sexta-feira, 22 de novembro
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A criação de filhos não é algo que “funciona”: Invista tempo e energia

O trecho abaixo foi adaptado com permissão do livro Converse com seus filhos, de William P. Smith, Editora Fiel (em breve).


 

Criar filhos envolve incontáveis interações

por meio das quais você convida futuros pares em potencial 

a um relacionamento contínuo,

caso eles escolham fazê-lo.

Criar filhos não é ter algo que funciona. É a prática de cortejar. Depois de terminar de falar com um grupo de mães sobre criação de filhos, uma das senhoras veio até mim e disse: “Vejo como não tenho sido muito gentil com meus filhos, portanto, se eu fosse mais gentil nas coisas que digo e faço, então as coisas provavelmente funcionariam melhor em minha casa, certo?”.

Bem, eu não acho que ela esteja errada, mas ela não entendeu o ponto do que eu estava tentando dizer. O ponto na criação de filhos não é que as coisas funcionem melhor em nossa casa — que a vida seja um pouco mais fácil e que as coisas corram mais tranquilamente. Esse não é o objetivo, mas é o que ela queria. E assim ela estava procurando algum tipo de método que, uma vez dominado, garantiria certos resultados se ela apenas investisse a quantidade certa de tempo e esforço nele. Ela queria algo que funcionasse.

A criação de filhos não é algo que “funciona”. A criação de filhos exige que você invista tempo e energia sem saber ao certo qual será o resultado. Isso é verdadeiro para todos os relacionamentos, mas é surpreendente quando você percebe que vai se entregar a seus filhos, curvar sua vida ao redor deles, sacrificar-se por eles, mudar seu mundo por eles e, ainda assim, não ter nenhuma garantia de que eles responderão bem.

Quem quer isso? Eu não quero. Eu quero alguma certeza. Quero alguma sensação de que se eu disser a coisa certa e fizer a coisa certa, então meus filhos responderão positivamente a mim, e eu pelo menos obterei um pouco do resultado que estou procurando. Só que não há certezas. Isso provavelmente não é o que você quer ouvir. Eu sei que não é o que eu quero ouvir.

Você e eu não estamos sozinhos. Um pai colocou as coisas da seguinte maneira: “Sei que não é certo, mas estou mais inclinado a iniciar conversas se eu souber que haverá um retorno. Se eu sei que o que vou dizer vai funcionar, então estou dentro. Mas se eu não sei, se não tenho certeza, então tenho tendência a recuar. Fico hesitante em dizer qualquer coisa”. Ele está procurando algo que aumente suas chances de um resultado favorável. Ele está procurando um retorno garantido antes de investir.

Acho que ele está falando por muitos de nós. Porém, criar filhos não se trata de descobrir a coisa certa a fazer ou a dizer a fim de gerar um resultado específico; trata-se de uma pessoa a ser amada. E quando você está falando em amar uma pessoa, percebe que não há fórmulas que sempre funcionam, o que significa que não há garantias e nenhum retorno certo sobre seu investimento.

Infelizmente, em minha experiência como conselheiro e pastor (e como pai!), as pessoas querem esse retorno. E querem isso agora. E assim elas conversam com seus amigos e mentores, leem livros e vão a seminários, se abrem a qualquer estratégia que lhes dê a esperança de que podem chegar o mais perto possível de um resultado garantido.

Eles vêm com um problema claramente definido — ou a criança está fazendo algo que os pais precisam interromper, ou a criança não está fazendo algo que os pais querem que ela comece a fazer —, então buscam um método que promete resolver o problema que eles enxergam.

Mas aí reside a armadilha. Quando você define a criação de filhos como a resolução que parte de um adulto para um problema criado por um filho, então você pensará principalmente em termos de colocar seu filho de volta na linha. Nesse caso, a criação de filhos torna-se uma interação negativa que tenta acabar com a tensão doméstica gerada entre o que você quer e o que seu filho está fazendo.

Então, como você evita a armadilha? Você se recusa a permitir-se pensar apenas em termos do que você deve ou não fazer. Você se obriga a olhar além do problema e a enxergar a pessoa — seu filho —, o que o leva a pensar em termos relacionais, e não meramente em termos comportamentais.

Você pensa no que significa amar seus filhos naquele momento mais do que amar o que você quer deles ou mesmo o que você quer para eles. É somente quando você os enxerga e os valoriza como indivíduos que você tem qualquer esperança de desenvolver conexões saudáveis com eles. Comece então por, no mínimo, considerar: quem são eles? Qual é a identidade mais fundamental deles?

Antes de tudo, seus filhos não são seus. São de Deus. Ele os criou e assume a responsabilidade primária por eles. Eles estão sob os seus cuidados apenas secundariamente e, mesmo assim, apenas temporariamente.

Eles são seus filhos — eles podem até ter vindo de seu corpo —, mas também são seres autônomos por direito próprio. Quando Deus os criou, ele não consultou você. Você não escolheu nenhum dos atributos, das virtudes, dos talentos, dos dons, das fraquezas, das inseguranças ou das lutas dos seus filhos.

Nesse sentido, eles não são miniaturas suas — versões menores de você, cuja razão de ser é refletir sua glória e fazer você ficar bem perante os outros. Eles tampouco são uma espécie ligeiramente sub-humana que precisa ser socializada através do uso de gráficos inteligentes para obter um bom comportamento até que tenham idade suficiente para sobreviver por conta própria. Eles são imagens de Deus, independentes de você, mas relacionados a você.

Isso significa que seus filhos são seres eternos, que, tendo começado a vida, continuarão a viver indefinidamente. Pense na lacuna de maturidade entre você e eles neste exato momento. Independentemente de quão grande seja, essa lacuna continuará a diminuir com o passar do tempo, tornando-se menos significativa até que seja imaterial. Na verdade, seus filhos o superarão em muitas áreas, se ainda não o fizeram. Olhe para o futuro: quão importante será sua vantagem de vinte e cinco quando ambos tiverem dez mil anos de idade? À medida que seus filhos crescerem e amadurecerem, de acordo com o projeto de Deus, eles e você terão o potencial para se tornarem pares.

Criar filhos, portanto, significa investir nesses seres humanos semelhantes, mas sem enrolar meu mundo ao redor deles nem tentar fazê-los enrolar o mundo deles ao meu redor. Em vez disso, criar filhos é a soma total das interações entre dois seres humanos, por meio da qual convido regularmente uma pessoa ligeiramente mais jovem para uma relação que cada vez mais fecha a lacuna de maturidade entre nós.

Deus convida você — você convida seus filhos

A boa notícia para o povo de Deus é que você já sabe como é esse tipo de relacionamento. Mesmo que esteja apenas começando a conhecer a Deus, agora você vê as coisas muito mais parecidas com a forma como ele enxerga do que você enxergava antes — a diferença diminuiu porque você cresceu. E continuará encolhendo à medida que seu Pai no céu cria você como filho.

O apóstolo Paulo fala sobre como o povo de Deus se desenvolve até que coletivamente sejamos um corpo cuja maturidade em todos os aspectos corresponderá à sua cabeça, que é Cristo (Ef 4.15). Nos Salmos, Asafe faz comentários obscuros sobre as pessoas serem deuses, insinuando que podemos ser mais do que os olhos conseguem ver (Sl 82.6), enquanto Pedro declara abertamente que, pelo poder de Deus, podemos agora compartilhar de sua natureza divina (2Pe 1.3-4; veja também Gl 2.20; 1Jo 3.2).

Nós não nos tornamos Deus. Nem jamais seremos iguais a Deus. Mas Deus planeja um relacionamento de longo prazo conosco, de modo que compartilhamos de sua natureza e, embora não sejamos iguais a ele, nos tornamos um parceiro adequado a ele (Ef 5.31-32). Crescemos à medida que ele interage conosco no presente, com um olho voltado para o futuro. Grande parte dessa interação vem de escutá-lo falar conosco — com certeza, enquanto oramos e ainda mais claramente nas Escrituras.

Deus fala, e suas palavras atraem você naquele momento, pois cada vez que ele fala, ele lhe fala de si mesmo. Deus lhe diz como ele é — o que ele valoriza, o que é importante para ele e o que não é. Deus lhe diz onde estão os comprometimentos dele e o que ele pensa ser essencial na vida.

Mas suas palavras também lhe dizem como ele se relaciona — como ele trata as pessoas, como espera que os relacionamentos aconteçam, o papel que ele desempenha na vida dos outros e o papel que os outros desempenham na vida dele. E você aprende que Deus não simplesmente trata você bem quando você tem sido bom. Ele o trata bem quando você não tem sido bom — não lançando no seu rosto seus pecados, tratando-o melhor do que você merece, e todo o tempo falando gentilmente e ainda assim diretamente a você. Deus lhe fala de maneiras que você gostaria que falassem com você, dando-lhe motivos para querer mais dele.

Ao pensar em como Deus é como pessoa e como ele se relaciona com as pessoas, você percebe: “Eu poderia gostar de alguém assim. Se esse é o tipo de pessoa que ele é, e se é assim que ele trata as pessoas, então eu quero mais disso. Eu quero mais dele. Eu gostaria de conhecê-lo melhor”.

É aí que você percebe que as palavras dele fazem mais do que simplesmente engajar você no momento presente. Elas trazem um convite implícito para o futuro que pergunta: “Com base no que acabei de dizer, você acha que eu sou alguém que vale a pena conhecer? Com base na forma como acabei de falar com você, eu sou alguém com quem você gostaria de ter um relacionamento de longo prazo”?

As palavras de Jesus lhe dão razão para confiar nele. Na Bíblia, você o escuta falar com pessoas fracas, feridas, ameaçadas ou em perigo e descobre que ele não se aproveita delas. Ele não as esmaga. Não as afasta. Não as odeia. Suas palavras não quebram relacionamentos. Em vez disso, ele usa palavras para fomentar um relacionamento maior.

Enquanto Jesus fala, experimentamos a graça do evangelho, e o evangelho nos transforma, tornando-se parte de nós, de forma que suas palavras se tornem parte de nós. Então, falamos com aqueles que nos rodeiam de maneiras semelhantes à forma como ele falou conosco.

A mesma dinâmica entre você e Deus está em ação entre você e seus filhos. Toda vez que surge a possibilidade de uma conversa, você está comunicando a eles exatamente as mesmas coisas que Deus comunica a você: “É assim que eu sou como pessoa — isso é o que eu valorizo; isso é o que importa para mim; isso é o que eu penso da vida; isso é o que eu penso de você”.

E você também está comunicando como é nos relacionamentos: “É assim que eu sou em um relacionamento — é assim que eu trato as pessoas; é assim que eu interajo; esses são os tipos de coisas que eu digo; essa é a maneira como eu as digo”. E assim como Deus, você não só está comunicando essas coisas sobre o momento presente, mas também está convidando as pessoas ao seu redor para algo mais. Quer você escolha falar ou não, você não só está dizendo quem você é e como você se relaciona, mas também está perguntando: “Com base no que eu acabei de dizer, você quer menos ou mais de mim?”.

Aqui está o pontapé inicial: você sempre está fazendo isso. Você não pode evitar. Nossos filhos — que no curso normal da vida passam uma quantidade significativa de seus anos mais formativos conosco — ouvem esse convite embutido com muita clareza. As coisas que escolhemos dizer ou não dizer e a maneira como as dizemos são um convite para um relacionamento maior ou uma advertência contra um relacionamento maior.

Criar filhos, então, é o privilégio de cortejar potenciais futuros pares — imagens menores e menos desenvolvidas de Deus — convidando-os, se assim eles o desejarem, a relaciona- mentos verticais e horizontais que podem durar mais tempo.

Agora você vê por que a criação de filhos não “funciona”? Não é possível que funcione. Você não pode forçar seus filhos a amá-lo ou a quererem estar com você ou a trabalharem bem com você. Mas você pode cortejar. Você pode dar-lhes uma experiência de vida no mundo de Deus que os convida a ter mais. Você pode usar palavras para amá-los, buscá-los, treiná-los e envolvê-los assim como Deus usa as palavras com você. Ao fazer isso, seus filhos terão a oportunidade de sentir o caráter e a natureza de Deus por meio de você, o que os ajudará a decidirem se gostariam ou não de mais de você e mais dele.

Esse tipo de criação de filhos o deixará cansado e desesperado porque você perceberá quão pouco controle você tem sobre o coração de seu filho e quão poucas habilidades você tem para alcançá-lo. Essa é uma boa consciência, porque o levará de volta a Jesus. E à medida que Jesus o encontrar em sua necessidade, você estará muito mais bem equipado para convidar seus filhos a essa mesma experiência por si próprios. Este livro é um convite para experimentar o coração de Deus com seus filhos, para experimentar Deus sendo seu pai enquanto você cria seus filhos.


Para saber mais sobre este assunto recomendamos os livros:

Pastoreando o Coração da Criança, de Tedd Tripp

Pais fracos, Deus forte, de Elyze Fitspatrick

 

 


Autor: William P. Smith

William P. Smith, M.Div., Ph.D., é pastor e diretor do centro de aconselhamento comunitário da igreja Chelten Baptist Church, na Pensilvânia. Ele é frequentemente convidado para pregar em outras igrejas e conferências. Para mais informações, visite o site www.surprisedbygod.com.

Ministério: Editora Fiel

Editora Fiel
A Editora Fiel tem como missão publicar livros comprometidos com a sã doutrina bíblica, visando a edificação da igreja de fala portuguesa ao redor do mundo. Atualmente, o catálogo da Fiel possui títulos de autores clássicos da literatura reformada, como João Calvino, Charles Spurgeon, Martyn Lloyd-Jones, bem como escritores contemporâneos, como John MacArthur, R.C. Sproul e John Piper.

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