sexta-feira, 20 de dezembro
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Uma mensagem constrangedora

1. Introdução:

Esta é uma mensagem constrangedora!

Muitas coisas podem ser constrangedoras. O significado desta palavra pode ter muitos sentidos. Atualmente, quando ouvimos a palavra “constrangimento”, logo vem à nossa mente a idéia de embaraço, vergonha.

Mas gostaria de chamar a atenção a um outro significado desta palavra. Um significado que podemos encontrar em um estudo etimológico dela. O dicionário Antônio Houiss, aponta que, originalmente,  esta palavra deriva-se do latim “constrígo“, que, mais tarde, recebeu o sufixo “ingere“, formando assim a palavra “constringir”, que significa “fazer pressão”, “comprimir”, esta, mais tarde, formou uma palavra de significação divergente, “constranger”, que quer dizer: “forçar”, “obrigar”, “impelir”.

2. O Amor de Cristo é constrangedor:

II Cor. 5.14: ” Pois o amor de Cristo nos constrange, julgando nós isto: um morreu por todos; logo, todos morreram“.

Que declaração mais contundente. “O amor de Cristo nos constrange”. Vindo da pena de alguém como o apóstolo Paulo, é muito significativo! O que aconteceu na vida do homem que fez tal declaração? Quem é ele? Não é o ex-perseguidor da igreja? O mesmo homem que arrastava pessoas violentamente aos tribunais e alguns para pena de morte, como aconteceu com Estevão?

Algo aconteceu.

“Dura Coisa é recalcitrares contra os aguilhões” (At. 26.14). Foi com esta frase, e com uma luz mais intensa do que o próprio sol, que Saulo, o tenaz perseguidor da Igreja, foi confrontado com o seu pecado. Seu zelo ardoroso tornou-se na mais profunda miséria de sua vida. Tudo o que ele era, desmoronou-se. Ruiu, como que um monte de pedras que rolando do monte, formando terrível e avassaladora avalanche e um montão de escombros. Aquele grande campeão de sua religião; erudito e prodígio; cheio de si mesmo, orgulhoso, derreteu-se como que se fosse uma manteiga diante de um maçarico. Aquela frase “dura coisa é recalcitrares contra os aguilhões”, foi muito marcante para o apóstolo de Cristo, que ao lembrar-se de sua condição passada, reconhece seu chamado pela graça de Deus: “porém, ao que me separou antes  de eu nascer e me chamou pela sua graça“.  Foi ele, que agora inspirado pelo Espírito, ao dirigir-se a uma Igreja que vivia muitas lutas e tribulações, que vez por outra envolvia-se em controvérsias e tropeçava em erros doutrinários, quem disse: ” O amor de Cristo nos constrange”.

O apóstolo sentia-se constrangido por esse amor, que conforme ele mesmo coloca em Efésios 2.4,5 “Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida, juntamente com Cristo, – pela graça sois salvos“.

Paulo conheceu um amor tão profundo, que desejava que sua “largura, comprimento, altura e profundidade“, que, aliás, nem se pode medir, pois “excede todo entendimento“( Ef. 319), fosse pregado a todos os homens.

Ele afirmou ainda na epístola aos Romanos 5.8: “Mas Deus prova seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores“.

A Cruz, esse objeto repugnante, de tortura e dor, de miséria e sofrimento, de morte, foi o objeto do olhar de Paulo, para nela visualizar um amor tão grande e profundo que o constrangia. Nela ele pôde visualizar o Salvador, o Deus encarnado que se humilhou, fez-se homem, viveu vida santa e perfeita, e se deu por nós, não, sem antes, ser submetido à tortura da cruz. Suas mãos traspassadas, seu lado perfurado, sua angustia e dor profundas, a ausência do próprio Deus, por haver se tornado maldição e pecado, era algo que movia profundamente o coração de Paulo, a ponto de o constranger; o impelir, o obrigar. Esse constrangimento gerou nele um senso de compromisso constante. Ele diz que o amor de Cristo nos constrange. O tempo do verbo está no presente (aoristo), como se fosse uma ação pura, sem tempo para terminar, algo permanente.

Ao enxergar o amor de Deus, Paulo sabia se tratar de algo tão grandioso que excede a nossa compreensão. A Palavra diz, em 1 João 1.5 que “…Deus é amor“. A Palavra diz também que Deus é eterno, portanto, seu amor é eterno. Assim como Deus não teve principio, seu amor também não teve. E assim como Deus é eterno, seu amor também não tem fim. Não tem limites. É eterno com Deus. Ele o é em Deus. Ele nos escolheu antes da fundação do mundo “em amor” (Ef. 1.4,5). E, seu amor é o que é porque é! Trata-se de um amor gratuito, espontâneo, livre. (Dt. 7.7,8 ). Enquanto em nós há tudo que poderia fazer Deus detestar-nos, Ele decidiu amar-nos. João Calvino afirma que “Deus nos amou enquanto nos odiava”, por causa de nossos pecados. Este é, portanto, um amor soberano, que não depende de nossas obras. Ele faz tudo conforme o conselho de sua vontade. O amor de Deus é um amor prático, pois Ele “amou o mundo de tal maneira, que deu seu filho unigênito… Ele deu seu filho. Ele agiu. Ele fez. Ele planejou e executou. Ele viu o problema [do pecado e da separação eterna com o homem] e planejou a solução, e a executou cabal e plenamente. Seu amor materializou-se na pessoa, vida e obra de Cristo, seu filho unigênito. Seu amor é gracioso, por isso não poupou seu filho da miséria, da aflição, da dor, da humilhação e perseguição, por amor a seu povo.

Assim, ao visualizar um amor destes, Paulo declara que esse amor nos obriga, nos impele, nos constrange:

O amor de Cristo é ainda um amor livre. Ele não depende do nosso amor “Nós o amamos porque ele nos amou primeiro“, diz a Palavra em 1João 4.19.

O Amor de Cristo é como o próprio Cristo. Não muda (Tg. 1.17). Romanos 8.35-39 diz que “nada pode separar-nos do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor”.

Olhe para a cruz. Contemple o amor de Cristo por você. Olhe para cruz e veja na imagem do Cristo crucificado a maior expressão de amor de todos os tempos. O amor de Cristo é restaurador. Apelo contigo, como João apelou aos santos da Igreja em Eféso que volte ao primeiro amor. Ao único amor de sua vida. Lembre-se o que diz o texto bíblico em Jeremias 31.3: “Com amor eterno eu te amei; por isso, com benignidade te atraí.”

3. O Amor de Cristo é constrangedor, pois nos impele a viver uma vida de obediência e santidade:

A Escritura ensina em Hebreus que sendo Deus santo, somente aqueles que forem santos o poderão ver (Hb. 12.14). O amor de Deus nos constrange a buscar a santidade. A nos separarmos do mundo. João diz em I João 1.15, que os que amam a Deus e são por Ele amados “não amam o mundo e nem as coisas que há no mundo…” Paulo assevera em Gálatas 6.14 “…o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo“. O amor de Deus nos impele a nos conformarmos a “perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo” como vemos em Efésios 4.14.

O amor de Cristo nos constrange a fugir do pecado, porque entende que o pecado é uma afronta a Deus. É uma ofensa gravíssima ao Senhor. Quem é que é capaz de ofender àquele que lhe é gentil? Quem pode desprezar aquele que lhe salva a vida? O senso de pecado invade o coração daquele que ama a Deus. Ele, assim como o salmista em Salmo 51.4, tem um senso aguçado de sua própria pecaminosidade “pequei contra ti, contra ti somente pequei...” esse senso, porém, vem acompanhado de um arrependimento sincero. O apóstolo Paulo afirma que o pecado não terá domínio sobre nossas vidas (Rm. 6.14). 1 João 3.9 afirma que o crente “não vive na prática do pecado” Porém, quando peca, ele o faz porque perde de vista o amor constrangedor de Cristo. Deixa de olhar para a cruz, e o amor de Cristo fica distante de seus olhos. Muitas vezes o Senhor até permite isso, para que não esqueçamos que nossa justiça é “trapos de imundícia” diante do Senhor.  Mas, 1 João 2.1, diz que se o crente pecar ” tem Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo”

Olhe para a Cruz. Contemple o amor de Cristo. Esconda-se à sombra do Onipotente. Ele declarou ao profeta Oséias (11.1-4), que a despeito do pecado de Israel, o Senhor o “tomou em seus braços, como um filho, e o atraiu com laços de Amor“.

4. O Amor de Cristo nos constrange a amar a Deus e ao nosso próximo:

O Amor gera amor. Deus nos amou primeiro, por isso nós agora O amamos. O mandamento diz: “Amarás, pois, o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de toda a tua força” (Dt. 6.5). O amor a Deus subentende um amor pelo seu ser; pelos seus atributos; pelo seu caráter moral: sua bondade, amor, justiça, fidelidade, paciência, graça, misericórdia, justiça, ira, santidade. O caráter de Deus é alvo de nosso amor. O Amor a Deus consiste em se alegrar nas coisas de Deus. A vida cristã não pode ser um enfado ou uma vida de negações. A santidade não é uma lista de “nãos”. Nós somos constrangidos a amar a Deus e as coisas de Deus com alegria e contentamento. Nossa motivação para a amar a Deus é o próprio Deus.

Quanto ao amor ao próximo, podemos endossar o que disse Agostinho, o bispo de Hipona: “Rogai a Deus a graça de vos amar uns aos outros. Amai a todos os homens, também aos vossos inimigos. Não por serem irmãos vossos, mas para se tornarem tais. Rogai para estardes sempre abrasados do amor fraterno”.

Se nós amamos a Deus, haveremos de amar como Cristo amou. Cristo amou os pecadores. Dedicou tempo e atenção a eles. Comeu com eles. Chorou por eles.

5. O Amor de Cristo produz segurança e nos impele a servir ao Senhor:

O Senhor, em sua oração ao Pai, afirma que aqueles a quem Ele amou, “foram guardados, protegidos e nenhum se perdeu…”(João 17.12), diz ainda o apóstolo Paulo em Filipenses 1.6 que “aquele que começou a boa obra em vós há de completá-la…” O amor de Cristo não muda, como já vimos. Ele não está sujeito a alterações de humor. Nós podemos confiar plenamente no amor de Cristo.

E ainda, se amamos ao Senhor, temos desejo de empregar tudo o que temos e somos no serviço do Senhor. Temos interesse na causa do reino d’Ele. Queremos ofertar as primícias de nossas vidas a Ele. Valorizamos e investimos bem os talentos que Ele nos confiou. Queremos expressar nossa gratidão por meio de nosso serviço. Paulo diz que somos embaixadores em nome de Cristo, para anunciar as boas novas.  Amamos estar na casa do Senhor e nela servir, como o salmista declara no Salmo 84 e 122.

O Amor de Cristo nos constrange. Olhe para a cruz de Cristo. Podemos contemplar o amor e a benção que fluem da maldita Cruz. Trema diante da ira de Deus por causa do pecado e admire o seu doce amor. Pois, podemos encontrar ambos naquela Cruz terrível.


Autor: Tiago Santos

Tiago Santos é Diretor Executivo do Ministério Fiel, um dos pastores da Igreja Batista da Graça e co-fundador e diretor do programa de estudos avançados no Seminário Martin Bucer. É bacharel em direito pela Universidade do Vale do Paraíba e estudou teologia no Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper e na Universidade Luterana do Brasil. Casado com Elaine e pai de três filhos: Tiago, Gabriel e Rebeca.

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