sua vontade pode ser um cavalo de espírito muito forte. O quebrar é colocá-lo sob o controle do freio e das rédeas, que estão à vontade do seu montador. Se o cavalo era enérgico, vigoroso e cheio de vida antes de ser subjugado, ele continuará a ser. Os cavalos mais altamente treinados no mundo, Karen diz, são os garanhões Lippizaner, de Viena, que são treinados a fazer, sob ordens, o que faziam naturalmente no campo. Os resultados desse treinamento rigoroso são lindos de se ver.

O filho cuja vontade é treinada em sujeição é um filho mais livre e mais feliz, uma companhia muito mais agradável do que o filho cuja vontade própria é a sua única lei. Aqueles que se opõem à ideia de “quebrar” podem preferir a escolha de palavras de meu bisavô. Ele falava sobre “treinar a vontade” e não sobre “quebrar a vontade”: “Uma vontade quebrada vale, em sua esfera, tanto quanto um arco quebrado; apenas isso e não mais… Todo filho deve ser treinado a conformar a sua vontade às exigências do dever; mas isso é curvar a sua vontade, não quebrá-la” (Henry Clay Trumbull, Hints on Child Training [Dicas sobre educar filhos], p. 19).

Quando um menininho se recusa impassivelmente a terminar de beber seu leite, ele traz sobre si mesmo, bem como sobre sua mãe, infelicidade genuína. A batalha de duas vontades não pode trazer liberdade e felicidade para um ou outro. Um tem de vencer; um tem de ceder. Designados por Deus, os pais têm um conjunto de deveres — treinar; os filhos têm outro — obedecer. Ambos têm de curvar e conformar sua vontade às exigências de sua posição. A Palavra de Deus é: “Filhos, obedecei a vossos pais no Senhor, pois isto é justo. Honra a teu pai e a tua mãe […] E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor” (Ef 6.1-2, 4). O filhinho na cadeira alta aprendeu uma importante verdade espiritual: a liberdade da obediência. Ele desceu rápido e correu para ver a carroça de leite. Estou certa de que, para nós, entender os caminhos de Deus tem sido muito mais fácil do que deve ser para aqueles cuja infância não foi governada por pais cristãos sábios.

Por: Elisabeth Elliot. ©️Ministério Fiel. Website: ministeriofiel.com.br. Traduzido com permissão. Fonte: Como meus pais nutriram a minha fé. Editor e revisor: Renata Gandolfo.


Autor: Elisabeth Elliot

Elisabeth Elliot (1926–2015) foi uma das mulheres cristãs mais influentes do século XX. Nascida na Bélgica, filha de missionários, ela inspirou, com sua fé corajosa, seguidoras de Cristo em todo o mundo através de suas experiências como esposa, mãe e missionária. Seu primeiro marido, Jim Elliot (1927–1956), foi morto, com outros quatro missionários, quando buscava dar testemunho de Cristo entre os Auca, atualmente conhecidos como Huaorani, no leste do Equador. Alguns anos depois dessa tragédia, Elisabeth, com sua filha ainda pequena, passou a viver entre os membros dessa mesma tribo, a fim de compartilhar com eles o precioso evangelho. Em seu retorno para os Estados Unidos, Elisabeth deu início ao seu ministério como palestrante e escritora, publicando mais de vinte livros que foram traduzidos para diversas línguas. Seu ministério continua a influenciar gerações de mulheres ao redor do mundo.

Ministério: Editora Fiel

Editora Fiel
A Editora Fiel tem como missão publicar livros comprometidos com a sã doutrina bíblica, visando a edificação da igreja de fala portuguesa ao redor do mundo. Atualmente, o catálogo da Fiel possui títulos de autores clássicos da literatura reformada, como João Calvino, Charles Spurgeon, Martyn Lloyd-Jones, bem como escritores contemporâneos, como John MacArthur, R.C. Sproul e John Piper.

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