Uma boa exegese nos dirá que conclusões ruins nem sempre surgem de uma exegese ruim. É valioso, importante e até mesmo fortalecedor para nós ter uma boa compreensão de princípios hermenêuticos sãos. Nós somos facilmente desviados e uma hermenêutica sã funciona como migalhas de pão nos levando de volta para o caminho reto e estreito.
Nós estamos, contudo, lendo as nossas Bíblias com óculos cor-de-rosa se pensamos que todas, ou pelo menos a maioria, de nossas falhas de interpretação são causadas por ignorância ou falta de informação. Isto é, nós somos culpados da ideia modernista de que a educação é sempre a cura para o que nos aflige. Paulo, por exemplo, em Romanos 1 é muito direto ao ressaltar nossos problemas em nosso estado natural.
Não é o que não sabemos. Não é o que sabemos que não é assim. O problema é o que nós sabemos e reprimimos por causa do nosso pecado. Nós sabemos que existe um Deus. Nós sabemos que somos fracos. Nós sabemos que estamos com problemas. E sabemos que não gostamos de como nos sentimos quando estamos com problemas. Então voltamos ao princípio e tentamos ignorar que existe um Deus. A fonte da má teologia é o nosso coração perverso — e é por isso que é melhor levarmos em consideração o nosso coração perverso quando estivermos prestes a praticar a hermenêutica.
Familiarizado demais com meu próprio coração perverso, ao longo da última década aproximadamente, estive em uma missão. Eu tenho viajado o mundo, assim como as vastas extensões do ciberespaço, divulgando o que eu cuidadosamente chamei de Princípios de Hermenêutica de R. C. Sproul Jr.
Eu não apenas expliquei o princípio, apliquei o princípio e gostei do princípio, mas toda vez que eu falo sobre ele, eu imploro à minha audiência que se lembre dele e o passe adiante a seus amigos. Eu estou sinceramente convencido de que se todos nós dominarmos esse princípio, nós seremos mais fiéis à Palavra e mais fiéis Àquele a quem a Palavra chama de o Verbo.
O princípio é tão simples quanto o seu autor — sempre que você estiver lendo a sua Bíblia e se deparar com alguém fazendo algo muito estúpido, não diga a si mesmo: “Como ele pode ser tão estúpido?” Em vez disso, diga a si mesmo: “De que maneira eu sou estúpido como ele?” (Agora você sabe por que eu dei o meu nome a esse princípio— trata-se de pessoas estúpidas). Nós, assim como as pessoas na Bíblia, somos muito melhores em discernir os pecados dos outros do que em farejar os nossos próprios pecados. Os pecados das outras pessoas são claros, imediatos, óbvios para nós, enquanto os nossos são confusos, distantes, obscuros.
Quando vemos os dez espias expressando o seu temor de que não seriam capazes de tomar a Terra Prometida — logo após o Deus dos céus e da terra ter trazido Faraó, o líder da nação mais poderosa do mundo, aos seus pés, e logo após o mesmo Deus ter conduzido seu povo em chão seco através do Mar Vermelho — nós pensamos: “Eu teria sido fiel como Josué e Calebe, os dois espias que estavam prontos para seguir adiante”. As chances maiores, contudo, são de que pecaríamos assim como os dez, e que não teríamos tido a fé para crer nas promessas de Deus.
A razão para isso é simples: não existe nada novo debaixo do sol. Santos e pecadores na Bíblia são iguaizinhos aos santos e pecadores de hoje em dia, incluindo eu e você. Suas fragilidades e tolices são as nossas fragilidades e tolices. Então, quando os vemos pecar, e vemos a maneira como pecam, isso deve nos dar pistas de que maneiras podemos vir a pecar.
A Bíblia descreve a si mesma como um espelho. Nós olhamos para ela, mas quando nos afastamos, esquecemos quem e o que somos. Nós somos infiéis. Somos céticos. Somos teimosos. Nós, como aquele Pedro tolo antes de nós, vivemos as nossas vidas constantemente falando aquela mesma frase contraditória que ele falou em Cesaréia de Filipe, quando insistiu que Jesus não fosse para Jerusalém a fim de ser entregue nas mãos dos gentios: “Não, Senhor”. Não eu entendo. Senhor eu entendo. Mas essas duas palavras não combinam juntas.
Nós, contudo, não falamos o mesmo? Nosso Senhor nos manda não nos preocuparmos com o que comeremos ou vestiremos. Nós lemos essas palavras e curvamos as nossas cabeças em oração. Nós suplicamos a Jesus como o Rei dos reis, trazendo as nossas petições diante dele, reconhecendo o seu senhorio, e então oramos: “Senhor, por favor, me ajude, pois estou temeroso quanto ao meu trabalho ou minhas contas. Estou preocupado com o que comerei, com o que vestirei”. Esse é apenas mais um “Não, Senhor”. Nosso problema não é que não somos suficientemente instruídos, mas que não somos suficientemente santificados.
Isso significa, por sua vez, que a solução é arrepender-se e crer. Devemos nos arrepender da nossa incredulidade e pedir ao nosso Senhor que nos ajude em nossa incredulidade. Devemos aprender a sabedoria dos lírios do campo. Devemos aprender a dizer os nossos améns para tudo o que o nosso Senhor promete. Essa é a justiça que estamos procurando. Esses consentimentos são os olhos do reino.