Artigo adaptado do livro Lado a lado, de Dave Furman.
Já faz mais de dez anos que o meu médico descobriu que os nervos do meu braço não estavam funcionando corretamente, disparando sinais de dor crônica para o meu cérebro e transformando-os em dolorosos neuromas. Eu sofri quatro grandes cirurgias em meus braços, passei por mais de uma dúzia de procedimentos invasivos no hospital, fiz centenas de horas de terapia e tomei um coquetel de medicamentos e remédios homeopáticos, procurando obter algum alívio. Porém nada funcionou de fato.
Nestes anos, tenho a experiência de receber cuidados de muitos indivíduos bem-intencionados e bastante sinceros, mas no final do dia só fizeram a minha dor aumentar. Outras vezes, eu também achei que estivesse fazendo bem a alguém, quando, na verdade, estava lhe causando uma dor maior. Por mais que sejamos sinceros, ainda podemos estar errados!
Considerando isso, quero mostrar dez abordagens que, superficialmente, parecem úteis para se cuidar de alguém que sofre, mas que, no final, só aumentam a dor. Iremos ver os seguintes comportamentos em três partes:
Parte 1: Quer ajudar quem está sofrendo? Não faça estas 10 coisas!
- Não seja o doutor-sara-tudo!
- Não entre no jogo da comparação
- Não faça da dor a identidade daquele que sofre
Parte 2: Não prometa cura ou resposta instantânea para quem sofre
- Não prometa libertação agora
- Não os encoraje a apenas “seguir em frente”
- Não seja hiperespiritual
Parte 3: Não seja indiferente, genérico ou acusador com quem sofre
- Não entre no jogo da indiferença
- Não ofereça ajuda generalizada
- Não faça inquisição
- Não os condene
1. Não seja o doutor-sara-tudo!
“Sabe, eu andei pensando em você. Eu consegui uma nova pomada orgânica, totalmente natural, que certamente vai resolver o seu problema. Minha avó usava essa pomada para a dor no pé, e a dor foi embora em uma semana. Ela deve curar você também!”
A verdade é que ninguém quer outro tratamento, outra pomada, referência de acupuntura ou uma dieta com cem por cento de garantia para manter as esperanças mais elevadas do que antes.
Não dá para dizer quantas vezes recebi uma sacola cheia de cremes exóticos em alguma língua que eu não conseguia entender. Nem dá para contar o número de vezes que me deram algo que afirmam ter curado alguém com a mesma doença que eu tenho.
Quando você faz essas afirmações e garante a cura, isso pode ressaltar para quem está sofrendo que você não tem a mínima ideia sobre as questões com as quais ele está, de fato, lidando.
Faz parte de nossa natureza desejar oferecer solução para o problema. E isso é bom! Nós ansiamos por ajudar e, frequentemente, somos bem-intencionados ao querer dar soluções. A disposição de coração de quem age assim é, geralmente, maravilhosa, mas, às vezes, a melhor ajuda é ouvir os problemas que a pessoa está, de fato, enfrentando.
2. Não entre no jogo da comparação
“Olha, que coisa, você tem dor no braço! Uma vez eu tive um inchaço no meu antebraço e foi terrível. Eu fiquei sem praticar nenhum esporte por algumas semanas. Eu sei exatamente o que você está passando”.
A menos que você seja Jesus, quase nunca ajuda dizer a alguém que você sabe exatamente o que ele ou ela está passando. Se você já passou pela situação horrenda que seu amigo ou membro da família está passando, então certamente eles sabem disso. Costumamos pensar que incentivaremos os outros se dissermos que vivemos algo semelhante, quando na realidade o que eles estão atravessando pode ser muito diferente da experiência que tivemos. Certamente não foi a mesma coisa.
Outra maneira de entrar no jogo da comparação é falando de outras pessoas que estão em situação pior do que a de seu amigo. Podemos pensar que estamos ajudando quando dizemos a alguém que tem uma perna ferida: “Bem, pelo menos você ainda tem uma perna. Existem milhares de pessoas ao redor do mundo que não têm nenhuma perna e não conseguem andar. Louvado seja Deus pela perna que você tem!”. Mas como isso pode ajudar a pessoa a sentir-se melhor? Não ajuda, com certeza.
Quando você faz isso, minimiza o sofrimento da outra pessoa. Você a faz sentir como se o sofrimento dela fosse “uma coisinha à toa.” Para quem está sofrendo, seja qual for o motivo, aquilo é uma coisa séria. Se você minimizar a dor de uma pessoa, isso a agravará ainda mais. E quando a dor que está sendo experimentada por ela não é reconhecida, então não há por que direcioná-la a Cristo em busca de esperança e socorro. Por que incomodar Jesus com algo que realmente não é grande coisa?
Em vez de se esforçar para se lembrar de um parente distante que passou por algo semelhante e compartilhar essas histórias, demostre compaixão e amor pela pessoa que sofre e que está bem à sua frente. Em vez de comparar seu amigo com alguém que você conhece, você pode dizer: “Eu não entendo o que você está passando, mas eu quero tentar. Ajude-me a entender como está se sentindo.”
3. Não faça da dor a identidade daquele que sofre
“Oi, que bom te ver. Como estão suas costas? Está se sentindo melhor? Você já descansou? Você está com muita dor agora? Como está, em comparação com a semana passada? Você não parece estar muito bem agora, acho melhor se assentar”.
Outro comportamento que não se deve fazer aos seus amigos que sofrem é não falar tanto de sua dor a ponto de ela se tornar a identidade deles. Se você falar sobre isso o tempo todo, você corre o risco de defini-los pela luta e dor que enfrentam, como se nisso se resumisse a vida deles. Precisamos ter cuidado para não mencionar constantemente o sofrimento.
Porém, ao mesmo tempo, queremos mostrar que nos importamos, por isso este é um equilíbrio difícil de se manter. Ao dispensar cuidados ao seu amigo é importante se lembrar de que se ele tem uma deficiência, isso não quer dizer que ele seja fundamentalmente deficiente. Se ele é um cristão, então ele é um cristão portador de uma deficiência. Se ele perdeu o emprego, ele não é fundamentalmente uma pessoa desempregada; se ele é cristão, então é um cristão que está sem um trabalho. Como cristão, sua identidade primária é a de um filho do Deus vivo. Ele é um ser humano que tem uma alma imortal, resgatada do reino das trevas.
Quando Deus, o Pai, olha para nós, ele vê Jesus. Quando ele olha para um cristão que tem uma deficiência, ele não vê primeiramente a deficiência; acima de tudo, ele vê o seu Filho. Quando ele olha para um cristão que está fraco ou doente, ele não vê a doença, mas o nosso Salvador.
Ao interagirmos com crentes que estão sofrendo, reconheçamos que sua identidade é a de estar em Cristo Jesus. Quando você falar com eles, ajude-os a voltar os olhos para Cristo, para que possam ver as coisas por uma perspectiva eterna, e não os deixe se esquecerem de que a identidade deles não está nas circunstâncias, mas em seu Salvador.
Na próxima parte veremos comportamentos hiperespirituais que desencorajam aquele que sofre.