“Ouse descobrir a Ilha Proibida! Junte-se a um time de aventureiros destemidos em uma missão do tipo ou faz ou morre para recolher os tesouros sagrados das ruinas desse paraíso perigoso. Seu time terá que trabalhar em equipe e fazer manobras pulsantes (ao longo do tabuleiro), conforme a ilha afunda a cada passo! Corra para recolher tesouros e escapar de maneira triunfante antes de ser engolido pelo abismo de água!”
Eu li a tampa da caixa com ceticismo. “Se juntar a um time? Trabalhar em equipe?” Esse jogo era muito diferente dos jogos de tabuleiro competitivos, como Banco Imobiliário e War que eu cresci jogando. No entanto, Forbidden Island (Ilha Proibida) com certeza se tornou um dos jogos favoritos da família. Acredite ou não, três crianças um tanto competitivas (e um pai bastante competitivo) sentam-se em volta da mesa da cozinha e trabalham em equipe discutindo estratégias para recolher o tesouro e escapar de uma ilha imaginária prestes a inundar antes que nossos pequenos pinos afundem.
Qual é a chave para ganharmos? Curiosamente, nesse jogo de tabuleiro em particular, trata-se de todos os jogadores manterem um bom relacionamento entre si. Se o Engenheiro não colaborar com o Explorador, perdemos. Se o Mensageiro se recusar a dar ao Navegador suas cartas do tesouro, todos são derrotados. Se o Piloto se recusar a resgatar o Mergulhador, fim de jogo.
Infelizmente, quando se trata da vida real, pode ser tentador para muitos cristãos (concebivelmente àqueles de nós que amamos nossa igreja local mais do que as outras) viverem como se estivéssemos jogando Banco Imobiliário ou War. Quando se trata de outras igrejas locais, pensamos em competição. Eu quero o máximo de dinheiro, o máximo de território, o máximo de tesouros, o máximo de pessoas — para a nossa igreja, é claro. Se os relacionamentos com os outros jogadores cristãos fora da nossa igreja local sofrerem, que seja. Queremos que nossa igreja ganhe.
Algumas igrejas, infelizmente, cultivam esse tipo de filosofia. Mas muitas não. É nossa inclinação natural, afinal de contas.
Quando se trata da vida cristã, quando se trata de como os membros de igrejas com diferentes pregações do evangelho devem se relacionar uns com os outros, precisamos mudar nossa estratégia. Precisamos lembrar que estamos jogando Ilha Proibida, não War ou Banco Imobiliário.
O motivo
Aqui estão alguns motivos.
1. Bons relacionamentos com outros cristãos ocorrem porque estamos no mesmo time.
Devemos nos esforçar para manter bons relacionamentos com cristãos de outras igrejas porque no final das contas, estamos no mesmo time. O objetivo comum no jogo da vida real não é nossa glória pessoal, mas sim a de Deus. Nossos oponentes são o mundo, a carne e o diabo (Efésios 2.2-3). Lutamos por vitória sob esses poderes cruéis, não por vitória sob nossos irmãos de igrejas diferentes. Cristãos, portanto, lutam para serem um time unido. Não só em sua igreja local, mas como igreja universal. Porque a igreja é uma, assim como Deus é um. Cristo viu a importância dessa mentalidade de estarmos no mesmo time e orou para que você e eu pudéssemos ter isso: “Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim, por intermédio da sua palavra; a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti” (João 17.20-21).
De maneira prática, se somos cristãos em uma igreja central de uma cidade grande e uma igreja que prega o evangelho se estabelecer virando a esquina, não devemos ficar zangados e puxar nossas cartas do tesouro para mais perto de nós. Da mesma maneira, se fazemos parte da plantação de uma igreja, deveríamos enxergar os cristãos com bastante recursos rua acima como aliados em uma marcha da vitória, não como outros jogadores que poderiam destruir nossas chances de “vencer”. O povo de Deus se alegra quando novos jogadores surgem. Como Stephen Witmer utilmente escreveu, “Em Salmos 48 vemos Deus abençoando sua cidade espetacular, Monte Sião, as maravilhas do mundo tudo, e as tribos e as cidades de Judá não ficam com ciúmes. Pelo contrário, estão alegres, se regozijando com a cidade. No final, nem a cidade nem o país é melhor: invés disso, é Deus quem recebe a glória.”[1]
2. Bons relacionamentos com outros cristãos nos ajudam a recolher mais tesouros.
Em Ilha Proibida, cada jogador recebe uma determinada habilidade no início do jogo. Alguns jogadores podem se mover pelo tabuleiro mais rápido; eles frequentemente têm a glória de recolher mais tesouros. Outros jogadores impedem que a ilha inunde. O Mensageiro tem o poder bastante humilde de compartilhar suas cartas e recursos com os outros! Para recolher a maior quantidade de tesouros possíveis, cada jogador deve usar seus próprios talentos em prol do time, mesmo que isso signifique que alguns jogadores não recolham tesouro algum.
O mesmo é verdade quando se trata do sucesso do evangelho na vida real. A oportunidade para desenterrar um tesouro bastante real, ou seja, incrédulos se chegando a Cristo e cristãos crescendo para serem mais parecidos com Cristo, é muitas vezes desencadeada pelo reconhecimento de nossos próprios talentos, limitações e localização no tabuleiro.
Em um natal, quando eu pastoreava em Londres, lembro-me de que outra igreja local tinha uma abundância de músicos talentosos. De última hora, perguntei se eles poderiam nos ajudar a montar um culto com canções evangelísticas. Eles concordaram alegremente (de fato, até o pastor tocou!) e o evangelho foi proclamado. Algumas semanas depois, uma equipe de missões de curto prazo que eu conhecia estava em Londres. Eu sabia que eles não poderiam servir nossa igreja porque estávamos muito distantes, mas também sabia de uma oportunidade de servir outra igreja necessitada. Bons relacionamentos com outros cristãos permitiram que mais tesouros fossem recolhidos.
3. Bons relacionamentos com outros cristãos nos ajudam a sustentar nossa ilha.
O sucesso cristão não é somente sobre recolher o tesouro do evangelho, é também edificar a igreja (Efésios 4.11-16) e, portanto, impedir com que cristãos cansados afundem. A melhor maneira de manter os cristãos flutuando é encorajar relacionamentos profundos dentro das igrejas locais. Ao se juntar a uma certa igreja, damos permissões a determinados pastores e cristãos para nos apoiarem em meio às inundações de tentações, mundanismo e doutrinas falsas.
Porém, às vezes precisamos que outros cristãos de outras igrejas nos aconselhem graciosa e pacientemente. Precisamos disso principalmente se estamos descontentes ou desencorajados sobre algo que está acontecendo dentro de nossa própria igreja. Com frequência precisamos de pessoas que não estão pessoalmente envolvidas no que estamos enfrentando para enxergarem de maneira clara. Não minimizando os trabalhos pastorais da igreja local. De fato, com frequência pude perceber que meus melhores amigos fora da minha igreja me apoiaram de tal maneira que me voltaram para a minha igreja local com empatia, compaixão e compromisso resiliente. Tal escoramento só pode acontecer se nos esforçamos para manter um bom relacionamento com outros cristãos de outras igrejas.
4. Bons relacionamentos com outros cristãos nos lembram que nosso tempo é curto.
Há uma característica final em Ilha Proibida que faz um paralelo com a vida cristã: o tempo é curto. Na vida real, temos uma quantidade limitada de jogadas para recolher os tesouros sagrados das ruínas desse paraíso perigoso. As areias do tempo estão afundando. Como resultado, cristãos devem trabalhar juntos local e rapidamente. Se passarmos nosso tempo disputando sobre cartas de recursos e planejando a próxima jogada dos outros, vamos perder. Devemos olhar para o relógio enquanto criamos estratégias para o bem do perdido e do imaturo. Algumas vezes plantaremos sementes e ela não germinará em nossa igreja. Outras vezes regaremos a planta com fidelidade, para que floresça em outro lugar. A fugacidade de nossos dias aqui deveria fazer com que nos importássemos um pouco menos.
Como
Com tudo isso em mente, como podemos manter bons relacionamentos com outros cristãos de outras igrejas? Aqui vão algumas dicas.
1. Passe tempo com cristãos de outras igrejas.
Quando eu pastoreava em Londres, uma vez por mês saía com um vizinho cristão que estava firmemente comprometido com uma grande igreja anglicana no centro de Londres. No âmbito pessoal, eu realmente desfrutava desse tempo. Mas passar tempo como ele também me lembrava que o reino de Deus é maior do que minha própria igreja. Conforme ele me contava todas as coisas maravilhosas que sua igreja tinha recursos para fazer, meu orgulho e inveja eram revelados, o que consequentemente me ajudava a lutar contra eles.
2. Encoraje seu pastor a passar tempo com pastores de outras igrejas locais.
Relacionamentos profundos levam tempo. Se você vir seu pastor almoçando com seus amigos pastores locais, não suspire e pense “Por que ele não está estudando ou fazendo visitas?”. No meio de todas as risadas, eles está esperançosamente estimulando uma confiança e uma unidade, o que em retorno beneficiará a ele, você e a toda a igreja.
3. Fale bem das outras igrejas.
Quando mencionamos outras igrejas, há a tentação de defini-las somente por seus defeitos. “Você está falando da super igreja que eles dançam no corredor? Ou da pequena e abafada que eles só te deixam entrar de terno?”.
Incrivelmente, Paulo se dirigiu à igreja de Corinto como “à igreja de Deus, aos santificados em Cristo Jesus, de maneira que não vos falte nenhum dom” (1 Coríntios 1.2,7) não “os orgulhosos, desordenados, libertinosos gregos que processam uns aos outros e ficam bêbados na ceia do Senhor.” Da mesma maneira, devemos nos esforçar para definir outras igrejas por suas virtudes e seu firmamento em Cristo. Fale bem daqueles com os quais você compartilhará a eternidade.
4. Ore por outras igrejas.
Conforme temos oportunidades, devemos orar por todos os cristãos, até mesmo aqueles que vão a igrejas que temos algumas reservas. Na minha igreja atual, oramos por qualquer igreja da nossa cidade que prega o evangelho. Oramos por tais igrejas nominalmente em nossas orações pastorais na nossa principal reunião semanal. Toda semana, nossas anotações do estudo bíblico de pequenos grupos têm uma seção com nomes de outras igrejas locais para orarmos.
5. Contribua com outras igrejas locais.
Novamente, a principal igreja que devemos dar é a nossa. Temos responsabilidade e alegria de contribuir generosa e regularmente para o ministério do qual mais extraímos de volta. No entanto, pode haver oportunidades de apoiar outras igrejas seja diretamente ou através do encorajamento dos líderes de nossa igreja. Lembro que minha antiga igreja apoiava o trabalho de outra igreja em nossa cidade. Eu tinha algumas perguntas verdadeiras sobre a robustez de sua eclesiologia e sua filosofia de discipulado. Mas em última instância, eles estavam indo em direção a uma área em que não havia testemunhas do evangelho. Eu não teria feito algumas das jogadas que eles fizeram, mas passei a enxergar que eles estavam buscando por tesouros que eu nunca seria capaz de desenterrar. Demos a eles e nos regozijamos em ouvir sobre sua obra para Cristo.
Conclusão
Devemos trabalhar em equipe nessa ilha afundando como aventureiros destemidos em uma missão do tipo ou faz ou morre. Devemos jogar o jogo que está diante de nós. Devemos jogar da melhor maneira que achamos adequado às oportunidades e habilidades graciosamente nos dadas. E devemos jogar de maneira cooperativa, para que não nos tornemos uma ilha em nós mesmos.
[1]Stephen Witmer, Um grande evangelho em lugares pequenos, p. 163
Publicado originalmente em 9 Marks.
Tradução: Deborah M. Brasileiro. Revisão: Renan A. Monteiro.