Você tem trilhado a jornada da vida com olhos e ouvidos atentos para se deleitar nas belezas da criação e exultar em seu Criador? No ordinário e no extraordinário, a vida grita a plenos pulmões: “Observe os detalhes, ouça todos os sons, enxergue as diferenças e veja a glória de Deus!”.
Enquanto escrevo este capítulo, tenho uma enorme janela à minha frente. Através dela, tenho o privilégio de enxergar muitos tons de verde em uma mesma árvore, pintados em folhas recortadas de formatos e tamanhos distintos. Vejo os troncos e os galhos em tons marrom-claro, marrom-escuro e verde-musgo. As árvores que aparecem nessa janela são bem diferentes daquelas que eu vejo no meu bairro e se parecem pouquíssimo com aquelas que crescem no lugar em que nasci, no sul do Brasil. Toda essa diversidade faz parte das demonstrações da bondade e do amor de Deus.
Entre as muitas belezas das mãos do Criador, sinto um amor especial pelos pássaros. É impressionante a criatividade de Deus, que se manifesta em tantas cores e combinações de nuances das peninhas; e mais impressionante ainda é o privilégio de vê-las. É maravi- lhoso constatar que Deus escolheu dar a cada espécie de aves um som único. Ele é criativo e nos ama muito além de nossa compreensão, permitindo-nos ver, provar e nos alegrar com seus feitos (Sl 92.4). “Levantai os olhos e observai as alturas: Quem criou tudo isso?” (Is 40.26).
Quem criou tudo isso? O Senhor, que expôs sua glória majestosa nos céus (Sl 8). E eu nem falei das flores, da marcha de cada estrela do incontável exército celestial ou da lua. Não falei da imensidão do mar e de todas as coisas invisíveis aos nossos olhos. Mas quero falar do que tem ainda mais valor para Deus.
Erga seus olhos. Observe as mulheres, os homens, as crianças, os jovens e os idosos ao seu redor. Levante seus olhos e veja todas as suas formas, altos e baixos, com diferentes cores de pele, cabelos e olhos; enxergue seus sorrisos e suas lágrimas. Escute as vozes doces e firmes, os choros e as risadas. Encontre seus olhos. Contemple as estruturas e as funções, as substâncias e os relacionamentos, os dons e a criatividade, eu e você: Quem criou tudo isso? O que é o homem para que o Deus Todo-Poderoso se lembre dele? (Sl 8.4)
Limpando as lentes sujas
Responda com sinceridade às seguintes questões:
1) No espelho, o que você vê?
2) O que você vê em mim?
3) Quando você olha para outra mulher na escola, na rua ou no trabalho, o que você vê?
4) Quando você olha para sua mãe, o que você vê?
5) Quando aquela sua amiga sorri, o que você vê?
6) Pense em uma mulher de quem você não gosta. Veio alguém à sua cabeça? Talvez você tenha pensado em mais de uma. Quando ela passa por você, além de sentir aquele incômodo costumeiro, o que você vê?
Já faz tempo que eu percebi que, quando não gosto de uma mulher, a primeira coisa que acontece comigo é uma espécie de cegueira a tudo de bom que ela é e faz. Eu sei que meu olhar gracioso está ali, em algum lugar, mas não me esforço para trazê-lo à memória. Depois, parece que fortaleço minha visão a respeito de tudo que considero defeituoso nela, e quase que sinto satisfação ao fazer isso. E, por fim, como se não bastasse, começo a tentar encontrar defeitos até mesmo nas coisas boas que Deus deu a ela. Você já notou isso em si mesma?
Começou já na infância. Lá estava eu brincando de boneca com minha irmã no chão do quarto, rindo da criatividade dela, amando a forma de ela deixar as bonecas estilosas, com esse talento que ela tem, e sendo grata por ter alguém para brincar comigo todos os dias. Porém, bastava que minha irmã pegasse o sapato da minha Barbie e não devolvesse para eu começar a gritar: “Você é a pior irmã do mundo!”. E, nesse momento de egoísmo e ira, nada me fazia lembrar as coisas boas que eu vira nela meio segundo antes.
O tempo foi passando e as coisas não mudaram muito. A convivência com esse clima de rivalidade e desavença permaneceu na escola, na faculdade, no trabalho e na igreja. Esse padrão de como somos vistas e de como enxergamos umas às outras produz efeitos em nossa identidade como mulheres e em nossos relacionamentos, pois o que vemos umas nas outras se expressa por meio de nosso falar. Se essa voz for repleta de maldade e mentira, vai ferir e destruir. Com tantas vozes, até mesmo a sua imagem no espelho fica embaçada.
Temos muito a dizer e ouvir umas em relação às outras, mas, com toda essa gritaria, deixamos de ouvir o que nosso Criador diz de verdade e bondade sobre nós e perdemos a oportunidade de enxergar os vislumbres da graça de Deus quando ele põe alguém em nosso círculo de convivência.
Imagem do prórpio Deus: diferente como eu
Vamos ajustar o som e a imagem, diminuir esse barulho e limpar as lentes? A Bíblia nos diz que cada ser humano é imagem e semelhança de Deus (Gn 1. 26, 27).[i]
Afinal, o que você vê?
Sua mãe? Imagem de Deus.
Sua amiga? Imagem de Deus.
A mim? Imagem de Deus.
Sua (não) amiga? Imagem de Deus.
A crente? Imagem de Deus.
A descrente? Imagem de Deus.
Você? Imagem de Deus.
E quem criou tudo isso? O Senhor, que nos formou de modo assombrosamente maravilhoso à sua imagem e à sua semelhança, coroando-nos com sua glória majestosa. Todas nós fomos criadas por Deus assim. Algumas são imagens quebradas; outras são imagens quebradas que estão sendo refeitas pelo sangue de Jesus, como veremos mais adiante. Talvez você até saiba disso, mas não aplica essa verdade em sua vida.
São muitos os textos bíblicos que abordam a grandiosidade da criação do ser humano e seu valor para Deus. O salmista diz:
“Que é o homem, que dele te lembres?
E o filho do homem, que o visites?
Fizeste-o, no entanto, por um pouco, menor do que Deus
e de glória e de honra o coroaste” (Sl 8.4-5).
Mais adiante:
“Pois tu formaste o meu interior, tu me teceste no seio da minha mãe. Graças te dou, visto que por modo assombrosamente maravilhoso me formaste; as tuas obras são admiráveis, e a minha alma o sabe muito bem” (Sl 139.13- 14).
É isso que somos! Seres maravilhosos, menores apenas em relação a Deus.
O que o ser humano tem de especial? O salmista nos lembra que toda a criação glorifica a Deus. E as pessoas que seguimos na internet árvores, de pássaros fofos ou do seu cachorrinho fazendo uma gracinha. Quando vemos o sol nascer ou se pôr, a natureza verde ou seca, e louvamos a Deus por sua criação, lembramos que, mesmo em todo o seu esplendor, a criação não é imagem de Deus. Você e eu, sim. Você louva a Deus por isso também?[ii] Nós somos o meio pelo qual a imagem de Deus se torna visível no mundo. Assim, nas palavras de Hoekema: “Sem dúvida, outras criaturas e até mesmo os céus declaram a glória de Deus, mas somente no homem Deus se torna visível”.[iii]
Além disso, nosso Senhor nos criou diferentes. Ele escolheu plantar uma vegetação diferente em cada cantinho do mundo, da qual, de minha janela, posso vislumbrar apenas uma pequena porção. Deus espalhou sua imagem por um mundo diverso em relevo, fauna e flora. E se deleita com a diversidade que ele sustenta. Não é apenas o comportamento territorialista do beija-flor que fala de sua glória. A conduta em bando dos pardais fala, o espinho da rosa anuncia, assim como o amarelo radiante do girassol e a solitária flor num deserto proclamam a glória de Deus. Cada detalhe da diversidade anuncia sua glória.
Essa magnífica criatividade de Deus não é muito mais intensamente refletida em suas imagens e semelhanças? Você sabe que sim!
Você confirma isso quando olha a si mesma no espelho ou observa uma multidão. E sabe disso quando ouve o som do sorriso de sua mãe ou a gargalhada de sua tia.
Somos muito diferentes umas das outras. Você é diferente, como eu: imagem e semelhança de Deus. A diversidade criacional é proclamada pelos céus em mim e em você. Cada detalhe da diversidade anuncia a glória de Deus. O ser humano é semelhante a Deus, pois nós somos seres morais, criativos, artísticos, construtivos, exploradores, criadores de história, comunicativos, amorosos e relacionais.
Este artigo é um trecho adaptado com permissão do livro Unidas contra a rivalidade feminina, de Ana Paula Nunes, Editora Fiel (clique para comprar pela pré-venda).
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[i] Veja Gênesis 5.1-3; 9.6
[ii] Eu a desafio a postar em sua rede social a foto de uma amiga querida sua com Salmos 19.1,2, pois ela glorifica a Deus de forma muito maior do que seu cachorrinho e minha gatinha. Nós só achamos mais fácil lidar com eles porque Deus não lhes deu ferro para afiar ferro como deu às nossas irmãs em Cristo, não é? Mas isso é assunto para outra parte deste livro. Chegaremos lá.
[iii] Anthony Hoekema, Criados à imagem de Deus (São Paulo: Cultura Cristã, 2018), p. 82.