2. A GLÓRIA DE DEUS
Mas agora, assim diz o SENHOR, que te criou, ó Jacó, e que te formou, ó Israel: Não temas, porque eu te remi; chamei-te pelo teu nome, tu és meu. Quando passares pelas águas, eu serei contigo; quando, pelos rios, eles não te submergirão; quando passares pelo fogo, não te queimarás, nem a chama arderá em ti. Porque eu sou o SENHOR, teu Deus, o Santo de Israel, o teu Salvador; dei o Egito por teu resgate e a Etiópia e Sebá, por ti. Visto que foste precioso aos meus olhos, digno de honra, e eu te amei, darei homens por ti e os povos, pela tua vida. Não temas, pois, porque sou contigo; trarei a tua descendência desde o Oriente e a ajuntarei desde o Ocidente. Direi ao Norte: entrega! E ao Sul: não retenhas! Trazei meus filhos de longe e minhas filhas, das extremidades da terra, a todos os que são chamados pelo meu nome, e os que criei para minha glória, e que formei, e fiz (Is 43.1-7).
Após a pergunta do capítulo 1: “Deus existe?” — ao que Deus responde: “Eu sou” (Ex 3.14) — a próxima pergunta que mais nos moldou foi: “Por que Deus criou o mundo?”.
A resposta breve que ressoa em toda a Bíblia como um trovão é: Deus criou o mundo para a sua glória. Falaremos sobre o que isso significa, mas primeiro vamos estabelecer o fato.
Observe os versículos-chave em Isaías 43.6b-7: “Trazei meus filhos de longe e minhas filhas, das extremidades da terra, a todos os que são chamados pelo meu nome, e os que criei para minha glória, e que formei, e fiz”. Mesmo se o significado mais restrito aqui for “Eu trouxe Israel para a minha glória”, o uso das palavras “criei”, “formei” e “fiz” está nos apontando de volta para o ato original da criação. É por isso que Israel finalmente existe. Porque é por isso que todas as coisas existem: para a glória de Deus.
2.1 A Bíblia é clara sobre a glória de Deus
Quando o primeiro capítulo da Bíblia diz: “Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou” (Gn 1.27), qual é o ponto principal? O ponto principal de uma imagem é refletir. Imagens são feitas para apontar para o que é original. Aponte para o original. Glorifique o original. Deus fez os humanos à sua imagem para que o mundo se enchesse de refletores de Deus. Imagens de Deus. Sete bilhões de retratos de Deus. Para que ninguém perca o ponto principal da criação. Ninguém (a menos que fosse cego) poderia perder o ponto principal da humanidade, a saber, Deus. Conhecer, amar e mostrar a Deus.
Os anjos clamam em Isaías 6.3: “Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos; toda a terra está cheia da sua glória!”. A terra está cheia de milhões de seres humanos que portam a imagem de Deus. Ruínas gloriosas. Mas não apenas os seres humanos. A natureza também! Por que um mundo tão deslumbrante para vivermos? Por que um universo tão vasto? Eu li há algum tempo (não consigo lembrar quando!) que há mais estrelas no universo do que palavras e sons que todos os humanos de todos os tempos já falaram. Por quê?
A Bíblia é clara sobre isso: “Os céus declaram a glória de Deus” (Sl 19.1). Se alguém pergunta: “Se a terra é o único planeta habitado e o ser humano é o único habitante racional entre as estrelas, por que um universo tão grande e vazio?”. A resposta é: Isso não é sobre nós. É sobre Deus. E isso é um eufemismo. Deus nos criou para conhecê-lo, amá-lo e mostrá-lo. E, assim, ele nos deu uma pista de como ele é — o universo.
O universo está declarando a glória de Deus e a razão pela qual nós existimos é: vermos o universo, ficarmos maravilhados com ele e glorificamos a Deus por causa disso. Logo, Paulo diz em Romanos 1.20-21: “Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus”.
A grande tragédia do universo é que enquanto os seres humanos foram feitos para glorificar a Deus, todos nós ficamos aquém deste propósito e mudamos “a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível” (Rm 1.23) — especialmente aquele que vemos no espelho. Essa é a essência do que chamamos pecado.
Então, por que Deus criou o universo? Ressoando como um trovão através de toda a Bíblia — de eternidade a eternidade: Deus criou o mundo para a sua glória.
2.2 O testemunho de Isaías sobre a glória de Deus
Isaías afirma claramente em 43.7 que Deus criou o mundo para sua glória. Ele continua a pressionar a realidade repetidamente para nos ajudar a sentir e fazer parte do tecido do nosso pensamento:
Isaías 40.4-5: “Todo vale será aterrado, e nivelados, todos os montes e outeiros… glória do SENHOR se manifestará, e toda a carne a verá, pois a boca do SENHOR o disse”.
Isaías 42.8: “Eu sou o SENHOR, este é o meu nome; a minha glória, pois, não a darei a outrem, nem a minha honra, às imagens de escultura”.
Isaías 44.23: “Exultai, vós, ó profundezas da terra; retumbai com júbilo, vós, montes, vós, bosques e todas as suas árvores, porque o SENHOR remiu a Jacó e se glorificou em Israel”.
Isaías 48.9-11: “Por amor do meu nome, retardarei a minha ira e por causa da minha honra me conterei para contigo, para que te não venha a exterminar. Eis que te acrisolei, mas disso não resultou prata; provei-te na fornalha da aflição. Por amor de mim, por amor de mim, é que faço isto; porque como seria profanado o meu nome? A minha glória, não a dou a outrem”.
Isaías 49.3: “E me disse: Tu és o meu servo, és Israel, por quem hei de ser glorificado”.
Isaías 60.2: “Porque eis que as trevas cobrem a terra, e a escuridão, os povos; mas sobre ti aparece resplendente o SENHOR, e a sua glória se vê sobre ti”.
Isaías 61.1-3: “O Espírito do SENHOR Deus está sobre mim, porque o SENHOR me ungiu para pregar boas-novas aos quebrantados… a pôr sobre os que em Sião estão de luto… veste de louvor, em vez de espírito angustiado; a fim de que se chamem carvalhos de justiça, plantados pelo SENHOR para a sua glória”.
2.3 Como “glorificar” é diferente de “embelezar”
Deus criou o mundo “para que ele seja glorificado”. O que não significa: “para que ele seja feito glorioso”. Não tome a palavra “glorificar” e considere-a como a palavra “embelezar”. Embelezar significa tomar um cômodo comum e torná-lo belo. Não temos um Deus comum e o tornamos belo. Isso não é o que significa glorificar a Deus.
Quando Deus criou o mundo, ele não o criou por qualquer necessidade ou fraqueza ou deficiência. Ele criou a partir de plenitude, força e completa suficiência. Como Jonathan Edwards disse: “Não existe argumento do vazio ou deficiência de uma fonte que seja inclinada a transbordar” (Yale: Works, Vol. 8, 448). Assim, não glorificamos a Deus melhorando a sua glória, mas vendo, provando e mostrando a sua glória (que é o mesmo que conhecer, amar e mostrar).
Ou considere a palavra “engrandecer” (como em Filipenses 1.20, “que Cristo seja engrandecido”, megalunthesetai). Nós magnificamos a sua glória como um telescópio e não como um microscópio. Os microscópios fazem coisas pequenas parecerem maiores do que são. Os telescópios tornam as coisas grandes e inimaginavelmente mais parecidas com o que realmente são. Nossas vidas devem ser telescópicas em relação à glória de Deus. Fomos criados para ver a sua glória, sermos maravilhados com a sua glória e viver de modo a ajudar os outros a vê-lo e frui-lo pelo que ele realmente é. Conhecer, amar e mostrar a sua glória.
É por isso que o universo existe. Se isso se apoderar de você do jeito que deveria, isso afetará o modo como pensa e se sente em relação a tudo. Agora você sabe porque tudo existe. Você não sabe tudo. Existem bilhões de coisas que você não conhece. Mas você nunca fica sabendo de algo importante sobre tudo. Porque você sabe que tudo existe para a glória de Deus. Você sabe algo sobre tudo. E esta é uma das coisas mais importantes que você pode saber sobre qualquer coisa. E assim, saber uma coisa — que todas as coisas existem para a glória de Deus — é saber algo supremamente importante sobre tudo. Ou seja, para que finalidade, em última instância, existe. Isso é maravilhoso.
2.4 Por que Deus criou este mundo específico?
Apenas dizer que Deus criou o mundo para a sua glória é muito geral. Não podemos parar por aqui. Essa afirmação ainda está muito desconectada das pessoas específicas da Trindade e do fluxo da história do modo como Deus a está guiando. A questão não é apenas: “Por que Deus criou o mundo?”, mas por que este mundo? — por que esses milhares de anos da história humana com um começo glorioso, uma queda terrível no pecado, uma história de Israel, a vinda do Filho de Deus ao mundo, uma morte substitutiva, uma ressurreição triunfante, a fundação da igreja e a história das missões globais até onde estamos hoje? Por que este mundo, esta história?
E a resposta rápida a essa pergunta é: Para a glória da graça de Deus, manifesta de modo supremo na morte de Jesus. Ou para dizê-lo mais plenamente: Este mundo — esta história como está se desenrolando — foi criado e é guiado e sustentado por Deus para que a graça de Deus, supremamente demonstrada na morte e ressurreição de Jesus pelos pecadores, seja glorificada por toda a eternidade nas alegrias exaltadoras de Cristo sentidas pelos redimidos. Ou vamos resumir: Esse mundo existe para a glória da graça de Deus revelada na obra salvífica de Jesus. O que significa que Bethlehem não é apenas uma igreja centrada em Deus, mas uma igreja que exalta a Cristo e uma igreja guiada pelo evangelho. Para nós, há uma conexão inquebrável entre a glória de Deus, a glória da graça, a glória de Cristo e a glória da cruz.
2.5 Cinco pontos sobre a glória de Deus e a cruz de Cristo
Permita-me mostrar-lhe, a partir da Bíblia, como a glória de Deus está vinculada à cruz de Cristo. Podemos fazer isso em cinco etapas.
1. O ápice — o ponto alto — da manifestação por Deus de sua própria glória é a manifestação de sua graça.
“[Deus] nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade, para louvor da glória de sua graça, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado” (Ef 1.5-6). Em outras palavras, a glória da graça de Deus — o que Paulo chama de “a suprema riqueza da sua graça, em bondade para conosco, em Cristo Jesus” (Ef 2.7) — é o ponto alto e final na revelação da glória de Deus. E o objetivo da predestinação é que vivamos para o louvor da glória dessa graça para sempre.
Este é o desfecho da sua glória e de tudo mais; até mesmo a ira de Deus serve a esse propósito. Assim, Paulo diz em Romanos 9.22-23: “Que diremos, pois, se Deus, querendo mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita longanimidade os vasos de ira… a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia”. A ira é penúltima. A glória da graça nos vasos de misericórdia é final.
2. Deus o planejou — o louvor da glória da sua graça — antes da criação.
“Deus nos escolheu nele antes da fundação do mundo… para o louvor da glória da sua graça” (Ef 1.4, 6). A graça não foi uma reflexão tardia em resposta à queda do homem. Era o plano, porque a graça é o topo do monte da sua glória. E ele criou o mundo para a sua glória. Deus planejou o mundo para a glória da sua graça.
3. O plano de Deus era que o louvor da glória da sua graça viesse por meio do Filho de Deus, Jesus Cristo.
“…nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo… para louvor da glória de sua graça” (Ef 1.5-6). Essa predestinação para o louvor da glória da graça de Deus ocorreu “por meio de Jesus Cristo”. Na comunhão eterna da Trindade, o Pai e o Filho planejaram que a graça de Deus seria supremamente revelada por meio da obra salvífica do Filho.
Mais uma vez, Paulo diz em 2 Timóteo 1.9: “[Deus] nos salvou e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos”. Então, antes que começassem os tempos, o plano era a revelação da glória da graça de Deus especificamente por meio de Cristo Jesus.
4. Desde a eternidade, o plano de Deus era que a glória da sua graça atingisse seu clímax na obra salvífica de Jesus na cruz.
Percebemos esse fato no nome que já estava no livro dos redimidos antes da criação do mundo. Antes que houvesse algum pecado humano pelo qual morrer, Deus planejou que o seu Filho fosse morto pelos pecadores. Sabemos disso por causa do nome dado ao livro da vida antes da criação. “Todo mundo [adorará a besta] cujo nome não tenha sido escrito antes da fundação do mundo, no livro da vida do Cordeiro que foi morto” (Ap 13.8).
O nome do livro que existia antes da criação era “o livro da vida do Cordeiro que foi morto”. O plano era a glória. O plano era a graça. O plano era Cristo. E o plano era a morte. E essa morte por pecadores como nós é a essência do evangelho, e é por isso que em 2 Coríntios 4.4 Paulo o chama de “o evangelho da glória de Cristo”.
5. Portanto, o propósito final de criar, governar e sustentar este mundo — esta história — é o louvor da glória da graça de Deus na crucificação do seu Filho em favor dos pecadores.
É por isso que Apocalipse 5.3, 9 mostra que por toda a eternidade cantaremos “o cântico do Cordeiro”. Nós diremos com maravilha e louvor: “Digno és de tomar o livro e de abrir-lhe os selos, porque foste morto e com o teu sangue compraste para Deus os que procedem de toda tribo, língua, povo e nação” (Ap 5.9). Louvaremos dez mil fatos sobre o nosso Salvador. Mas não diremos nada mais glorioso do que: Tu foste morto… e compraste milhões.
Então, para concluirmos, nós perguntamos: “Por que Deus criou o mundo?”. E nós respondemos com as Escrituras: Deus criou o mundo para a sua glória. Deus não o criou por necessidade. Ele não criou o mundo a partir de uma deficiência que precisava ser suprida. Ele não era solitário. Ele era supremamente feliz na comunhão da Trindade — Pai, Filho e Espírito Santo. Ele criou o mundo para demonstrar a sua glória de modo que o seu povo pudesse conhecê-lo, amá-lo e evela-lo.
E por que Deus criou um mundo que se tornaria semelhante a este mundo? Um mundo que caiu em pecado? Um mundo que trocou a glória de Deus pela glória de imagens? Por que ele permitiria, governaria e sustentaria tal mundo? E nós respondemos: para o louvor da glória da graça de Deus demonstrada supremamente na morte de Jesus.
2.6 Quatro perguntas sobre a sua vida
A razão última para todas as coisas é a comunicação da glória da graça de Deus para o louvor alegre de uma multidão redimida composta por pessoas de toda tribo, língua, povo e nação. Todas as coisas são criadas, governadas e sustentadas para a glória de Deus, que atinge o seu clímax na glória da sua graça, que brilha mais intensamente e na glória de Cristo, que se concentra mais claramente na glória da cruz. Então, pergunto:
• A glória de Deus é o tesouro mais brilhante no horizonte do seu futuro? Paulo expressou o coração cristão em Romanos 5.2: “gloriamo-nos na esperança da glória de Deus”
• A glória da graça é a mais doce notícia para a sua alma culpada?
• A glória de Cristo em sua vida é o exemplo presente e pessoal da graça de Deus?
• A glória da cruz é a beleza mais triste e feliz para a sua alma redimida?
Tradução: William e Camila Rebeca Teixeira.