A Bíblia explica que Deus é espírito, mas também nos mostra que Deus existe eternamente em três pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. Este é o grande mistério da Trindade. E quando se trata da transformação do coração, somos “[salvos] mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo, […] [derramado] sobre nós ricamente, por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador” (Tt 3.5-6). Jesus ensina isso a Nicodemos ao dizer que aqueles que nascem de novo são “nascidos do Espírito” (Jo 3.8).
Se quisermos entender a grande obra do novo nascimento, precisamos entender algo sobre aquele que faz essa obra. Precisamos saber mais sobre Deus, o Espírito Santo.
Quem é o Espírito Santo?
Como muitas pessoas sabem pouco sobre o Espírito Santo, e porque a linguagem sobre espírito é tão estranha para nós, frequentemente nos referimos ao Espírito Santo em termos impessoais. Fazemos isso quando nos referimos ao Espírito Santo usando isso em vez de ele. Na língua portuguesa, um isso é uma coisa. A mesa na qual estou sentado é um isso. O livro que você tem em suas mãos é um isso. Mas o Espírito Santo nunca é chamado de isso nas Escrituras, mas sim de ele. Ele pode ser obedecido (veja At 10.19-21); pode-se contar uma mentira para ele (veja Atos 5.3); ele pode ser entristecido (veja Ef 4.30); pode-se resistir a ele (veja Mt 12.31). Em outras palavras, a obra que Deus faz ao dar um novo coração àqueles que estão espiritualmente mortos é uma obra feita por uma pessoa divina. Não uma máquina. Não uma força vaga e impessoal.
O Espírito Santo também é claramente Deus. Sabemos disso por muitas razões, mas uma prova simples é que ele tem atributos que somente Deus possui. Ele é onisciente (sabe todas as coisas), como vemos em 1 Coríntios 2.11-12. Ele também é onipresente (está em todos os lugares — não é limitado pelo espaço), como vemos no Salmo 139.7. Ele é identificado como a própria Verdade em 1 João 5.6. Finalmente, ele é, como seu título declara, santo. Quando falamos do Espírito Santo, falamos de Deus. Pedro reconhece isso diretamente quando acusa dois membros da igreja primitiva de mentirem “ao Espírito Santo” (At 5.3) e conclui: “Não mentiste aos homens, mas a Deus” (v. 4). O Espírito Santo é Deus.
A obra do Espírito Santo é, portanto, uma obra divina e pessoal. É a obra de um cirurgião habilidoso — alguém que nos conhece, nos criou e cuida de nós.
Um resumo útil da fé cristã, o Credo Niceno, descreve o Espírito Santo como “o Senhor e Vivificador”. Esta é sua obra principal e, portanto, ele é necessário para o novo nascimento — para chegarmos à vida. No Salmo 104.30, o escritor diz: “Envias o teu Espírito, eles são criados, e, assim, renovas a face da terra”. No Novo Testamento, Jesus diz explicitamente: “O espírito é o que vivifica; a carne para nada aproveita; as palavras que eu vos tenho dito são espírito e são vida” (Jo 6.63). O apóstolo Paulo ecoa Jesus: “Porque a letra mata, mas o espírito vivifica” (2Co 3.6). Essa obra de dar vida se estende à ressurreição de Jesus dentre os mortos e à vivificação do nosso próprio “corpo mortal” (Rm 8.11).
O Espírito Santo também capacita as pessoas a servirem a Deus de maneiras especiais. Por exemplo, o Espírito capacitou Josué a liderar com sucesso o povo de Israel para fora do deserto e para dentro de uma terra perigosa (ver Nm 27.18; Dt 34.9). O Espírito Santo encheu pessoas conhecidas como juízes para que pudessem resgatar Israel de seus inimigos (ver Jz 3.10; 6.34; 11.29; 13.25). Davi foi cheio do Espírito para que pudesse servir como rei designado por Deus (ver 1Sm 16.13). O Espírito Santo até mesmo encheu um homem para que pudesse construir o tabernáculo no qual a presença de Deus residiria, uma tarefa que exigia grande habilidade artística e de engenharia (ver Êx 31.1-5). Embora essa tenha sido uma obra especial para um tempo especial, ela nos mostra algo sobre o poder do Espírito Santo. Além de ser ele mesmo santo, ele separa as pessoas para o santo serviço a Deus.
Mais significativamente, no entanto, Deus prometeu: “Repousará sobre ele o Espírito do Senhor, o Espírito de sabedoria e de entendimento, o Espírito de conselho e de fortaleza, o Espírito de conhecimento e de temor do Senhor” (Is 11.2; veja também 42.1; 61.1). Em seu primeiro sermão registrado, Jesus anunciou ser ele mesmo o Messias, ao dizer: “O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos e restauração da vista aos cegos, para pôr em liberdade os oprimidos” (Lc 4.18). Os escritores do evangelho frequentemente mencionam o papel do Espírito Santo na vida de Jesus (veja Mt 12.28; Lc 4.1, 14; At 10.38). E esse mesmo Espírito operou para ressuscitar Jesus dos mortos. Este é um detalhe crucial: o Espírito Santo não apenas capacita, mas também é a fonte de vida para aqueles que o recebem. O apóstolo Paulo o resume desta forma: “Se habita em vós o Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos, esse mesmo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivificará também o vosso corpo mortal, por meio do seu Espírito, que em vós habita” (Rm 8.11).
Então, para revisar: o Espírito Santo é santo, e sua obra é sempre feita para separar as pessoas para uma santidade cada vez maior. Essa obra traz vida àqueles em quem ele opera e as capacita para servirem a Deus. No novo nascimento, o Espírito Santo aplica seu poder a pessoas pecadoras e necessitadas para realizar tudo isso e muito mais.
O Espírito Santo também desempenha um papel crucial na revelação de Deus por meio de sua Palavra. O Credo Niceno diz que o Espírito Santo “falou através dos profetas”. Ele é aquele que trabalha especialmente para revelar o plano e a Palavra de Deus — aos profetas no Antigo Testamento e aos apóstolos no Novo Testamento (ver Mt 22.43; Jo 16.13; 2Pe 1.21).
Cirurgiões são responsáveis pelos procedimentos que realizam. Eles empregam sua habilidade, suas mãos firmes e seu treinamento à obra que fazem, assim como também usam instrumentos especializados. Bisturis e facas estão tão associados aos cirurgiões que quase podemos falar de uns e outros de forma intercambiável: “ir para a faca” é estar sob o cuidado e tratamento de um cirurgião.
De forma semelhante, o Espírito Santo nos coloca sob a faca. Afinal, foi isso que já vimos: precisamos de corações circuncidados. É uma operação minuciosa, e a Bíblia ensina que o Espírito Santo usa um instrumento minucioso — a Palavra de Deus. A Palavra de Deus é chamada de “a espada do Espírito” (Ef 6.17). Ela é “porque a palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração” (Hb 4.12). Quando a Palavra de Deus está em ação, o Espírito Santo está em ação. E quando o Espírito de Deus faz sua obra, ele a faz pela Palavra e através da Palavra de Deus. Isso é algo que vemos já no primeiro capítulo da Bíblia. Embora a personalidade do Espírito Santo não seja explicada diretamente ali, vemos Deus criar por sua Palavra, com seu Espírito “pairando” sobre a criação durante todo o processo (Gn 1.2).
O Espírito Santo também é aquele que inspira a Palavra escrita de Deus, a Bíblia. O apóstolo Pedro explica que “nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo” (2Pe 1.21). Não é por acaso, então, que Pedro pode usar a palavra Escritura e atribuí-la tanto ao seu autor humano (neste caso, Davi) quanto ao Espírito Santo, que é o autor divino das Escrituras: “Convinha que se cumprisse a Escritura que o Espírito Santo proferiu anteriormente por boca de Davi” (At 1.16). O Espírito Santo é o autor da Palavra escrita de Deus.
Talvez a ilustração mais vívida dessa conexão íntima entre o Espírito Santo e a Palavra de Deus venha de Ezequiel 37. Imagine a cena. Ezequiel é levado a um vale cheio de ossos secos. O Senhor ordena que ele diga aos ossos: “Ossos secos, ouvi a palavra do Senhor” (v. 4); e que profetize que eles viverão novamente quando o Senhor colocar neles o seu sopro, ou Espírito (ver v. 5 e 14). Aquela parece ser uma tarefa sem esperança, até mesmo ridícula, mas Ezequiel obedece: “Profetizei como ele me ordenara, e o espírito entrou neles, e viveram e se puseram em pé, um exército sobremodo numeroso” (v. 10). O Espírito de Deus operou por meio da proclamação da Palavra para trazer vida.
Uma vez que o Espírito Santo usa o instrumento da Palavra para fazer sua obra, a Bíblia pode falar do nosso novo nascimento como uma obra do próprio Espírito ou de sua Palavra. Por exemplo, lemos: “Pois fostes regenerados não de semente corruptível, mas de incorruptível, mediante a palavra de Deus, a qual vive e é permanente” (1Pe 1.23). Ou, em outro lugar, “Pois, segundo o seu querer, ele nos gerou pela palavra da verdade” (Tg 1.18). O que isso significa? Significa que somos verdadeiramente convencidos do pecado quando lemos a Palavra e nos assentamos sob a pregação da Palavra.[i] É aí que Deus nos traz as palavras da vida eterna. É aí que ele nos mostra as promessas encontradas em Cristo, renova nossos corações e nos purifica. A Bíblia diz que “a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo” (Rm 10.17) e que as Escrituras “podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus” (2Tm 3.15). A Palavra de Deus é o que o Espírito Santo, nosso cirurgião espiritual, usa para realizar sua obra em nosso coração.
Neste ponto, precisamos retornar a outra metáfora. Ao receber um coração transformado, estamos entrando em uma nova vida. Nascemos de novo. Essa grande obra de regeneração — esse milagre de uma nova vida — é uma dádiva de salvação oferecida em Cristo. O Espírito que ressuscitou Jesus dentre os mortos dá vida àqueles que confiam em Cristo somente. Isso tem consequências eternas que começam agora mesmo. Uma nova vida é dada àqueles que vieram a Jesus em busca de perdão. E é para essa nova vida — vida em Cristo, comprada por Cristo — que devemos agora prestar atenção.

Este artigo é um trecho retirado e adaptado com permissão do livro Você precisa nascer de novo, de Jonathan Master, Editora Fiel (em breve).
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[i] Nas maravilhosas palavras da resposta 155 do Catecismo Maior de Westminster: “O Espírito de Deus torna a leitura, e especialmente a pregação da Palavra, um meio eficaz para iluminar, convencer e humilhar os pecadores; para lhes tirar toda a confiança em si mesmos e os atrair a Cristo; para os conformar à sua imagem e os sujeitar à sua vontade; para os fortalecer contra as tentações e corrupções; para os edificar na graça e estabelecer o coração deles em santidade e conforto mediante a fé para a salvação”.